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Mariella estava enfrentando pelo menos três cavaleiros do apocalipse de uma vez só

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Mariella estava enfrentando pelo menos três cavaleiros do apocalipse de uma vez só. E até ela, uma pessoa que pensava já ter se acostumado com as lutas da vida, estava prestes a abrir uma aba anônima no computador e descobrir a maneira mais fácil e indolor de se matar.

- Eu odeio português. Eu odeio, odeio, odeio! - a voz do primeiro cavaleiro do apocalipse, que por acaso também era seu irmão, veio da outra ponta da mesa de jantar. Ele se jogou sobre a folha do dever de interpretação de texto. - Por que a professora precisa passar um texto desse tamanho? Eu tinha coisa melhor da vida pra fazer do que ficar a tarde inteira lendo isso!

- Alonso, se você reclamasse menos e lesse mais, já teria acabado - Mariella disse em um tom de voz gentil. Ela até forçou um sorriso, tentando provar para si mesma que conseguia lidar com a situação de uma maneira calma e responsável. E daí se o sorriso parecia mais uma careta de um demônio? Pelo menos ela tinha tentado.

- Isso não tem fim! - Alonso continuou reclamando. - Eu não posso ler depois de jogar só um pouquinho no celular?

Mariella nem respondeu. Ao invés disso, foi aumentar a potência do ventilador.

Esse era o segundo cavaleiro.

Não o ventilador, é claro, mas os trinta e nove graus e a sensação térmica do mais profundo círculo do inferno no Rio de Janeiro.

Era início de setembro, pelo amor de Deus! Não era para estar tão quente assim naquela época do ano. A ebulição global tinha começado e Mariella tinha certeza que viraria uma poça gosmenta no chão antes do verão chegar de verdade.

Ela voltou para o seu lado na mesa, tentando bloquear as reclamações do irmão de doze anos enquanto encarava a página em branco na tela do notebook. O suor grudava suas coxas no estofado da cadeira e escorria pela sua nuca. Era difícil escrever uma cena que se passava em uma cidadezinha fria no interior da Romênia quando se está derretendo de tanto calor no Brasil. Mas quem dera se Mariella estivesse com problemas de escrever aquela cena.

Não, não era só isso. O terceiro cavaleiro do apocalipse tinha nome e sobrenome:

Bloqueio criativo.

E ela já tinha lidado com bloqueios criativos antes. Uma série deles. Mas quando a comida que você põe na mesa passa a depender do dinheiro que recebe escrevendo livros, falta de inspiração não é um luxo que uma escritora pode ter.

A cada segundo que ela ficava ali parada, os dedos suspensos sobre as teclas, mais o tic-tac do relógio na sua cabeça aumentava. Ela só tinha até dezembro para entregar o primeiro rascunho para a editora. E, se continuasse naquele ritmo, ela estava ferrada.

- Mari? - a voz do irmão parecia o zumbido de um mosquito irritante. Ele já tinha chamado o seu nome umas seis vezes. - Ô, Mari?

Ela fechou o computador com força.

Um castelo de presenteOnde histórias criam vida. Descubra agora