Após um quinquênio transcorrido, nas terras majestosas de Valória, no décimo dia do mês de novembro no ano de Nosso Senhor de 1625, as páginas do destino desdobravam-se, entrelaçando-se como fios de ouro na tapeçaria real...
-Não posso crer que isso tenha acontecido novamente! - Esbraveja o rei Erevan em seu leito, enfraquecido por uma enfermidade implacável. - Mais uma vez, esse maldito cavaleiro investe contra nosso reino! Quantas bruxas precisarão escapar de nossas mãos antes que esse maldito seja capturado?
- Majestade, estamos fazendo o possível para detê-lo, mas o sujeito mais parece fumaça, é impossível segurá-lo! - O chefe da guarda real tenta argumentar, aflito pela reação que virá do rei.
Após um acesso de tosse quase interminável, o rei o encara com um olhar mortal.
- Então, neste caso, espero que realize o impossível, ou enfrentará a fogueira como substituto das bruxas que escaparam.
- Farei o que deseja, majestade.
- Saia! - Ordena o rei, ainda mais alterado, tendo sua ira interrompida por outro acesso de tosse. Rapidamente, o chefe da guarda real corre para a saída, deixando o nobre sozinho com suas frustrações.
A rainha Seraphina se aproxima sorrateiramente, temendo os efeitos da ira do rei. Seu grande receio sempre foram os efeitos que a ira do rei poderia causar. Na maioria das vezes, o nobre encontrava satisfação descontando suas frustrações na esposa, o que a fez endurecer o coração ao longo dos anos, tornando-se uma mulher amarga e impiedosa.
- Onde está Alden? - Pergunta o rei furioso. Após uma breve saudação, a rainha se aproxima com cautela.
- Vossa alteza... Eu... não sei...
- Mas é claro que não sabe! O bastardo está sempre se entregando a excessos. É vital que ele assuma seu papel; minha saúde não é mais a mesma, logo precisarei passar meu trono para ele.
A rainha escuta as palavras com a cabeça baixa, erguendo os olhos somente ao fim da fala do nobre.
- Farei o possível para que Alden compreenda a importância de cumprir seu papel no reino.
- Muito bem, vá e envie uma mensagem ao rei Cedric de Thorn. Precisamos acelerar o casamento de nossos herdeiros o quanto antes.
- Sim, majestade. - Após a saudação, a rainha deixa o quarto com agilidade e graciosidade.
O Reino de Thorn estendia-se até as fronteiras dos reinos de Valória e Umbrosis. O rei Cedric, viúvo e bondoso, havia perdido sua esposa muitos anos atrás, optando por não contrair novas núpcias e dedicar sua atenção exclusivamente à sua filha, a princesa Genevieve de Thorn. Diferente do pai, Genevieve era mimada e mesquinha, sua motivação principal sempre fora destacar-se acima de todos.
O casamento entre o príncipe Alden e a princesa Genevieve fora acordado entre os reis muitos anos antes, quando ambos ainda eram crianças. A principal motivação para essa união era o enriquecimento mútuo dos reinos; Valória era conhecido por sua alta produção de lã, enquanto Thorn era rico em minérios. A futura união sempre foi conhecida pelos príncipes, mas apenas a princesa Genevieve ansiava por esse acontecimento. Enquanto a princesa mimada cuidava de seu suntuoso enxoval, o príncipe desfrutava de sua juventude ao lado de sua amante, a jovem e voluptuosa camponesa, Rosalind Durval.
Rosalind era uma jovem ambiciosa, sonhava em ascender à nobreza. Seu maior anseio era conceder ao príncipe um herdeiro, almejando assim tornar-se sua princesa. Apesar da relutância do príncipe diante dessa ideia, isso jamais fez a jovem ambiciosa desistir de seus ardentes planos.
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Para além da floresta sombria, que se estendia às margens do reino de Sombrestia, residia em seu esplêndido palacete Selene Shadowthorn, a nobre duquesa de Umbrafell. Aos olhos de todos ao seu redor, Selene era uma jovem nobre de beleza extraordinária, que havia perdido o marido precocemente. No entanto, o que ninguém suspeitava era que a morte do conde fora provocada pela própria jovem.
Após testemunhar a brutalidade do assassinato de seus pais por Lucios e tornar-se sua esposa, Selene decidiu dar início ao seu plano de vingança. Nos primeiros dias após o casamento, sua liberdade foi cerceada, pois o duque a levou para viver no castelo do rei Geoffrey, que, contrariado, os abrigou sob seu teto.
Durante a segunda semana desse cárcere tortuoso, a velha Rowena of Ravensburg surgiu no quarto de Selene diante de seus olhos. Rowena havia sido apresentada a Selene durante sua visita ao feudo de Nigra e foi a velha senhora quem a ajudou a superar seus medos e ansiedades, garantindo que a jovem ficasse sob sua proteção até que fosse seguro voltar para casa.
Assim como Selene, Rowena era versada na arte da criação de poções e tinha o dom de se comunicar com animais de todas as espécies. Desde aquele dia, todas as manhãs, a velha senhora aparecia no quarto da jovem, e juntas conversavam e conspiravam. Uma noite, depois que o conde machucou Selene ao tentar forçá-la a cumprir suas obrigações de esposa, a velha bruxa propôs que ambas pusessem um fim à vida do nobre. Por um longo mês, todas as manhãs, duas gotas de uma poção poderosa eram habilmente misturadas à bebida do conde. No final desse período, ele sucumbiu ao veneno, deixando Selene viúva e novamente livre.
O rei Geoffrey, perspicaz como era, nunca deixou de suspeitar da inocência de Selene na morte de seu irmão. No entanto, seu desejo de livrar-se da moça falou mais alto, permitindo que ela fosse viver sua vida, ainda que sob seu olhar vigilante. A duquesa conseguiu estabelecer sua própria moradia, mas suas práticas obscuras precisavam prosseguir no mais absoluto sigilo.
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Selene
O sussurro das folhas e o cântico dos pássaros se tornavam quase inaudíveis à medida que eu adentrava as profundezas sombrias da floresta obscura. Após colher algumas ervas, raízes e flores, decido extrair substâncias necessárias de animais que só habitam a parte mais obscura da floresta. Com tudo armazenado em meu cesto, verifico se está tudo em ordem e sigo adiante, mantendo o arco e as flechas prontos para evitar surpresas indesejadas naquela área remota e misteriosa da floresta.
Ao me aproximar da civilização, ouço gritos femininos entrecortados por vozes autoritárias masculinas; escondo-me atrás de um arbusto volumoso, buscando passar despercebida dos olhares de quem quer que estivesse na floresta naquela hora da manhã. O que pensariam ao encontrar uma nobre naquelas condições? As vozes se aproximam, e posso ver os guardas do reino de Valória caminhando apressadamente, debochando de duas mulheres que capturaram; parece que hoje a inquisição condenaria mais duas mulheres inocentes à fogueira. Um nó se forma em minha garganta, ponderando sobre como eu mesma poderia ter tido o mesmo destino que tantas outras haviam enfrentado.
Após todo o ocorrido, sigo apressada, de volta para casa. Antes mesmo de entrar, caminho por entre as flores, cores e aromas do meu tão amado jardim, cruzo o longo caminho por entre o grande labirinto de espinheiros, até que me deparo com o grande jarro de papoulas vermelhas, ainda úmidas pelo orvalho da manhã; com um pouco mais de força, empurro o jarro, a fim de ter acesso a portinhola que me levaria novamente a meu mundo.
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Duquesa de Umbrafell ( Primeiro Livro da Duologia FILHA DA ESCURIDÃO)
RomanceQuando ao invés da princesa, o príncipe se apaixona pela bruxa...