Guerreiros

4 - Senhorzinho

- A mesma dor do teste? Como assim? - pergunto, depois de ouvir a explicação sobre o que tinha acontecido enquanto eu estava desacordada.

- Sim, tenho certeza. Só não sei como. - responde Ethan, enquanto se esforçava para analisar a floresta somente a alguns metros abaixo de nós. 

A luz do sol já tinha dado lugar ao fraco brilho da lua a algum tempo, mas continuamos mesmo assim. Quanto mais voarmos à noite melhor, chama menos atenção.

- Storm não sabe nada sobre? - considerando que a expectativa de vida dos humanos não chaga nem perto da dos dragões e que Ethan a conheceu quando ela já era adulta, é possível que ela saiba de alguma coisa que não sabemos.

- Não, ela ficou espantada tanto quanto eu. 

Caramba, que raios foi isso então? E por que meu teste foi diferente dos outros? E nem a Storm sabe? Perguntas sem respostas são o que não faltam para ocupar minha mente.

- Vamos descer e acampar por aqui mesmo. Foi um dia bem estressante, eu diria. - retomou, depois do meu não tão curto silêncio pensativo, ao passarmos por uma pequena clareira, onde Storm conseguiria pousar.

- Ok. - respondi, firmando as pernas na sela e me segurando mais firme ao Ethan, enquanto ela inclinava o corpo e cruzava os poucos metros que nos separavam das copas das árvores até o chão.

Storm pousa o mais silenciosamente possível e antes de desmontarmos, desprendemos as armas e as mochilas da sela. Ethan desce com um salto, enquanto eu uso sua asa de apoio para chegar ao solo. Ela já é grande de mais para mim pular quando eu consigo ver, nesse breu então... 

Juntamos alguns galhos e folhas no chão, para Storm soltar um pequena faísca e começar a fogueira.

Acomodo duas mochilas em um lugar plaino nos pés de uma árvore, com a esperança de conseguir ter umas horas de sono no mínimo razoáveis. Pego meu arco e a aljava e deixo ao meu lado, antes de sentar no chão com as costas escoradas na árvore áspera e soltar um belo suspiro. Storm também se acomoda, enrolada no próprio corpo, com o rosto voltado na minha direção.

- Vou pegar mais lenha pra fogueira. Fique aqui com a Storm e me chame se algo acontecer. - disse Ethan, se voltando para a floresta e se afastando lentamente. - Olhos abertos até eu chegar hein.

- Tudo bem. - confirmei e logo depois me arrependi. De repente as pálpebras pareciam pesar quilos; comecei sentir os efeitos das pancadas no chão e os músculos gritavam por descanso. Pode parecer uma pergunta que provoca o destino, mas, estamos no meio de uma floresta, à quilômetros de distância de qualquer vilarejo, no meio da noite: por que teria alguém por perto?

Escorreguei o corpo e apoiei a cabeça nas mochilas, não resistindo ao sono que me atingiu como um balde de água, percebendo o escuro lentamente sendo substituído por uma... uma cozinha...?

... - Última e... voilà! - disse uma voz jovem masculina, bem familiar, ao colocar cuidadosamente uma framboesa em cima de uma torta pomposa, com as bordas douradas. Aquilo parecia ótimo, tanto que eu quase conseguia sentir o cheiro.

Era a mesma pessoa.

Não sei quem é, ou por quê, mas aparece de tempos em tempos em minha mente, como se eu visse pelos seus olhos. Para minha frustração, nunca consigo ver nitidamente, sempre é meio embaçado.

O rapaz misterioso pega cuidadosamente a forma e se dirige a uma mesa a alguns poucos metros de distância, passando por um armário, com portas de vidro reluzentes, que refletem rapidamente sua imagem, e, pela primeira vez eu consigo ver algo claramente: o seu sorriso, satisfeito com a obra de arte em suas mãos.