Querida Amelia,

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Preciso contar como foi o Halloween. Minha fantasia fez sucesso! Todo mundo na festa adorou. Expliquei que eu não estava morta, só tinha ido fazer círculos no ar por aí.

Dinah foi de Van Gogh. Colocou um curativo na orelha para parecer que estava cortada e espalhou tinta nas roupas. Normani foi de pastora, o que para ela significa duas tranças no cabelo e um vestido azul apertado. O namorado dela, Kasey, estava de ovelha, porque Normani escolheu a fantasia. Ele estava bem engraçado com orelhas de algodão felpudas e o pescoço e os ombros tão grandes que se tornaram uma coisa só. Quando chegamos na casa que Kasey divide com outros caras, Normani se jogou nele, e Kasey a segurou. Ele fala coisas como "Como vai minha ninfeta?" para ela. Os amigos dele riem. Normani também ri, mas Dinah fica séria.

Algumas pessoas na festa estavam de personagens de Detetive — Dona Branca, Professor Black e Coronel Mostarda. Achei as mais legais. Kasey e os amigos sabem dar uma boa festa. Mesmo que a casa estivesse meio suja, não era só uma festa de faculdade com um barril de chope. Para o Halloween, fizeram algo especial. Havia tigelas de M&M's por toda a parte, e chocolate quente batizado com bebida. Fiquei procurando Lauren, imaginando se ela ia aparecer, me perguntando se uma das pessoas de máscara na sala era ela, mas ninguém parecia ser. Decidi que precisava me distrair em vez de procurá-la, então fui brincar de pescar maçãs. Sofia e eu costumávamos encher a banheira com maçãs e treinar, em qualquer época do ano. Sempre fui boa nisso, mesmo quando ainda tinha dentes de leite.

Abaixei a cabeça e o garoto vestido de Professor Black, ao lado, fez o mesmo. Às vezes, quando olhávamos para cima ao mesmo tempo, os olhos escuros dele pareciam fixos em mim. Eu deixava que me encarasse até praticamente me perfurar e mergulhava a cabeça de novo. Quando finalmente consegui pegar uma maçã e levantei triunfante, o Professor Black ainda estava tentando, e vi Lauren parada, perto de mim. Eu estava com uma maçã na boca quando ela disse oi.

Normalmente, eu teria ficado envergonhada ou talvez culpada de pescar maçãs ao lado da garota, mas me senti muito corajosa e muito estilosa vestida de você. Então tirei meus óculos de pilota e dei uma mordida na maçã.

Então disse:

— Vamos voar.

Acho que, a essa altura, eu já estava um pouco bêbada.

Lauren respondeu:

— Acho que o teto vai atrapalhar.

Peguei a mão dela e o levei até a porta da frente. Então e comecei a correr. Lauren parou de me seguir na beira do jardim, mas continuei correndo pela rua com os braços abertos como se fossem asas, rindo. Eu não me importava. Estava feliz. Quando cheguei ao fim do quarteirão e atravessei a rua, estava flutuando. Eu podia ver a copa das árvores, juro. Via as ruas se cruzando. As casas pareciam de brinquedo, e logo a Terra inteira se transformou num mapa.

Quando finalmente pousei, Lauren estava ali parada, me esperando na beira do jardim, que um instante atrás eu via distante, pequeno. Me esqueci de mencionar que ela estava vestida de zumbi roqueira, o que significa que estava com sua jaqueta de couro de sempre e havia feito alguns riscos no rosto com o que parecia um canetão preto.

— Como foi o voo? — ela perguntou.

— Você devia ter vindo — respondi, sem fôlego. — Quase dei a volta ao mundo.

— Quem era o quatro-olhos?

— Era o Professor Black. Você nunca jogou Detetive?

— Ele estava te encarando como se quisesse engolir você. — A voz dela soou meio ciumenta, e eu gostei disso. Significava que ela queria me proteger ou queria que estivéssemos juntas.

Senti que estava vermelha e torci para, no escuro, ela não notar. Fiquei mexendo no capacete de aviador.

— A gente só estava pescando maçãs. — Coloquei os óculos. — E, além do mais, é você que não quer namorar.

— Como você sabe?

Dei de ombros.

— Você não é disso.

— E se você estiver errada? E se eu for?

— Você é?

Ficamos em silêncio por um momento.

— Bom, agora eu sou.

— Eu também — eu disse discretamente e me joguei para ela me pegar, simulando um desmaio, e dei risada.

Ela tirou meus óculos e nós nos beijamos. Senti as mãos frias dela sob minha camisa, tocando minha barriga. Depois senti as mãos dela mais quentes nas minhas costas e os lábios no meu pescoço. Pela primeira vez, fui dona do meu corpo. Estar contra o corpo dela era algo novo para mim. Lauren me fez pensar na primeira neve, aquela que cobre tudo. Pensei em como era estar acima das árvores, que faziam um barulho bonito, um farfalhar de folhas marrons prontas para cair.

— Escuta só — falei.

 Beijos, Camila.

/TL

Cartas de amor aos mortos (Camren) -  Ava DellairaOnde histórias criam vida. Descubra agora