Passei pelas ruínas de um antigo posto de vigilância há muito derrubado e, quando a trilha se estreitou por uma feira lotada de ferreiros de ambos os lados, entendi que estava no caminho certo para o portão que continha a passagem para dentro do complexo de extração.
O muro alto cercava toda a extensão das minas, a maior parte dele era feito de pedra, o restante era madeira e tinha uma passarela entre os postos com sentinelas armados perambulando e controlando o fluxo de pessoas. A segurança era alta o suficiente para os portões ficarem abertos o dia todo, permitindo a passagem dos trabalhadores, das cargas e de comerciantes com exceção dos ferreiros que ficavam o dia todo batendo na bigorna consertando ferramentas. Ali era domínio deles. O restante eram vendedores de comida ou já preparada ou in natura (inclusive uma galinha quase me arrancou um olho tentando fugir do abate) ou lavadeiras com bacias pesadas de roupa apoiadas na cabeça oferecendo mão de obra para os mineiros.
Hoje a trilha estava estranhamente caótica e tenho chance de ser a culpada por isso, graças ao incêndio de ontem à noite, que fez a segurança ficar redobrada por toda a Base, principalmente ali. Foi formada uma fila para a revista no portão, mas tinha tanta gente em pouco espaço que já havia se dividido em três. O ar estava seco e o sol não facilitava, o calor era tanto que ondulações eram visíveis balançando o pó laranja de cincino que mais perto das minas cobria qualquer coisa que entrasse em contato tamanha a quantidade, o véu no rosto foi mais útil do que eu esperava.
Quando chegou minha vez de entrar, um guarda que eu não conhecia puxou meu véu do rosto (notei que fez aquilo com todas antes de mim) e minha bolsa. Ele vasculhou o conteúdo e a virou de ponta cabeça. Minhas moedas não caíram e nem foram notadas, primeiro porque estavam no fundo falso e segundo por conta do barulho incessante da multidão ao redor. O guarda jogou a bolsa de volta no meu peito e me empurrou para dentro do inferno fervente que era o complexo de minas.
Não estão me procurando.
A ideia veio carregando um pacotinho de alegria e dúvidas enquanto a refletia, cobrindo de volta meu nariz e boca com o véu translúcido.
Aquele homem olhou muito bem para o meu rosto e não deu importância alguma, isso é um alívio enorme.
Talvez tenham achado que a terceira detenta morreu no fogo, talvez nem sabiam que eu estava presa lá!
Mas Sinamon, o maldito Bigodes, sabe, e não vai me deixar em paz tão cedo. Não sem um bom preço.
Dane-se, ele é o menor dos meus problemas.
Para todos os efeitos, estou livre.
Não fui notada quando comecei a me dirigir a leste, em direção ao carregamento de torres já montadas que aguardava viagem, o lugar que costumo encontrar com Norrah é na sombra das últimas das torres, onde temos algo parecido com privacidade.
A quantidade de carroças (empurradas por homens) e pessoas circulando por ali não era tão intensa já que aquelas torres só sairiam de lá direto para os comboios então alguns mineradores aproveitavam a sombra para descansar durante suas luxuosas quatro horas de folga.
Cheguei ao local combinado e não tinha ninguém. Apertei as unhas nas palmas das mãos e respirei fundo olhando ao redor. É perigoso ficar sozinha aqui por muito tempo, aquelas torres agrupadas formavam corredores silenciosos que com certeza serviam para encontros íntimos entre extremistas e algumas prostitutas que também passavam pelos portões em busca de clientes, então decidir não adentrar muito aquele pequeno labirinto, permanecendo numa aresta que permita quase uma boa visão da primeira parte do complexo e do portão.
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Entre Dunas
FantasyEudora Fazad cresceu em Fossa, uma cidade ressecada pelo deserto Vhial, que a circunda. A opressão que seu povo sofre não a impede de aprontar de vez em quando,principalmente, se a barriga exigir o alimento que ela só consegue por meio do roubo e de...