CAPÍTULO DEZ

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A VOLTA DE V

   Já fazia algumas horas desde que Ricardo saiu da mansão e me deixou esperando pela volta de V. Eu estava ansioso, porque meus pais estão vindo ficar aqui e eu os conheço muito bem. Eles não vão ficar confortáveis de início, principalmente minha mãe. Preciso dar um jeito de fazê-los se sentirem em casa.

   Eu estava na sala de estar, e a enorme televisão estava passando um filme qualquer de ação, cujo nome eu não dei importância em saber. Apesar de sempre ver um empregado ou outro passando, talvez certificando-se de que eu não precisava de alguma coisa, eu estava completamente sozinho nessa mansão. Até pensei em ir à biblioteca e procurar um livro para ler, mas eu estava distraído demais para algo assim.

   A sala era bem grande, com vários sofás brancos, dispostos em lugares específicos. Acho que ao todo eram cinco sofás, variando de tamanho e estilo. No chão, um enorme tapete vermelho contrastava com o piso e as paredes brancas. Quadros e retratos antigos enfeitavam as paredes. No teto, um enorme lustre de cristais balançava sobre a minha cabeça. Janelas enormes com vista para os jardins da casa ajudavam a deixar o lugar mais bonito.

   Cansado do filme, desliguei a televisão e me levantei. Caminhei para fora da sala de estar e me dirigi às escadas duplas do hall de entrada. Se eu vou ficar por aqui, é melhor conhecer a mansão o quanto antes. Decidi seguir o caminho da esquerda, subindo mais alguns lances de degraus. Eu estava em um corredor com várias portas, além de esculturas de mármore e algumas pequenas mesas de madeira escura e rústica.

   As cores das paredes aos poucos foram mudando, de tons de branco puro para branco creme. Um espelho redondo com bordas douradas estava logo no início do corredor. Entrei na primeira porta, encontrando mais um corredor, mas este bem menos decorado.

   Uma plaquinha dizia que ali ficavam os quartos dos empregados. Eu não sei se todos moravam ali, mas não fiquei para descobrir. Na segunda porta, havia mais um corredor, e na placa dizia que era uma academia e uma ala hospitalar. Eu não sei os motivos de alguém querer uma ala hospitalar em casa, mas, tendo a vida que o Ricardo tem, é bem compreensível.

   Eu estava para sair quando escutei barulhos vindos de uma das portas. Estranhando, me aproximei e coloquei a cabeça na porta, ouvindo gemidos de dor. Um pouco curioso, lentamente abri a porta para saber quem estava do outro lado. Quase tive um ataque do coração ao ver V, deitado em uma maca, apenas com uma cueca preta e todo sujo de sangue.

   — V? — chamei, entrando de uma vez e notando ele ficar desconcertado.

   — Não era para você me ver assim, seu Danilo — Apesar de claramente estar sentindo dor, sua voz estava firme e calma como sempre.

   — Quando foi que você chegou? Por que ninguém me avisou? — V pareceu ficar um pouco envergonhado.

   Olhei para seu corpo, que estava cheio de hematomas, cortes abertos e até algumas cicatrizes fechadas. Além disso, não pude deixar de reparar nos músculos que ele tem. Definitivamente, V é um homem bonito e charmoso. No seu braço esquerdo, havia uma tatuagem, um tigre idêntico ao que Ricardo tem nas costas. Será que é algum tipo de tatuagem que simboliza a máfia deles? As pernas dele também estavam machucadas e manchadas de sangue.

   — Eu cheguei faz alguns minutos. Pedi ao Renato para não comunicar ninguém e chamar a médica que cuida da gente quando ficamos assim. — explicou V, não me deixando menos preocupado.

   — O Ricardo já sabe que você chegou? — V negou com a cabeça, me fazendo suspirar aliviado. — O que eu faço para ajudar?

   — Você não precisa fazer isso. Logo a doutora Tanaka está chegando para cuidar de mim. — Concordei com a cabeça, mas não saí do meu lugar. — Na verdade, tem algo que você pode fazer por mim. A Raissa e eu estamos namorando, então se você pudesse dizer a ela que eu estou aqui, seria muito bom.

   Confesso que fiquei um pouco chocado com a notícia de que eles estão namorando. Concordei com a cabeça e estava me preparando para sair, quando me virei.

   — Eu menciono o seu estado? — perguntei, encarando seus olhos cansados.

   — Apenas diga que eu vou ficar bem e que não é pior do que da última vez. — assenti, soltando um suspiro. — Obrigado, Danilo, você é um ótimo amigo.

   Deixei V sozinho, finalmente podendo relaxar os músculos que eu nem sabia que estavam tensionados. Meu coração estava acelerado; eu nunca havia visto tanto sangue quanto o que estava no corpo dele. Minhas mãos estavam trêmulas, então tratei de cerrar meus punhos com força. Saí daquela ala hospitalar e desci correndo as escadas para o hall de entrada, encontrando Renato ao lado de uma mulher.

   Os dois me encararam. Renato parecia surpreso ao notar de onde eu estava vindo, perdendo a compostura por breves segundos. A mulher parecia desconfiada; usava um jaleco de médica e tinha um estetoscópio em volta do pescoço. Ela era bonita, devia ter uns trinta e poucos anos, cabelos pretos e longos, olhos castanho-escuros e puxados, típicos de asiáticos. A pele branca, sem nem uma ruga sequer, o nariz arrebitado e a boca pequena com um batom rosa quase apagado.

   — Seu Danilo, o que faz aqui, se me permite perguntar? — Renato quebrou o silêncio, enquanto a médica continuava me olhando desconfiada.

   — Eu estava conhecendo mais da mansão e acabei encontrando o V na ala hospitalar. — respondi, sentindo meu coração aos poucos se acalmar. — Você deve ser a doutora Tanaka que o V mencionou.

   — Isso, e você deve ser Danilo, o noivo do senhor Ricardo. — A voz dela era firme e parecia me julgar.

   — Sim, mas eu preciso fazer uma coisa agora, com licença. — disse, passando por eles e voltando para a sala de estar.

   Por que essa médica ficou me olhando desse jeito? Aqui todo mundo me trata como se eu fosse um príncipe, graças ao Ricardo, mas ela foi diferente. Acho até que ainda consigo sentir o olhar julgador dela, como se eu tivesse feito algo de errado. Não tenho tempo para pensar nela; preciso falar com a Raissa e depois com o Ricardo. Segui meu caminho até a sala de jantar e, de lá, entrei na cozinha.

   Confesso que levei um susto; estava o maior caos lá dentro. Vários cozinheiros faziam todo tipo de ação, desde gritar uns com os outros até picotar vegetais com facas enormes. Eu juro que vi um homem cortar uma cenoura tão rápido que, em poucos segundos, havia três pilhas de rodelas laranjas na bancada. Tentei procurar por Raissa, mas ela não estava em lugar algum. Até que finalmente fui notado por um dos cozinheiros.

   — Seu Danilo, o que o traz aqui? Precisa de algo para comer? — Era um homem de cabelos pretos, misturados com alguns fios brancos, mas escondidos por uma touca de renda.

   — Estou procurando a Raissa, preciso falar com ela. — disse, vendo ele concordar com a cabeça.

   — Chefe, o patrão Danilo está te procurando! — gritou o homem, se virando de costas para mim.

   Logo, uma cabeça surgiu no meio de várias outras e Raissa veio correndo na minha direção. Ela tinha um sorriso estampado no rosto, e o cabelo estava preso sob um chapéu de cozinheiro grande o suficiente para caber todo o cabelo dela. O sorriso dela sumiu ao ver meu rosto, tornando-se mais sério.

   — Aconteceu alguma coisa? Você parece pálido, está passando mal? — ela limpou a mão em um pano amarrado à sua cintura.

   — A gente pode conversar lá fora? — Raissa concordou, pedindo para os outros continuarem a cozinhar. Quando estávamos sozinhos, voltei a falar. — O V já chegou.

   — Chegou? Quando e cadê ele? — ela voltou a sorrir, ficando animada.

   — Ele estava todo machucado, mas pediu para você não se preocupar, que ele não está pior do que da última vez. — acrescentei, após ver o sorriso dela murchar. — A doutora Tanaka já deve estar cuidando dele nesse exato momento.

   Raissa soltou um longo suspiro, fechando os olhos e ficando assim por longos segundos. Quando ela finalmente voltou a me encarar, estava sorrindo e me agradeceu por ter ido avisá-la. Eu sorri para ela, dizendo apenas que fiz um favor a um amigo.

   Me pegando de surpresa, Raissa me puxou para um abraço. Acho que tirei um grande peso das costas dela. Quando nos separamos, ela abriu a porta da cozinha e gritou para um dos cozinheiros que ele estava no comando enquanto ela fazia algo. Raissa perguntou se eu não gostaria de ir com ela até a ala hospitalar e eu apenas concordei com a cabeça.

   Caminhamos em silêncio em direção à ala hospitalar. Minha cabeça trabalhava em pensamentos: será que eu devia falar com o Ricardo? Talvez eu deva falar com o V antes e me certificar de que posso fazer isso. Quando chegamos ao quarto onde V estava repousando, encontramos a doutora Tanaka fazendo pontos nas feridas abertas dele. Renato também estava ali, observando a mulher costurar o homem.

   Raissa se aproximou da maca e olhou para o namorado, que estava desacordado. Acho que deram anestesia nele. Os olhos de Raissa se encheram de lágrimas e ela segurou a mão de V, apertando com firmeza. Eu parei ao lado de Renato, que parecia igualmente ansioso e preocupado. A dra. Tanaka continuou seu trabalho, ignorando a nossa presença. Ela estava quase acabando, costurando uma das feridas na perna de V.

   — Renato? — chamei baixinho, e o homem me encarou.

   — Precisa de alguma coisa, seu Danilo? — Pelo olhar dele, sei que ele estava torcendo para que eu não pedisse nada.

   — Eu posso falar com o Ricardo sobre isso, não é? — perguntei, tentando não soar como se eu estivesse querendo fofocar.

   — Claro, você faz o que quiser aqui. — disse ele, sorrindo. Eu agradeci, pedindo licença e deixando a ala hospitalar para trás.

   Peguei meu novo celular, e sim, Ricardo fez questão de que eu aceitasse um dos celulares mais caros que existem atualmente, e liguei para o número que ele havia deixado salvo. Tocou três vezes antes de me atender, e quando ouvi sua voz, um sorriso involuntário se formou nos meus lábios. Eu estava descendo as escadas para o hall de entrada e me sentei no último degrau.

   — Estava me perguntando quando iria me ligar, amore mio. — disse a voz de Ricardo, seu leve sotaque me causando arrepios.

   — O que está fazendo? — perguntei, tentando ser casual.

   — Provando alguns vinhos, e você? — ouvi Ricardo falar em italiano e passos do outro lado da linha.

   — Acabei de voltar da ala hospitalar…

   — Danilo, aconteceu alguma coisa com você? Está machucado? Me diz quem foi que eu juro que mando matar o desgraçado que ousou te machucar! — Apesar da ameaça, eu dei uma risada alta, ecoando por aquela mansão enorme.

   — Você nem me deixou terminar de falar. — disse, ainda rindo da situação. — Eu estou bem, não precisa mandar matar ninguém.

   — Mi dispiace, angelo mio. Não gosto nem de imaginar você machucado. — senti meu coração palpitar com o que ele disse. — Então, o que estava fazendo na ala hospitalar?

   — Encontrei por acaso. Estava conhecendo a mansão e ouvi alguns gemidos de dor vindo de lá. Um pouco curioso, fui saber o que era e, quando entrei, encontrei o V todo machucado e ensanguentado. — expliquei, esperando uma resposta de Ricardo, mas ele ficou mortalmente em silêncio. — Ricardo?

   — Qual o estado dele? — disse a voz de Ricardo, fazendo meu corpo se arrepiar com a entonação.

   — Ele disse que não era pior do que da última vez. — Ricardo novamente ficou em silêncio. — A dra. Tanaka está cuidando dele, acho até que já terminou.

   — Ótimo, vou falar com o Renato depois. — Ricardo soltou um suspiro. — Você precisa de um novo motorista, pelo menos por hoje.

   — Eu posso ir de Uber até o hospital. — tentei, mas Ricardo riu.

   — Danilo, tem literalmente dez carros na minha garagem à sua disposição e você quer sair de Uber? — Me senti um pouco idiota por isso.

   — Eu não estou acostumado a ter todo esse luxo. — bufei, um pouco zangado.

   — É melhor se acostumar. Quando a gente se casar, eu vou te encher de presentes caros e fofos. — senti meu rosto se avermelhar. — Eu preciso ir agora. Vou falar com o Renato e ele vai te apresentar seu motorista de hoje. Te vejo quando chegar em casa, um beijo.

   — Até, e obrigado.

   Quando Ricardo desligou a chamada, voltei a me sentir sozinho na mansão. Realmente vai ser melhor quando meus pais estiverem por aqui, pelo menos até a gente ir para a Itália. Meu coração dispara só de pensar nas coisas que vou ter que fazer e dizer para os pais dele. Eles são mafiosos, e se não gostarem de mim? E se reprovarem nosso casamento e obrigarem o Ricardo a casar com outra pessoa, me deixando largado nas ruas de outro país?

   O medo estava me consumindo por completo, quando escutei barulhos vindos do topo da escada. Renato descia com a Dra. Tanaka; eles conversavam baixo e, por um meio-segundo, meu olhar se cruzou com o da médica. Por que eu sinto que essa mulher não gosta de mim? Eles passaram por mim, com Renato me perguntando se eu estava bem. Apenas concordei com a cabeça e eles seguiram em direção à saída.

   Levou longos minutos para Renato reaparecer. Ele veio firme na minha direção e, com um sorriso, disse que Ricardo o havia deixado a par do meu problema com meu motorista. O homem então me pediu para segui-lo, pois meu novo motorista estava me esperando na garagem. Concordei com a cabeça e o segui, em silêncio. Meu coração estava mais calmo, apesar das minhas inseguranças ainda estarem me matando. Eu não posso deixar o medo me consumir, não agora que estou tão envolvido com o Ricardo. Aquele homem mexeu comigo como nenhum outro conseguiu.

   Quando chegamos na garagem, havia um homem de terno nos esperando. Ele usava um terno preto e mascava um chiclete, fazendo uma pequena bola e a estourando com o dente. Ele tinha o cabelo castanho-claro, olhos cor de mel e a pele negra. Quando notou nossa presença, o homem se aproximou, me olhando de cima a baixo e depois para Renato. Ele não sorria, parecia ser ainda mais sério que o V.

   — Seu Danilo, este é Paulo, seu motorista hoje. — explicou Renato, apontando com a mão aberta para o homem à minha frente.

   — Olá, é um prazer conhecê-lo. — disse, tentando ser simpático.

   — O prazer é todo meu, senhor Danilo. — O homem fez uma pequena reverência e voltou a se levantar. — Não se preocupe com nada, seus pais e o senhor estarão em boas mãos comigo.

   — Obrigado. — disse, mesmo que eu ache que uma ida ao hospital não seja nada perigoso.

   — Muito bem, Paulo, você tem suas ordens. Boa viagem, seu Danilo. — Renato fez uma reverência e nos deixou a sós.

   Vai ser realmente difícil me acostumar com o modo como essas pessoas estão me tratando. Encarei Paulo, que me indicou um carro que eu não sei nomear, mas que era grande o suficiente para caber a cadeira de rodas do meu pai. Respirando fundo, entrei e esperei que ele desse partida, nos levando para fora da mansão. Meus pais estão vindo ficar aqui, e eu tenho que garantir que eles nunca descubram sobre meu contrato e sobre o Ricardo ser um mafioso.

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Meu Mafioso (Romance Gay) REVISADOOnde histórias criam vida. Descubra agora