3. ceillings, lizzy mcalpine.

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DANA

Me arrastei até o restaurante. A cada passo meu corpo parecia ficar mais pesado. Pensei muitas vezes em dar meia volta e passar horas no sofá lendo algum livro que abandonei na metade porque estava sem tempo, mas a bronca que receberia dos meus pais me mantém na linha. Sempre foi assim. 

Encaro a faixada vermelha e preta com meu sobrenome no alto. Afasto mais um pensamento de desistência e entro. Não está tão cheio quanto fica aos fins de semana. Aceno para o meu pai no caixa, rodeado de balas e chicletes. Ele abre um sorriso enorme.

Passo pela porta dos fundos e sigo por um corredor estreito até a cozinha. Vejo todos através do plástico transparente, diante das panelas fazendo o trabalho de deixar o fogo subir até a altura dos olhos e despejar a comida no lugar certo, na hora certa, do jeito certo. Quero voltar para o meu posto logo

Yut é o primeiro que me vê. Estava organizando os pedidos numa mesinha mais ao canto, lugar que fiquei com Nathan por uma longa hora no dia anterior a pedido da minha mãe para que ele soubesse como as coisas funcionam por aqui. Desde o começo até a entrega do prato aos clientes. 

- Bom dia, Dana! - Seu sorriso transforma seus olhos puxados em linhas definitivas. Deixo minha mochila com a deles em um armário ao lado da mesinha com os pedidos. A de Nathan não está aqui. - Onde vai querer ficar hoje? 

- Como assim?  - Franzo o cenho. Ele parece nervoso. - Pensei que cuidaria dos pratos com o Mongkut hoje.

- Sua mãe disse que continuaria o treinamento do novato. - Sua boca treme um pouco enquanto fala. - V-Vai ensiná-lo as receitas... 

- Pensei que ele só ficaria organizando os pedidos.  - Tento respirar fundo. Só pode ser brincadeira. - Uma função simples.

- Ele veio para cozinhar, Dana. - Me viro imediatamente. Minha mãe está na porta acompanhada dele. Não parece muito feliz. - E você é a responsável por ensinar.

Engulo em seco. Yut e eu nos curvamos ao mesmo tempo. Ouço ele passando pelas portas duplas atrás de mim. Os olhos castanhos de Nat me avaliam de cima, meus batimentos aceleram imediatamente e a cada detalhe que percebo nele a situação piora. Mãos trêmulas. Merda.  

Ela não diz mais nada. Só me lança aquela cara de desaprovação e volta para o corredor estreito. Sinto que agora consigo respirar um pouco melhor. Apoio as mãos na mesa. Amanda aparece na pequena janela e deixa um papel. Coloco onde Yut deixaria. Ela sorri o mais rápido possível e volta ao trabalho. 

- Eu não quero causar problemas. - A voz dele é grave. É grave. Quero me fundir nela. Ouvir até o fim dos tempos. Ouvi-la dizer o meu nome. - Se quiser posso falar com o Yut e... 

- Não. - Me viro para ele. Tirou o casaco e colocou o avental. Está com as tatuagens a mostra, junto dos músculos bem definidos. - Não está causando nenhum problema. Eu não me importo. 

- Não é o que parece. - Cruza os braços. Ele ainda está me olhando. Me sinto muito exposta assim tão perto dele. - Posso aprender sozinho. Se sua mãe perguntar digo que foi uma ótima tutora. 

- Ninguém consegue mentir para ela. - Coloco meu avental. Pego a anotação do pedido mais recente. - Minha mãe é asiática, cara. 

Passo pelas portas duplas já citando o pedido. Yut começa a auxiliar Mongkut com menos velocidade que de costume. Eu me aproximo e tiro a panela das mãos dele, Nathan já está atrás de mim. Explico como aquele prato deve ser preparado junto de Mongkut, um cara de poucas palavras e de bom gosto musical com quem amo muito trabalhar.

Nathan é inteligente. Consegue deduzir muitos dos próximos passos. Não conversa muito, mas presta atenção. Bastante atenção. Consigo sentir as minhas bochechas queimando quando seu olhar me encontra. Retribuo sua atenção quando acompanho a sua execução. Percebo as veias nas mãos, com dedos longos e unhas curtas.

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