2.

71 4 0
                                    

Eu acordei no meio da noite, delirando e tendo alguns pesadelos, já faziam cinco dias que eu estava presa nesse apartamento, tendo ciência de que minha mãe estava me envenenando, eu não comi as comidas que ela vinha preparando, meu corpo se sentia cada vez mais fraco e eu sabia que morreria ali. Sentei na beira da cama pensando no que eu poderia fazer para fugir, precisava de um plano para pôr em ação, era questão de tempo para eu morrer, principalmente agora que nem água eu estava tomando. Me levantei da cama e olhei para o banheiro, quase me rastejei até ele, mas tomei um banho para ver se conseguia recuperar um pouco das forças. Ao sair, vi que minha mãe havia deixado outras roupas para que eu pudesse me trocar, me dirigi ao quarto agora andando, curvada, mas andando e coloquei a roupa que escolhi.

Ouvi um barulho na porta, era a minha mãe, ela cantarolava parecia feliz fiquei de ouvidos bem atentos em seus movimentos, ela trancou a porta e depois abriu a porta do quarto.

- Bom dia filha!

Ela disse animada.

- Bom dia, a que devo a honra de tanta felicidade?

- Seu pai e seu namorado me pagaram, já comprei nossas passagens, agora podemos finalmente ir embora, queria pedir desculpas pelo veneno, mas precisava deixar você fraca para não me preocupar com sua possível fuga, quando chegarmos em nosso destino, prometo que não farei isso mais, mas enquanto isso, eu preciso que beba esse suco.

- Não mãe, por favor, não me faça beber isso.

- Anda Alice, estou mandando, se não beber, eu te dou uma injeção isso será pior.

- Eu não vou beber isso.

- Você vai sim e rápido preciso buscar mais algumas coisas.

Ela apontou a arma que tinha em sua cintura, agora em minha direção, não tive outra escolha e tomei o suco. Quando coloquei tudo para dentro, ela sorriu e saiu me trancando novamente, é claro que corri o tanto que consegui até o banheiro, coloquei o dedo na garganta, afim de expelir aquele suco, não foi difícil pela ânsia que estava sentindo com o estômago cheio, por isso vomitei rapidamente.

Eu me sentia zonza e sabia que aquela bebida era um boa noite cinderela, se não fosse, era algo parecido, sem corresponder aos meus próprios comandos, eu cai sob a cama quase sentada, não conseguia me manter de pé direito, mesmo assim, estava lutando contra aquele efeito e ficando acordada.

Minha mãe não demorou para voltar, eu ainda estava na mesma posição, parecia um zumbi, em uma cadeira de rodas ela me colocou, penteou os meus cabelos, colocou um sapato em meu pé, como se eu fosse sua boneca, ela me arrumou, mesmo vendo o que estava acontecendo, eu não conseguia falar, não tinha mais expressões, por isso ela colocou um óculos em meu rosto e saímos de casa.

Eu cheguei no aeroporto com a minha mãe, ela sorria e eu sem me mexer babava inteira, parecia uma pessoa deficiente e ela não se importava com isso, a maior humilhação que passei foi quando no meio de tudo eu urinei em público, sentia escorrer por toda a minha perna e cair no chão do aeroporto, as pessoas me olhavam com dó, certamente achavam que eu tinha algum transtorno, alguma deficiência ou pior, era louca. Uma lágrima escorreu do meu olho e minha mãe secou dizendo para que eu não chorasse, teríamos uma nova vida agora, não sabia até onde sua mente doentia ia, não sabia até que momento eu continuaria viva.

Em todo momento eu tentei pedir socorro, mas não emitia som algum, tentava mexer o braço, mas não conseguia corresponder ao meu próprio comando, só Deus sabe até onde minha mãe iria com sua loucura e o pior, é que quando ela acabasse, talvez resolvesse acabar comigo também.

Minha mãe caminhou até o banheiro comigo, ela me limpou, colocou uma fralda geriátrica, uma outra calça e depois fez o check-in, eu me sentia humilhada enquanto ela assinava alguma documentação.

- Senhora, eu preciso de um documento que comprove que sua filha tem necessidades especiais, somente para rotina mesmo.

- Como assim? Nunca me pediram isso antes.

- É de rotina senhora, acho quase improvável que não tenham pedido, caso contrário precisaremos cancelar a sua passagem.

- Não é possível, em pleno século vinte e um? Vocês não viram a condição dela? A menina se urinou toda na frente de todos.

Minha mãe começou a dar um show, eu tentei por vezes falar, mas não conseguia, a moça o tempo inteiro tentou explicar para minha mãe que era um padrão, não podia fazer nada quanto aquilo, o que minha mãe não contava era que ela chamaria atenção pelo seu nervosismo, por isso policiais se aproximaram e pediram os documentos para verificação, nós fomos levadas até uma sala cada uma e uma psiquiatra começou a me avaliar.

- Alice Hoffman?

Não adiantava por mais que eu tentasse nada saia.

- Alice, eu sou a Débora, sou psiquiatra, você consegue me ouvir e me entender? Se conseguir por favor, tente fazer algum movimento.

Eu tentei me movimentar, as mãos, os braços, as pernas, mas nada, antes de desistir, tentei mexer a cabeça e para minha sorte, ela correspondeu com um sim.

- Alice você está embarcando em um voo para Espanha, pelo motivo de a Espanha ser um dos países que mais recebem pessoas do Brasil sendo vítimas de tráfico humano, preciso que responda se você corre perigo.

Mais uma vez, com uma grande dificuldade sinalizei que sim com a cabeça.

- Alice, você está embarcando com sua mãe para um destino do qual não saberemos sua estadia, preciso que confirme novamente, você está em perigo? Corresponda com a cabeça para baixo e para cima caso esteja, se não está correndo perigo corresponda com a cabeça que não.

Me esforcei novamente, tentei gritar e minha voz saiu baixa. Com a cabeça sinalizando que sim eu consegui apenas formar uma palavra sussurrando:

- Socorro!

No mesmo instante um policial abriu a porta e disse:

- A moça foi apreendida, ela tem um mandato de busca e apreensão que saiu agora, parece que mantinha a moça como refém.

Eu consegui derrubar algumas lágrimas a psiquiatra me olhou e chorou comigo.

- Calma querida, está tudo bem, você está a salvo agora.

Graças a eficiência da polícia, do meu namorado, do meu pai e com certeza a eficiência de Cris, agora eu estava a salvo. 

COMO SÓ VOCÊ SABE - VOLUME IIIOnde histórias criam vida. Descubra agora