alinhamento milenar - Danthur

prólogo

Dante encarou o próprio reflexo naquele espelho empoeirado, o rosto com tatuagens que ele não havia escolhido fazer, os olhos totalmente negros refletindo a iluminação do cômodo, os cabelos loiros sujos de terra e sangue assim como o manto branco preso aos ombros pelo pequeno broxe de sua marca.

Soltou o cabelo do aperto daquele rabo de cavalo, o vendo cair como cascata, contornando suas feições e lhe destacando ainda mais as olheiras de cansaço que os últimos dias lhe proporcionaram.

Tinha acabado?

Tinha que ter acabado.

Kian tinha sido selado pela segunda vez, a guerra tinha tido seu fim e contrariando a maioria das que lutara até aquele momento, seu lado havia triunfado.

Mas a custo de que?

Passou a mão pelo próprio cabelo o penteando para trás, não se lembrava quando tinha o cortado, mas o seu comprimento atual lhe incomodava.

Abriu cada uma daquelas gavetas do armário da pia, se dando por muito satisfeito ao achar uma tesoura enferrujada, parecendo ter sido esquecida ali a algum tempo.

Encarou os próprios olhos no reflexo enquanto mantinha os dedos firmes e cortava a primeira mexa, vendo os fios agora soltos caírem sobre a pia, respirou fundo e partiu para o segundo, pouco se importando em como ele ficaria, só queria se livrar de tudo aquilo logo, só queria se livrar do sentimento, das lembranças que o atormentavam.

Deixou a tesoura sobre o mármore frio quando se deu por satisfeito, pegando as partes cortadas e as pondo na lixeira antes de deixar as roupas de lado e entrar em baixo do chuveiro, agradecendo mentalmente por aquela casa ainda ter agua quente.

Seus olhos se fecharam enquanto seus músculos doloridos se viam enfim podendo relaxar, Dante estava feliz de certo modo, sua equipe e aqueles que estavam junto aos abutres em meio ao fogo direto estavam bem, eles não haviam sofrido uma única perca.

Mas por que se sentia tão triste?

A agua quente caiu sobre seus ombros enquanto sentia cada peça de seu corpo relaxando progressivamente, enfim fechando seus olhos e molhando o cabelo recém cortado, sufocando dentro de si uma vontade imensa de chorar.- Por que eu to tão triste?- Murmurou para si mesmo.

Enrolou por vários minutos em baixo do chuveiro, tomando mais tempo do que o necessário para que seu corpo fosse limpo, mas demorando o tempo perfeito para que sua alma se aliviasse do peso que carregava consigo.

Vestiu roupas leves, ajeitou os cabelos para que não ficassem sobre o seu rosto e saiu do banheiro, sendo recebido por uma brisa fresca vinda da sacada, junto com um cheiro que se tornara muito familiar para si.

Pode ver Arthur apoiado sobre a grade da sacada, encarando o céu enquanto levava um cigarro a boca, tragando e soltando a fumaça.

Dante se aproximou, parando ao seu lado e se apoiando na grande, sentindo o metal frio contra a sua pele, sendo de imediato notado pelo amigo, Dante sorriu, mas viu que os olhos de Arthur não pareciam nem um pouco felizes.- A gente conseguiu.- Disse enquanto virava seus olhos para o céu negro pintado de estrelas.

- É.- Arthur assentiu.- Conseguimos.- O Cervero apagou o cigarro ainda pela metade sobre o ferro.- Mas eu não consigo me sentir nem um pouco feliz com isso.- Ouviu Dante rir soprado e o olhou.- Você também não?

- Não.- Voltou seus olhos para os bicolores.- Me sinto um idiota.

- Como se: Talvez eu deveria ter feito diferente antes?

- Eu não salvei o Joui.- Arthur abraçou os ombros do loiro, o oferecendo conforto.- Eu não salvei a Bia, nem o Kaizer, nem a Erin, o Lu e Fernando, acho que eu to só cansado de ser o que restou.

- Eu me sinto assim as vezes.- Encarou o extenso jardim dos Leone logo a abaixo de seus pés.- Na real, acho que eu me sinto assim quase que o tempo todo.- Um sorriso nostálgico brotou nos lábios de Dante, como gostaria de não ser o que restou, como gostaria de ter todos de volt, o que não daria por mais um eu nunca no sovaco seco?- Apoiou a cabeça no ombro de Dante, sentindo o mesmo reencostar-se sobre si.- Acho que ter você me faz sentir menos sozinho.

Ouviu ele puxar o ar profundamente, como quem precisava urgentemente de um tempo para si.- Eu também me sinto assim Tutu. -Dante iniciou um carinho singelo em seu ombro, o que fez o outro fechar os olhos, se entregando para aquele sentimento de estar seguro, de que a luta tinha finalmente acabado, que o mundo não importava, que agora eram só Dante e Arthur.- Nós voltamos amanhã?

Arthur sentiu uma pontada em seu peito, Dante, Ivete, Agatha e os outros voltariam amanhã, mais Arthur tinha assuntos pendentes, assuntos em nome da ordem, estes quais precisava resolver ainda em solo Italiano.- Você volta.

- O que?- O abraço se desfez e eles passaram a se olhar, Dante tinha as sobrancelhas franzidas, claramente não tinha gostado da noticia.- Você vai ficar aqui?

- Vou, uma semana eu acho.- Dante encarou o horizonte negro da madrugada, tentando focar nas luzes da cidade adormecida ao longe, o problema foi quando sua visão embaçou, não queria ficar longe de Arthur, os dois não passavam sequer um dia sem estarem juntos, quem diria uma semana, imaginou acordar de manhã e não ver a figura dele na cama do outro lado do quarto e respirou fundo, tentando mandar aquela lagrima de volta para dentro, sentindo de repente uma mão agarrando a sua, para logo em seguida a dobra de seus dedos serem beijadas.- Não fica triste lindinho, uma semana passa voando.

- Não sem você.- Se achou patético por chorar, mas muito feliz quando Arthur o envolveu em um abraço apertado, onde Dante deixou a cabeça sobre a dele.- Eu aguento.- Riu.- Vai ser horrível, mas eu dou meu jeito.

- Se vai ser tão ruim, fica aqui comigo.-Arthur também não queria ficar sem ele, não queria ficar sozinho naquele casarão.

- Eu não vou atrapalhar você?

- Não vai.- Encarou os olhos enegrecidos.- Além disso, acho que você também precisa de uns diazinhos longe, eu vo tá trabalhando, mas nada te impede de descansar.- Deixou sua mão correr de volta ao braço de Dante, segurando sua mão.- Fica comigo vai, isso aqui vai ser uma merda sem você.- Viu ele sorrir, já sabendo a resposta dele o abraçou.

- Eu fico.- Deixou um beijinho no topo dos cabelos castanhos.

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