Prólogo

562 109 26
                                    

Jeon Jungkook

"Você precisa aprender a se portar como o homem que eu o criei para ser."

Uma lágrima dolorosa escorre por meu rosto quando penso nessa frase, que ecoa repetidas vezes por minha mente. Ainda mais, quando ela foi dita por meu próprio pai, depois de palavras agressivas – e uma agressão além da verbal – pelo simples fato de que ele me viu vestindo uma roupa que, segundo a sociedade, era repugnante quando usada por alguém do gênero masculino.

Por que roupas precisam de gênero? Não deveríamos apenas vestir o que sentimos conforto? Por qual razão incomoda tanto o que eu quero ou não usar?

— Bebê, você está me deixando cada vez mais preocupado. — Ouço a voz de Jimin acariciar meus ouvidos e abraço suas pernas ainda mais, onde metade do meu corpo está repousada.

É sempre para os braços do meu melhor amigo que eu fujo, mesmo que tenha sido contra a vontade dos meus pais, mesmo que eu estivesse com o corpo dolorido e meu coração destruído. Eu sempre vou na direção dele, o único que me acolhe quando tudo ao meu redor parece desabar em cima de mim.

— Por que ele fez isso, bebê? — Ji indaga, acariciando meu rosto onde possivelmente uma marca roxa vai se alojar por um tempo.

As lembranças de mais cedo voltam a me atordoar. Eu sempre fui visto como delicado demais para o meu tamanho e, especialmente, por eu ser homem. Isso porque, infelizmente, o mundo criou um estereótipo de como homens deve ser e eu obviamente nunca me encaixei.

Eu até tenho alguns músculos fortes, como nas coxas e no abdômen, mas de resto tenho poucos, além de curvas definidas que encantam muito mais a homens que gostam de homens, do que mulheres. E isso não falo baseado numa opinião geral ou em outro estereótipo, e sim com base nas pessoas que já me paqueraram em algum momento.

A única coisa que meus pais aprovaram na minha vida, foi meu curso da faculdade: eu estudo Medicina.

Com as minhas poucas economias de alguém que faz qualquer bico para conseguir sair de casa assim que possível, eu comprei uma peça que achei especialmente linda em uma loja, que nada mais era do que uma saia plissada amarelinha.

O que enxergo que foi um erro, de algum modo, é porque experimentei a saia assim que cheguei em casa e esqueci de trancar a porta. E eu sequer via que tinha motivo para tanto, afinal não estava fazendo nada de errado.

Meu pai enxergou de outro modo, ele chegou já gritando e fez do meu dia um verdadeiro inferno. O meu dinheiro e minha felicidade foram rasgados por suas mãos quando ele arrancou a peça do meu corpo e a destruiu com seus próprios dedos.

— Talvez você também me ache estranho se souber como eu gosto de me vestir, Ji, ainda mais porque não tenho coragem e muito menos apoio. — É o que escolho dizer ao meu melhor amigo, vendo-o me observar descrente.

— O que você gosta de vestir, meu bebê? — Ele pergunta, carinhoso como sempre é.

Será que ele me trataria assim se soubesse que tenho uma queda por ele desde o começo da adolescência?

— Roupas que a nossa sociedade hipócrita e preconceituosa enxerga como erradas para mim. — Sussurro, me sentindo ainda pior. — Eu gosto de peças que o mundo vê como femininas.

— Poxa, essa sua cinturinha fina deve ficar linda com uma saia. — Jimin comenta, me levando a arregalar os olhos. — Não é porque você é meu amigo que eu não posso te achar bonito, não me olhe com essa cara. A sua cintura fina é absurda. Espere aqui um minuto.

Ele se desvencilha de mim devagar, apoiando meu corpo no sofá. A simplicidade em seu olhar e o jeito que ele permaneceu a me olhar depois de saber de algo que me fizeram sentir vergonha, me faz entender que as pessoas ao nosso redor são responsáveis por boa parte das nossas emoções.

Eu acredito que possamos ser felizes sozinhos e coisas desse tipo, mas nossas frustrações geralmente vêm de terceiros, bem como satisfação e felicidade. Seja um objeto, um lugar ou alguém.

— Jiwoo esqueceu essa saia aqui na última vez que me visitou. Você quer experimentar? Ela não vem tão cedo, até me disse para doar. — Jimin diz, se referindo a uma prima sua que uma vez por ano o visita.

É uma saia um pouco colada ao corpo, de couro, preta. Ela tem a cintura média e o comprimento no meio das coxas. Visto que quero ver a reação de Jimin.

Eu corro para o banheiro, tiro minha calça de moletom e visto com pressa a saia que ele me deu. Não faz muito o meu estilo, mas ela é linda, ainda que seja apertada de se vestir e que marque o que só a boxer não é capaz de esconder. Eu não tenho vergonha alguma do que tenho no meio das pernas e eu amo ser homem, mas me sinto desconfortável quando marca demais, seja uma saia ou qualquer tipo de calça.

Todo mundo sabe o que eu tenho, nem por isso preciso sair mostrando como é.

A minha blusa eu dobro e deixo parte por dentro da saia, e quando me olho no espelho, me sinto bem. Novamente, não gosto de como está marcando, mas gosto de como minhas pernas ficam expostas desse jeito.

Jimin me olha da cabeça aos pés quando apareço em sua frente, sem nem piscar, e o safado ainda morde o lábio inferior, claramente querendo me provocar. Ele sempre faz isso, de qualquer forma.

— Posso ser sincero? — Ele indaga. E eu até penso que ele vai dizer que estou horrível, mas me engano quando ele segue: — Você ficou absurdo de tão lindo, mas esse tecido não favoreceu suas coxas grossas ou a cintura fina. Vou comprar uma mais bonita e que seja só para você.

— Eu não posso usar essas coisas, Ji. — Me entristeço.

— Na casa daquele babaca não, mas na minha você pode e deve. — Ele diz, e eu sei que ele sente raiva do meu pai pelo que ele fez, então sequer reclamo com o xingamento. — A minha casa e meus braços são seu porto seguro, e eu quero que você esteja sempre confortável comigo e com quem você mesmo é. Vou comprar todas as saias que você quiser. Quais outras peças você gosta?

Um sorriso surge em meus lábios com a sua pergunta e eu volto a me sentar no sofá, com as pernas de Jimin jogadas sobre as minhas, como o grande folgado que ele sempre foi.

— Eu nunca experimentei, mas gosto de meia-calça, meia sete-oitavos, cropped, shorts. Gosto de tons pastel, mas você sabe que eu amo preto também. — Desato a falar, vendo seu sorriso apenas crescer.

Talvez Jimin não se importasse se soubesse da minha queda.

Talvez ele até pudesse sentir o mesmo, não é? 

○ ○ ○ ○ ○ ○

Prólogo prometido é prólogo postado, hihihi.

Espero muitíssimo que vocês tenham gostado! Vejo vocês no próximo, beijinhos ♥

Delicate | jjk + pjmOnde histórias criam vida. Descubra agora