WILL'S POV
Respiro fundo e pego minha garrafinha de água de dentro da mochila quando fazemos uma pausa na trilha de bicicleta. Não sei por qual motivo aparente Quiron achou que seria uma boa ideia se nós, monitores, fizéssemos uma "trilha prévia de reconhecimento" como ele declarou e nomeou no quadro de tarefas. Porém Long Island estava gritando em nossas peles que era verão, e que pedalar de bicicleta por uma trilha íngrime nesse sol escaldante não era a melhor das ideias. Mas ser monitor não era apenas fogueiras particulares e filas preferenciais, era também passar perrengue no sol para que quando os campistas chegassem não se deparassem com nenhuma aranha caranguejeira, como aconteceu conosco umas três vezes. Mas éramos uma equipe preparada, e esperávamos por isso, então não aconteceu nada de preocupante.
O Acampamento Meio-Sangue tinha uma floresta grande o suficiente para fazer com que existem duas trilhas demarcadas, e hoje de manhã grupos de 10 monitores foram selecionados para fazer as vistorias em ambas as trilhas. Os demais ficaram responsáveis pela limpeza da área da fogueira de ontem e organização dos chalés, que era uma das tarefas mais demoradas e precisava ser feito logo, mas isso não significava que nosso trabalho era mais fácil.
O grupo da trilha foi dividido ao meio, e eu fiquei com Grover, Thalia, Hazel e Percy fazendo a vistoria do lado esquerdo, enquanto Rachel, Nico, Jason, Piper e Hedge ficaram pro lado direito, para otimizar nosso tempo e cobrir a área toda. A floresta era de fato grande e mesmo que fizéssemos o percurso de bicicleta e não a pé, era cansativo do mesmo jeito.
— Acho que depois dessa trilha a gente podia ir pra praia né? Tá muito calor. — Percy reclama, se abanando com a própria camisa que tinha tirado a uns 100 metros atrás, quando sua pele muito branca começou a pegar a marca da manga num tom meio preocupante de vermelho. Mas ele tinha ficado de duas cores da mesma forma, e eu tinha certeza que a Annabeth ia reclamar com ele por ter esquecido de passar protetor solar na hora que ela mandou.
— Eu concordo. Preciso entrar naquela água gelada o mais rápido possível. — Thalia se pronuncia e todos nós concordamos, ansiosos pra sair daquele fogaréu.
— Falta o que para concluirmos, Grover? — Pergunto a meu amigo que era o responsável pela lista de vistoria e ele verifica sua prancheta após beber água, também muito cansado, apesar de disfarçar melhor que o resto de nós, já que gostava muito mais dessas atividades ao ar livre do que se era considerado normal para um jovem adulto moderno. Isso se Grover fosse de fato um jovem adulto moderno e não um velho aventureiro disfarçado no corpo de um jovem. Isso faria sentido.
— Por aqui tudo certo. Vamos dar a última volta e se reunir com a outra equipe no centro da floresta para concluir nossa vistoria. Depois: praia!
— PRAIA! — Gritamos juntos como se fosse um grito de guerra e subimos nas bicicletas outra vez, dando a volta e retornando ao local de onde nos separamos pela primeira vez. A outra equipe chega dois minutos depois, tão cansados quanto nós.
— Hedge? Por aqui tudo certo. Do lado de vocês? — Grover questiona com seu ar profissional e eu acho engraçado ver meu amigo no contexto coordenador de atividades. Era estranho e legal ao mesmo tempo, ver ele tentar ficar sério e responsável quando na verdade Grover era o mais brincalhão de nós.
— Algumas cobras não venenosas e nada fora do comum. Por mim, tudo certo, Underwood. Turma liberada! — Hedge confere sua lista com a de Grover e libera os grupos, mas antes que a galera do outro lado se disperse completamente, Percy grita, chamando a atenção deles.
— Gente, nosso grupo resolveu ir pra praia se refrescar um pouco. Vocês querem ir com a gente? — Ele fala e o outro grupo se anima, ansiosos como a gente, Hedge faz sinal de aprovação e se afasta, indo resolver seus problemas de gente velha, mas Grover permanece conosco, porque ele nunca ia perder uma praia, mesmo tendo outros problemas a resolver. Era esse tipo de coisa que me provava que no final ele ainda era sim, apenas um jovem adulto moderno.
— Eu acho ótimo. Eu tô derretendo depois dessa trilha! — Piper exclama e já começa a pedalar em direção à praia, enquanto as pessoas a seguem, conversando e comentando sobre o verão e a escola.
Eu me preparo para fazer o mesmo, mas percebo uma movimentação mais acima, perto da entrada da floresta, e vejo que é Nico e Percy conversando sobre algo. Me aproximo devagar e consigo escutar um pouco do que eles falam sem que percebam minha presença de imediato. Sei que isso errado, mas ei! Eu tinha um plano pra por em prática, precisava colher minhas informações né.
— Você não vai? Porque? — Percy questiona e parece mais preocupado com o amigo ao invés de chateado.
— Vou sim, mas quero passar no chalé primeiro. Preciso trocar de roupa e ver uma coisa antes. Encontro vocês lá. Fica de boa. — Nico tenta tranquilizar o amigo dando um soquinho em seu ombro, mas Percy parece não comprar muito aquela história, mas assente da mesma forma.
Nico pega sua bicicleta preta sem cestinha (completamente sem graça e o oposto da minha) e começa a se afastar, voltando para os chalés enquanto Percy segue o resto do pessoal em direção à praia. Eu queria fazer o mesmo que ele, largar esse plano bobo pra lá e ir tomar um belo banho de mar, mas não podia. Eu estava determinado.
Nico di Angelo vem enchendo a porra do meu saco a muitos verões, e eu queria que ele lembrasse desse verão, muito específico, como o ano que ele provou do próprio veneno. Já tinha passado da hora dele aprender algumas lições sobre a vida.
Por isso, me aproximo de sua bicicleta enquanto ele subia a colina e Nico se assusta com minha presença.
— Caralho, assombração. Veio de onde? — Nico questiona estranhando minha presença franzindo seu cenho e se afastando um pouco. Percebo sua tentativa de me afastar e me aproximo mais, propositalmente pensando em deixar ele desconfortável. Eu sei que Nico odeia proximidade com as pessoas num geral, mas comigo era pessoal, o que só tornava minhas tentativas mais inspiradoras.
— Assombração combina mais com você. Minha presença é uma luz no ambiente sabe.
— Eu discordo. Mas o que você quer?
— Conversar, seu insuportável. Difícil pra você?
— Eu concordei em conversar com você ontem? Acho que suas palavras foram "você nunca mais vai me ver", e isso foi a única coisa que me fez aceitar o acordo. Eu quero distância de você o quanto antes.
— Esqueceu que nossa tarefa de limpar os banheiros é hoje à tarde? Precisamos pensar no que fazer.
— Só tem uma coisa para se fazer, Solace: limpar a porra dos banheiros. — Nico suspira irritado com a minha insistência, mas não vou desistir agora. E não é como se estar aqui, forçando essa conversa fosse prazeroso pra mim também. Só me deixava tranquilo saber que para ele era ainda mais irritante.— Você tá inventando essas coisas só pra me irritar.
— Caralho até tentar manter um diálogo com você é difícil, qual seu problema?
— Meu problema é sua presença. Eu não chamei você pra uma pedalada, ta legal? Na verdade, já passou da hora de você vazar.
— Na verdade, eu queria te perguntar— E pronto.
Sabe aquele momento que a sua vida passa em câmera lenta diante dos seus olhos? Que é como se você desassociasse de tamanha forma que você assiste sua própria vida do lado de fora do seu corpo. Bom, imagine tudo isso e você vai entender o que aconteceu comigo, da pior forma possível.
Eu não estava prestando atenção, no meio da minha irritação e plano idiota, mas na minha tentativa de ser ainda mais insuportável pro Nico, acabei aproximando nossas bicicletas sem querer, e meu guidão prendeu no dele e a desgraça foi feita. Nós nos embolamos com freios e correntes e descemos ladeira a baixo, com terra, bicicleta, grito e confusão.
Quando paramos de cair, na entrada da floresta outra vez, estávamos ralados, com sangue pelas roupas e parte das bicicletas destruídas. E óbvio que nosso show não passou despercebido pois os outros monitores observaram a cena, parando suas ocupações e analisando o que viria a seguir, como se segurasse a respiração esperando nossa reação.
Bom, comecem as apostas porque isso não tinha como terminar bem.
— Will, seu idiota do caralho! Olha o que você fez! — Nico exclama e ouvir seus gritos me tira do sério. Não é possível que ele ia jogar a culpa pra mim. Sendo que tudo bem, a culpa era minha, mas eu não ia admitir isso para aquele garotinho idiota.
— O que eu fiz? Você que é um lerdo do caralho que não sabe nem andar de bicicleta! — Exclamo, sabendo que não é totalmente verdade, mas também não é como se a raiva, a dor e a adrenalina me deixassem pensar direito. Era a presença daquele garoto. Desalinhava meu chacras e trazia caos.
— Will, você não conseguiria ver uma ervilha além do próprio umbigo nem se tentasse, não é seu filho da puta? Olha pra isso! — Nico ri sarcasticamente e tenho certeza que Nova York inteira olhava para nós agora. Ele aponta para o joelho ralado, que vaza mais sangue que o normal e o rosto machucado, um pouco acima da sobrancelha, com um filete de sangue e terra nos cabelos.
— E isso foi o que? Eu fiz de propósito foi, porra? — Aponto para meu próprio rosto também ralado e meu cotovelo pingando sangue na bermuda branca.
— Eu sei lá, capaz de ter sido já que você é maluco!
— Você não presta atenção em nada!
— Vai se fuder, William. — Estou tão irritado com essa merda toda que no caminho de pegar minha bicicleta quebrada pra ver o estrago, empurro Nico pro lado. Péssima escolha, eu sabia, mas era tarde demais agora para pensar nas consequências.
— Não me empurra não, porra. — Nico fala ao passo que me empurra de volta com mais força.
A raiva agora subia pelos meus ouvidos e se alojava na minha têmpora, como um pedaço de madeira batendo violentamente. Nico me encara, irritado e quando se aproxima mais, as palavras que saem de sua boca são a causa da confusão que vem depois. Dessa vez eu posso dizer que não comecei uma trocação de soco com Nico di Angelo sem motivo.
— Você faz suas merdas na sua casa. Aqui, não.
Minhas merdas na minha casa? O que esse idiota queria dizer com isso? Ele sequer sabia do que estava falando ou só queria me provocar?
Independente do que fosse, eu jogo tudo pra cima, e perco a cabeça. Meu plano genial, meu objetivo de não brigar e todo o meu autocontrole. Eu não respondia por mim quando estava perto desse cara.
Sinto o impacto na minha mão só depois que ela atinge a mandíbula de Nico e sua cabeça vira pro lado. Estou ofegante e não escuto nada além de nossas respirações, o sangue pulsando em meus ouvidos e agora, a risada sadica que ele solta antes de cuspir sangue pela bochecha machucada no soco e se virar pra mim, com um sorriso no rosto.
Os lábios estão pintados de vermelho agora, e ele passa a mão suja de terra nos cabelos, nervoso, porém eu já sabia o que viria. Nunca estou pronto pro que vem mesmo já sabendo o que vem. Mesmo sabendo que provoquei a situação, dei o primeiro soco e me deixei levar pelas emoções outra vez. Já estivemos nessa situação um milhão de vezes e parece que eu nunca aprendo.
— Agora sim o verão começou, solzinho. — Nico provoca baixo antes de partir pra cima de mim e me atingir com força no estômago, me fazendo arfar.
Depois disso nossa briga perdeu o foco na minha visão e eu só lembro de bater e apanhar. De ocasionalmente acertar um soco ou dois no rosto de Nico e dele me chutando no processo.
Não sei quanto tempo leva, mas quando as pessoas se aproximam para separar a briga, tem muito mais sangue em nossas roupas do que quando caímos. Os lábios de Nico estão inchados e cor vermelho sangue, e sei que parte desse sangue está no meu cabelo, de alguma forma, pois sinto o molhado ao passar a mão na cabeça e vejo nos dedos a cor do sangue que escorria ali. Não sabia se tinha vindo da boca dele na hora que caímos em meio aos socos ou se eu tinha batido a cabeça numa pedra na queda da bicicleta. De qualquer forma, eu podia estar acabado mas ele não estava muito melhor, com a camisa manchada, a bermuda suja e o rosto ensanguentado, assim como os nós de seus dedos, que estariam brancos com a força que ele fazia ao aperta-los se já não estivessem sujos de sangue e roxos da briga.
Era por isso que eu só brigava ao ponto de ir pras vias de fato com Nico di Angelo. Nenhum outro tinha graça. Eu não via graça em brigar, para falar a verdade, mas aquele cara... Aquele cara despertava meu pior lado e minha única vontade era de empurrar a cara dele na lama ou quebrar algum osso do seu corpo. Era sobrenatural.
— Vocês dois estão extremamente fudidos. — É a voz do Senhor D. que ecoa do meu lado, alta porém sem grito. Firme e assustadora, assim como seu aperto em meu braço, e só então percebo a gravidade do que aconteceu. Caralho, podíamos ser expulsos. Vejo a tensão que Percy fazia para segurar Nico afrouxar, quando este desiste de tentar se soltar ao escutar a voz do nosso diretor. Pois é seu idiota, estávamos fudidos mesmo. — E o resto de vocês, voltem a fazer o que estavam fazendo. Vocês dois, vão pro banheiro da Casa Grande se limpar. Depois, minha sala. Isso passou dos limites. — Senhor D. estava sério e impositor, de uma forma que eu nunca vi antes. Ele me solta e caminha a passos firmes em direção a Casa Grande, comigo e Nico subindo a colina atrás dele de cabeça baixa, envergonhados pela cena e pelo sermão público mas acima de tudo, temerosos com a bomba que viria. Porque ela viria.
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last summer - solangelo
Fanfictionnarrações da au do twitter "last summer" na conta @aurorisant