Capítulo 1 | um pavão brilha na cabeça de quem não deveria

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Um silêncio sepulcral dominou a praça principal. Pude ouvir a estática dos transmissores estalando nos meus ouvidos. Uma agulha teria caído no chão com um som ensurdecedor. O mundo suspendeu seu funcionamento durante um segundo solene, como se estivesse processando o ocorrido, respirando fundo, preparando seus pulmões para uma longa expiração.

Daí, de repente, tudo aconteceu.

Os cochichos implodiram entre a multidão de telespectadores. "Então é verdade que ele não deixaria o irmão participar caso fosse sorteado", escutei dizerem com surpresa. "Se oferecer por um ciclope? Que loucura!", outros disseram.

Tyson agarrou minhas pernas freneticamente e começou a implorar:

— Não vá! Não vá!

Clarisse de La Rue me aplaudiu lentamente, um ato singular e inédito — ainda que à contragosto — de demonstração de respeito vindo da filha de Ares.

A musa da tragédia, Mel, começou a saltitar pelo palco:

— Queridos telespectadores, é sobre isso que se trata os Jogos Olimpianos! Devoção e sacrifício! Que empolgante, não é mesmo?

Eu podia jurar que ouvia ao longe os prantos de minha mãe.

— Tyson, largue minhas pernas! — Suas mãozinhas eram fortes quando precisavam ser. Sempre que tentávamos separá-lo de algum brinquedo velho para que pudéssemos nos livrar dele, sua força de ciclope emergia como mágica. Eu estou me sentindo como seu urso de pelúcia puído.

Em meio ao caos, ouço sons de cascos se aproximando. Grover surge afobado, abrindo caminho entre a multidão entretida, e puxa Tyson para si.

— Vá, Percy — seu tom é autoritário, mas melancólico. Tyson tenta resistir, esperneando freneticamente nos braços de Grover, mas meu querido amigo sátiro nem sequer titubeia.

Estou aliviado ao confirmar que ele conseguirá se manter firme diante das dificuldades que certamente enfrentará.

Respiro fundo e permito que os Pacificadores me guiem até o palco. Subo o lance de escadas com uma letargia atípica, temendo cair diante dos meus futuros oponentes. Eu consigo sentir cada olhar que me perscruta, como se a curiosidade do público deixasse rastros de fogo em minha pele.

Observar um tributo ser selecionado e caminhar até o palco sempre proporciona um frenesi entre os presentes, que guardam o momento na memória para fazer apostas mais tarde. Você nunca sabe com certeza se está observando um futuro vitorioso ou um futuro cadáver.

Mantenho minha cabeça baixa, desprovido da coragem necessária para enfrentar o julgamento alheio. Eu não estou pronto para observar minhas chances de sobrevivência sendo medidas por completos desconhecidos.

— Que ato de bravura formidável, querido! — Mel suspira no microfone para que todas as pessoas possam ouvi-la em seu êxtase. — Aposto que aquela criatura é seu irmão. Não quis deixá-lo roubar sua história trágica, hein?

Eu engulo em seco e respondo:

— É óbvio que Tyson é meu irmão! Eu não teria me oferecido como tributo para tomar o seu lugar numa Colheita.

Minha bravata é uma farsa, e não há porquê mantê-la de agora em diante. Se os deuses se ofenderem com alguns atos indisciplinares, que se dane.

Escuto risos tímidos entre a multidão, como se as pessoas tivessem medo de apoiar essa resposta intencionalmente ácida e desrespeitosa e sofrer castigos posteriormente. A musa da tragédia, contudo, explode numa gargalhada genuína.

— Eu adoro um herói com fibra! Não se perca do seu personagem, Percy — ela dá uma piscadela supostamente amigável. — Tenho certeza de que sua personalidade forte garantirá alguns bons patrocinadores.

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