Parte 1

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O momento era de caos e pânico no porto de Águas de Sentina com a tempestade crescente e furiosa, indicando muita chuva ao estrondo dos trovões que cortavam o céu cinza com raios iluminados.

Um comerciante aproveitava os últimos momentos antes de todas as pessoas se retirarem das ruas, vendo os vendedores apressados guardarem as suas barracas sob os primeiros pingos grossos.

— Este exemplar de uma Lunari é o último, tenho certeza de que não irão se decepcionar — o homem colocava os dedos nos lábios da jovem para mostrar seus dentes perfeitos, como um animal que estava sendo vendido para ficar em exposição.

Pela primeira vez, Samira juntou as sobrancelhas grossas, mas bem desenhados em um semblante de desaprovação. Aquilo era permitido naquele lugar?
Rapidamente a noxiana direcionou sua espada afiada em direção ao rosto do comerciante, mostrando os dentes quase em um rugido com cada músculo de seu corpo tenso.

Ao longe, a mulher de cabelos avermelhados observava curiosa, segurando suas armas pronta para intervir, mas se conteve com a aproximação veloz de Samira. Os olhos esverdeados de Fortune percorreram cada centímetro da visitante, que já cuidava bem de seu "problema" por ela. Notou os adornos dourados e detalhadamente esculpidos que enfeitavam a longa trança negra, descendo ainda mais por seu corpo, também adornado em um traje que certamente indicava alguém de uma nação rica e importante.

— Tire suas mãos dela, agora — a voz pausada e até baixa de Samira provocavam medo em quem a ouvisse pela raiva controlada que era perceptível que mantinha no fundo de sua garganta.

Temendo por sua vida, o sujeito tirou as mãos da criatura de pele pálida, mas seus dedos apenas foram substituídos pela luva preta da capitã, que puxou com delicadeza o corpo da Lunari para perto.

— Obrigada por salvar minha mercadoria, seja lá quem você for — Sarah disse em tom de provocação apenas para testar o quanto a noxiana sabia de sua autoridade por lá e estava disposta a desafiá-la.

O olhar raivoso de Samira foi direcionado para a ruiva, mas também a observava com curiosidade, além da habitual desconfiança.

— Quem é você — questionou a morena, ainda com cara de poucos amigos, mas sentindo que Fortune deveria ser importante por sua aparência bem mais cuidada, o perfume doce e acessórios caros — Esse não é um lugar pra garotinhas como você, por que não vai pra casa?

A resposta fez com que a Capitã arqueasse uma sobrancelha, surpresa com tantas características incomuns direcionadas a ela, que só poderiam vir de quem não a conhecia. Samira aproveitava de sua aparência doce e meiga para supor que não era letal e perigosa.

— Eu sou a capitã Sarah Fortune e comando Águas de Sentina — respondeu em tom sério, sem transparecer que não havia gostado da provocação, recebendo um olhar até mesmo da jovem que antes era vendida como escrava — Seja bem-vinda, espero que tenha uma boa estadia, noxiana. Devo alertar que se apresse, as tempestades aqui não são tão sutis quanto eu.

A ruiva caminhou em direção a seu enorme navio, sussurrando apenas para que a menina debaixo de um de seus braços ouvisse.

— Está tudo bem, você estará livre assim que estiver seguro. Qual é o seu nome?

A garota de cabelos brancos hesitou em sua fala, já havia ouvido muitas promessas parecidas, mas o toque de Sarah ainda era leve como uma pluma e suas palavras tão mansas, que quase confiava nela.

— Me chamo Lis — sussurrou de volta, entendendo que a conversa era particular.

— Muito bem, Lis. Você ficará no meu quarto, onde sei que ninguém vai colocar as mãos em você. Devo alertá-la que não tenho intenção de te tocar.

Mulher, ou abismo? Miss Fortune e SamiraOnde histórias criam vida. Descubra agora