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A sensação da respiração densa invadiu minha consciência, gradualmente trazendo-me de volta à realidade. O aroma penetrante de álcool e produtos de limpeza misturados com medicamentos preencheu o ar quando abri os olhos. A luz do dia inundou o quarto, revelando claramente o ambiente ao meu redor, enquanto pequenos fragmentos do que aconteceu comigo se entrelaçavam em minha mente.

Ao lado, minha mãe repousava sobre um sofá, visivelmente cansada e adormecida. Natalia parecia ter envelhecido desde a última vez que a vi, suas olheiras evidentes e roupas simples denotavam o peso do tempo sobre ela. Eu me ergui na cama, a sensação de normalidade tentando me iludir, desejando poder simplesmente dizer à minha mãe que estava acordado.

— Mãe... — murmurei.

Eu achava que me escutaria, mas ela ignorava meus chamados. Talvez estivesse em um sono profundo. Chamei-a várias vezes, mas Natalia não respondia. Ouvi a porta abrir e vi meu pai, que parecia mais velho e menos forte. Kyaku passou por mim, não me notou e foi directo ver minha mãe. Minha avó o seguiu, olhou para mim, mas não nos olhos e depois continou para longe.

— Amor, vamos para casa! — propôs meu pai, delicadamente tocando o braço de minha mãe que despertava naquele instante.

— Pai! — chamei-o, contudo ele não dirigiu seu olhar para mim.

Natalia, com os olhos marejados, evitava o meu olhar, tal como todos os outros. Kyaku me observava com pesar e, com um suspiro, auxiliou minha mãe a se levantar. Insisti em chamar por eles, gritei, mas nenhum deles sequer olhou em minha direcção antes de deixar o quarto.

— Ham?! — exclamei, incrédulo, levantando-me rapidamente para seguir sua trilha. No entanto, tropecei no ímpeto, causando um movimento brusco na cama e terminando no chão. Meus pais voltaram-se para mim, nitidamente surpresos com o barulho, correndo em minha direcção.

— O meu filho! — lamentou Natalia, apavorada ao perceber que havia caído e voltou correndo.

A percepção de finalmente ser notado me trouxe um misto de angústia e desolação. Enquanto os via correr, tentei convencer-me de que tudo não passava de uma paranoia, que nada de estranho estava acontecendo. Porém, essa esperança desvaneceu rapidamente quando percebi que nenhum deles havia me notado. Kyaku foi o primeiro a se aproximar, mas seu corpo simplesmente passou através do meu, seguido pelo da minha mãe e avó. Eu estava tão absorto que não me atrevi a olhar para trás, tomado por um terror e temor indescritíveis.

— O que aconteceu? — indagou a enfermeira, entrando apressadamente no quarto. Ao perceber nossa estranha situação, seu semblante transformou-se em puro terror. — Chame imediatamente o médico de plantão para o quarto 331!

— Como isso pode ser real? — murmurei, assustado, ao contemplar o corpo magro e pálido, conectado a inúmeras máquinas e tubos de soro. Era eu ali, deitado, inerte. O desespero pairava sobre meus pais enquanto observavam meu corpo caído, proibido de levantar para não me machucar.

— Como isso aconteceu? — indagou o médico ao entrar no quarto, seguido por outros profissionais que tiveram a mesma reacção de incredulidade.

— Eu não sei... — respondeu a enfermeira, ainda espantada.

— Chame o doutor Marcos — ordenou o médico, com evidente tensão.

Meu corpo foi erguido com cuidado, e pude ter uma visão ampla de mim mesmo: magro, com ferros de união na perna direita, vestido apenas com uma cueca e uma camisa de hospital. Eu não me reconheceria, mas era eu ali, Osni Popov Cadimuena. Sabia que meu corpo estava morrendo e sentia cada toque, cada sensação. Minha família fora levada para fora, e eu não pude segui-los.

Os Olhos De KawaniOnde histórias criam vida. Descubra agora