Contagem de palavras: 835
Artur tirou a pena do papel. Olhou a mesa à sua frente. Havia um frasco de tinta, um pano e o diário. O diário estava aberto e com páginas preenchidas quase completamente de letras em tinta fresca. Ele releu para ver se não tinha esquecido de algo ou se tinha uma ideia nova para registrar.
E realmente tinha. Escreveu:
"Ah! Quase que eu me esqueço: Ouvi dizer que voar é uma habilidade muito rara, não é qualquer pessoa que conseguiria voar daquele jeito.
Vou na fortaleza do Mago Kalior. Ele tem um gosto por história da magia, registros e essas coisas. Talvez eu consiga identificar meu mago das visões hoje."
Pronto, estava completo agora. Ele poderia guardar tudo. É claro que antes precisaria esperar secar, então decidiu ir fazendo suas coisas.
Secou a pena com o pano de costume, dobrou o pano e guardou os dois em uma caixa de madeira bonita.
Ele queria ir até o mago da família agora de manhã. Imediatamente. Então precisava se vestir bem. Kalior era um homem relaxado com esses assuntos, mas Artur não podia ser. Então foi ao quarto de roupas, que era ligado ao quarto de dormir.
Era um cômodo ostensivo, tão grande quanto o outro. Iluminado por uma grande janela e cheio de armários sem portas. Estes exibiam de roupas casuais até o máximo da elegância, com uma grande variedade de cores. Ele procurou atentamente por peças bonitas e foi até um espelho para se trocar.
Artur era um jovem adulto de cabelos cor-de-ouro volumosos e olhos verdes. De corpo um pouco alto e não muito magro. Ao se despir, deixou à mostra uma marca de nascença — um triângulo — nas costas. E só isso já mostrava de qual família ele era. Os Lara. Os melhores mercadores do reino. Os patronos dos artistas e dos magos indesejados. Os grandes inimigos da coroa.
Quando terminou, vestiu as roupas escolhidas. Uma blusa de mangas longas e uma calça, ambas de tecido leve e macio, ambas roxas. Por cima da blusa vestiu um colete verde de botões de ouro. Por cima da calça, um cinto com pequenos rubis, safiras e esmeraldas incrustados por toda sua extensão em um estilo simples.
Por fim, pôs uma capa vermelha, sua predileta. Era um item obrigatório para alguém como ele no Reino de Trisla. Afinal, capas não eram apenas uma peça de roupa, eram itens da nobreza. Quem usava uma, estava se achando tão importante como um nobre. E um Lara sempre deveria ser tão importante quanto um nobre. Sempre.
Artur levou as pontas da capa até o pescoço e passou os botões dourados pelos buracos, prendendo ela no lugar.
E então olhou seu reflexo. Estava elegante e bonito. Mas a capa poderia dar problema...Pela cor. Vermelho e amarelo eram as marcas da família real e por isso eram ambas odiadas pelos Lara. Houve uma vez em que os pais de Artur mandaram acender várias fogueiras e deram ouro a quem jogasse nelas sacos com flores, tecidos ou quaisquer objetos que tivessem um pingo de cor quente em si. Fora uma mensagem para a família real. Em questão de dias, só sobraram cores frias e neutras naquela região do reino e continuava assim até hoje. Era bem possível que a única peça de roupa vermelha na região fosse a capa de Artur.
Mas o vermelho... Ah, o vermelho! Trazia conforto, bom-humor, paixão. Só de olhar, ele se lembrava do Amor e da sua primeira namorada. Isso, na verdade, nunca fez sentido, porque a cor preferida dela era verde. Os olhos dela também eram verdes, mas Artur sempre lembrava deles sendo vermelhos. As cartas de amor eram um festival de erros de cor. "Passo as noites sonhando com seu olhar doce, um verde vibrante como o de um rubi", escreveu uma vez.
Isso rendeu algumas brigas bobas com a namorada. Talvez esse tenha sido o motivo do fim da relação. Talvez ela tivesse interpretado como uma brincadeira sem graça de Artur. Ele pensava nisso às vezes e nesses tempos o vermelho parecia errado, triste. Mas não era verdade. Com essa cor, o medo e a tristeza sumiam e a alegria e a saudade apareciam. Então que seja! Pensou. Decidiu manter a capa vermelha.
Ele ouviu uma batida na porta e então voz velha disse:
— Mestre Artur, vosso pai vos chama para o café da manhã.
— Estou indo, só tenho que terminar algumas coisas. Avise ele.
— Como queira.
Voltou para o quarto, testou rapidamente se a tinta continuava úmida no diário. Quando viu que não, fechou o diário com o maior cuidado e o guardou na caixa bonita de antes, junto com a tinta e o pano. Fechou a caixa e a escondeu atrás de um dos armários do quarto de roupas.
Andou até a porta e acenou a mão. Artur nasceu sem dons mágicos, era incapaz de lançar magias. Mas todas as portas de cômodos privativos da mansão foram encantadas para se trancarem e se abrirem pela vontade do dono do cômodo. Então, mesmo sendo ordenadas por um homem sem magia, as portas se abriram em um impulso.
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Através Das Eras
FantasiNesse mundo cruel tudo é passageiro. Os rios secam, as montanhas viram pó, as pessoas morrem... No fim, o tempo devora tudo. Tudo menos uma pessoa. Sua morte aconteceu bem antes dos reinos de hoje em dia existirem. Seu poder sumiu como fumaça há mui...