Quando tento fugir de mim.

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Caminhava em passos firmes até a mesa, quando uma dor aguda no meu ventre me fez pender para frente. Pela graça deu tempo de me apoiar na mesa para não ir ao chão, tentando manter as pernas firmes. Aquela dor era insuportável e mesmo que antes tivesse tomado um remédio, ela persistia sem me abandonar.

O médico havia deixado claro minha situação e deixar aquilo acontecendo só agravaria o quadro. Não sei porquê ainda relutava, sendo que não havia mais saída para mim, então apertei os olhos, colocando a mão no local dolorido, esperando que aquilo passasse. O vice-presidente estava no prédio e definitivamente não poderia ser pega naquela situação.

— Algum problema, assistente Souza? — a voz grave do homem preencheu o ambiente.

— Merda — murmurei antes de fazer todo o esforço para ficar ereta, me virando para ele. — Si-sim... — respondi, mas sabia que minha cara não era a das melhores. — Precisa de algo, senhor?

— Eu não, mas você sim. — Tentei exibir um sorriso despreocupado, mas aquela dor estava me matando.

— Está tudo bem... eu vou... os relatórios de vendas estão aqui. — Virei novamente fazendo uma careta.

Fiz a contagem, pedido internamente ao meu cérebro para mandar aquela dor ir embora, pois não suportava mais aquilo e só queria ter uma vida normal. Quando finalmente cheguei no dez, senti a dor dando uma amenizada e virei para o vice-presidente com o relatório em mãos. No entanto ele me encarava desconfiado, tendo os olhos fixos nos meus.

Sem dizer uma única palavra, o vice-presidente Park deu as costas e saiu entrando na sua sala. Rapidamente corri até minha bolsa em busca do remédio para dor — tentando relaxar na cadeira, pois levava um tempo até fazer efeito e eu parecer uma drogada.

O dia se resumiu a disfarçar uma saúde não existente, me escondendo sempre que podia e ansiedade tão atacada, que traguei um maço de cigarros inteiros em um único dia. Aquilo nunca tinha acontecido comigo e para evitar o fumo, comprei um monte de chocolates — ocasionando em uma compulsão alimentar.

Devido aos efeitos colaterais do remédio, vomitei tudo que estava dentro de mim e tinha quase certeza que vomitei minha alma também. Aquilo estava passando dos limites e precisava fazer alguma coisa; eu temia não sobreviver durante a espera da marcação da cirurgia.

Troquei o café por uma garrafa térmica grande de água para me manter sempre hidratada, assim como também evitei os cigarros e o chocolate. De repente o vice-presidente saiu de sua sala e arrastou a cadeira da mesa do secretário Kim, sentando de frente para mim.

— Deseja alguma coisa, senhor? — perguntei ao depositar minha garrafa no chão.

— Está doente, assistente Souza? — pisquei sendo pega de surpresa.

— Não senhor. — Menti.

— Por que parece estar com a pele tão amarelada?

— É a cor natural da minha pele, apenas ficou evidente pela pouca quantidade de maquiagem que usei hoje. — Ele apoiou os cotovelos na mesa e as mãos fechadas no rosto, ficando mais próximo de mim.

— Não gosta de maquiagem?

— Quando posso evitar, evito.

— Já lhe vi sem ela?

— Certamente que não! O mundo corporativo é superficial com relação às mulheres e o padrão de beleza a elas imposto. — Respondi amena e ele assentiu. — Mais alguma coisa, senhor? — seus olhos encontraram os meus.

— Por que se tornou uma cortesã? — franzi o cenho com uma pergunta inesperada.

Naquele dia, o vice-presidente Park estava estranhamente curioso sobre minha vida e o sinal vermelho apitou dentro da minha cabeça, pois não era normal aquilo. Eu sempre desconfiei de tudo e todos; um homem como ele nunca ficava curioso com a vida de uma mulher tão de repente e o conhecendo bem, coisa boa não era.

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