Capítulo 9 - GUILHERME

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Hoje foi um daqueles dias em que nada pareceu dar certo. Desde o momento em que Hellen ligou, pedindo para conversar com urgência, uma sensação de apreensão tomou conta de mim. Mesmo sabendo que não temos nada, a ansiedade e a aflição me dominaram enquanto eu aguardava a conversa.

E para piorar, meu pai passou o dia inteiro me criticando, desferindo palavras dolorosas que atingiam em cheio minha confiança. Ele nunca acreditou no meu potencial, insistindo que nunca conseguirei entrar na Stanford University School of Medicine. Para ele, não importa o quanto eu me esforce nos estudos e tire as melhores notas. A cada passo que dou em direção aos meus sonhos, ele está lá para desacreditar, para me rebaixar, me fazendo sentir como se eu nunca fosse bom o suficiente. Às vezes, sinto falta do meu irmão, Deivid, que sempre enfrentava nosso pai de frente. Mas ele resolveu ir estudar do outro lado do país, deixando-me aqui sozinho, triste e frustrado.

Quando meu pai entra no quarto e me vê mexendo no celular, sua ira não tem limites. Ele exige que eu entregue o celular imediatamente, afirmando que jamais conseguirei realizar meus sonhos se não me dedicar completamente aos estudos. Sinto uma onda de raiva percorrer meu corpo ao entregar o celular, mas antes que eu pudesse dizer algo, ele me agride com um tapa no rosto. Sua voz ecoa em meu ouvido, cheia de desdém e desprezo, me rebaixando ainda mais.

- Seu merda, cale a boca! Você deveria me respeitar, afinal, sou eu quem paga por tudo o que você tem. E a única coisa que você deveria fazer é ser o melhor aluno, mas nem isso consegue.

Com o coração pesado e a ferida da humilhação ainda pulsando em meu rosto, sinto-me impotente diante do desespero que parece nunca ter fim. Como posso seguir em frente quando aqueles que deveriam me apoiar são os primeiros a me derrubar?

- Você acha que me esforço tanto nos estudos apenas para brincar? Você acha que não quero entrar na faculdade de medicina? Eu estou dando o meu melhor, mas você só consegue ver meus erros!, retruquei, sentindo a raiva borbulhar dentro de mim.

Meu pai permaneceu impassível, seu olhar cortante perfurando minha alma. 

- Você acha que eu deveria te respeitar? Você não merece respeito até aprender a se comportar como um homem de verdade, ele respondeu, sua voz carregada de desdém.

Eu engoli em seco, sentindo o gosto amargo da derrota. Cada palavra dele era como um golpe no meu orgulho, corroendo minha autoconfiança até restar apenas uma casca vazia.

- Eu farei o que você mandar, pai, murmurei, resignado à minha condição de eterna decepção aos olhos dele. Mas por dentro, uma chama de determinação queimava, alimentada pela injustiça que eu enfrentava todos os dias. 

Enquanto meu pai saía do quarto, deixando-me sozinho com meus pensamentos tumultuados, uma preocupação adicional se infiltrou em minha mente. Como eu iria contar a Hellen que não poderia comparecer ao nosso encontro? Ela parecia tão ansiosa para conversar comigo, e agora, enfrentando problemas em casa, eu não tinha certeza se conseguiria encontrar uma maneira de explicar a situação sem deixá-la preocupada ou magoada.

Refletindo sobre as palavras duras e desencorajadoras do meu pai, percebi que a batalha que eu estava enfrentando não era apenas acadêmica, mas também emocional. Eu precisava encontrar uma maneira de me libertar das garras do desespero e da auto-dúvida, mas no momento, a tarefa parecia insuperável.

No entanto, mesmo no meio da escuridão que me envolvia, uma luz de determinação piscava dentro de mim. Eu não permitiria que os desafios e as críticas constantes do meu pai me derrubassem. Eu encontraria uma maneira de superar os obstáculos que se interpunham no meu caminho, mesmo que isso significasse enfrentar um novo conjunto de desafios.

Com um suspiro pesado, peguei meu caderno de estudos e me preparei para mergulhar em uma noite de estudos solitária. Mas enquanto folheava as páginas, uma pequena voz dentro de mim sussurrava que, apesar de todas as dificuldades, eu ainda tinha esperança. E talvez, só talvez, essa esperança fosse suficiente para me guiar através das sombras para a luz no final do túnel.

....

Chego ao corredor e noto uma figura sombria movendo-se furtivamente à distância. Meu coração dispara enquanto tento distinguir quem ou o que poderia estar lá. A sensação de vulnerabilidade aumenta, pois sei que deveria estar sozinho em casa àquela hora da noite.

Com passos cautelosos, avanço lentamente pelo corredor, me esforçando para manter a calma. Cada sombra parece ganhar vida própria, alimentando meus medos mais profundos. Sinto um calafrio percorrer minha espinha enquanto me aproximo da figura misteriosa.

Meus sentidos estão em alerta máximo, e a adrenalina corre livremente por minhas veias. A incerteza do que me espera à frente é avassaladora, mas a curiosidade e a necessidade de enfrentar o desconhecido me impulsionam adiante.

Respiro fundo, preparando-me para o que quer que esteja por vir, enquanto me aproximo cada vez mais da figura no corredor escuro da meia-noite.

Deivid emerge das sombras, revelando-se como a figura misteriosa no corredor. Seus passos são firmes, mas seu rosto está obscurecido pela escuridão, aumentando minha ansiedade.

- Deivid?, chamo, tentando ocultar a turbulência em minha voz.

Ele para diante de mim, seus olhos brilhando fracamente à luz fraca do corredor. Há uma leve tensão em sua expressão, o que só aumenta meu desconforto.

- O que você está fazendo aqui? Eu pensei que você só viria no Natal, pergunto, sentindo um nó se formar em minha garganta.

Ele suspira, uma sombra de preocupação cruzando seu rosto. 

- Papai ligou e pediu para eu vir. Ele quer ter uma conversa séria com você, responde, sua voz baixa, mas firme.

Um calafrio percorre minha espinha enquanto processava suas palavras. Uma conversa séria com meu pai? Isso não poderia ser bom.

Antes que eu pudesse responder, Deivid acrescenta: 

- E quem é a garota pela qual a Agata mencionou? Ela disse que você anda preocupado com alguém.

Sinto-me pegando de surpresa pela pergunta direta. 

- É... é complicado. Hellen é uma amiga, só isso, balbucio, tentando desviar o assunto.

Deivid arqueia uma sobrancelha, claramente não convencido pela minha resposta evasiva. 

- Certo. Mas cuidado para não se envolver em problemas, ele adverte antes de desaparecer de volta para a escuridão do corredor.

Fico ali parado, as palavras de Deivid ecoando em minha mente. Enquanto o peso das preocupações se acumula, percebo que a noite está longe de acabar, e os desafios que me aguardam parecem cada vez mais sombrios.

Enquanto o silêncio da noite envolve a casa, me vejo imerso em pensamentos tumultuados. A preocupação com a conversa iminente com meu pai se mistura à culpa que sinto por não ter avisado Hellen sobre o cancelamento de nosso encontro. O que devo fazer agora?

Uma enxurrada de incertezas me assola enquanto tento encontrar uma solução para essa situação delicada. Devo ligar para Hellen e explicar a situação? Ou devo esperar até amanhã para abordar o assunto?

O peso da responsabilidade parece esmagador, e sinto-me angustiado com a ideia de magoar Hellen ou decepcioná-la. Mas também sei que não posso ignorar o problema, deixando-a esperando por uma explicação que nunca chegará.

....

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