Capítulo 16.

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Vou andando em passos apertados até a saída. Por uma não-sorte, hoje irei andando, logo hoje que tive que ficar igual um condenado no chão fazendo posições estranhas com um conhecido que não conheço. Pensou besteira ao ler “posições estranhas”? Então você perdeu, caso contrário, parabéns. 

Enquanto estou a centímetros de distância do portão, ouço passos atrás de mim, logo sendo parado por uma mão quente e bronzeada no meu pulso. 

— Espera! Que mal-educado, nem vai se despedir? — Ele diz com um bico, me fazendo dar uma risada irônica. 

— Olha, não me leve a mau, mas fazer aquela merda foi torturante e não consigo pensar em nada além de ir para casa. Então tchau! Já me despedi, me deixe ir. 

Ele sorri, ainda com a mão em meu pulso. Seu olhar cai para onde ele segura, afrouxando o aperto que já era fraco, e analisando minhas pulseiras em seguida, acariciando cada uma. 

— Sua favorita era uma de miçangas azul-marinho e uma flor no centro, de cor azul bebê. 

Sua voz é nostálgica, não se esforçando em se lembrar. Tenho a sensação de que não é a primeira vez que ele pensa nessa pulseira. 

Não fico mais surpreso por essas coisas que ele me diz sobre minha infância, nossa infância talvez? É verdade, a pulseira azul era a minha favorita, só porque foi Naruto quem a fez. Eu amava ela, todos os dias ela estava lá, colada em meu pulso e me fazendo sorrir sempre que eu a olhasse, tudo porque 𝘕𝘢𝘳𝘶𝘵𝘰 𝘢 𝘧𝘦𝘻, qual era minha obsessão por ele? E por que ela teve que quebrar meses depois que ele foi embora? 

Engulo em seco, agora percebo claramente esse gosto ruim de quando lembro dele, o engraçado é que eu o lembro, mas não faço ideia de como era seu rosto. Dizem que quando você se apaixona, não se esqueceria do rosto da pessoa, por isso, eu não me apaixonei? 

Merda. 

— Solta. — Peço, puxando meu pulso de volta para mim num movimento brusco. 

Suas sobrancelhas saltam e sua boa se entreabre com o ato, mas ele não parece se surpreender. O olho por alguns segundos esperando uma reação, não foi por querer, foi por impulso, mas não vou pedir desculpas. 

— A gente se vê amanhã. 

O ouço dizer, mas não respondo, já estou longe demais para isso. Se eu estivesse perto, eu responderia? 

Ergo o celular na altura dos meus olhos, suspirando ao ver o horário. 15:31.

Por algum motivo fiquei chateado por ele lembrar daquela pulseira, ao lembrar dela eu lembro dele. Não gosto de lembrar dele, e então, decidi não procurar por algo que me fizesse entender de onde conheço o Sem nome, mas consigo? Não. 

Algo me perturba para entrar em algum lugar que tenha uma resposta, não consigo simplesmente me sentar no sofá e esquecer do assunto. Tenho que saber, se ele não vai me contar sozinho, eu vou descobrir sozinho. 

Bufo, passando a mão no rosto agoniado e bagunçando meus cabelos, me levantando bruscamente para não desistir e quase arrancando meus dedos de tanto que eu os contorço. Não que eu conseguisse desistir. 

Vou até o quarto de porta cinza-branco, aonde guardamos todas nossas memórias. Algo nesse quarto me chama, como se a resposta estivesse ali. Mamãe não deixa entrar no quarto por falar que tem muita poeira, pois sou alérgico, pois bem, hoje é o dia! Estou sozinho, ninguém pode me impedir. 

Sinto minha mão tocar na maçaneta de ferro fria, a entortando para abrir a porta, mas, não consigo. 𝘕𝘢̃𝘰 𝘢𝘣𝘳𝘦, 𝙚𝙨𝙩𝙖́ 𝙩𝙧𝙖𝙣𝙘𝙖𝙙𝙖, 𝙥𝙤𝙧 𝙦𝙪𝙚̂? 

Suspiro, se só tem lembranças nesse quarto, pra que trancar? Não importa, vou achar a chave. Penso um pouco, parado no mesmo lugar e me imaginando como uma chave. Se você fosse uma chave, onde você estaria? 

Ouço um tic na minha cabeça, nada mais justo do que a chave estar no quarto dos meus pais, não é? 

Corro e subo as escadas rapidamente, ficando de frente com a porta que guardava seu quarto e a abrindo. Se eles não trancam nem o próprio quarto, pra que trancariam um quarto com fotos de Itachi e eu sem roupas quando éramos bebês? Inacreditável. Ignoro o pensamento e apenas prossigo, procurando algo que pelo menos se parecesse com uma chave, e acho, uma preta e empoeirada atrás de um relógio de mesa na escrivaninha. Belo esconderijo. 

Tenho certeza se é essa a chave? Não, mas já estou no penúltimo degrau da escada, ansioso para ver se a porta iria abrir. Outra questão, por que esconderam a chave? Isso, sim, importa, mas não é como se eu pudesse ter a resposta agora, então apenas enfio a chave na porta cinza-branco e sorrio quando ela se encaixa perfeitamente. Vualá! A porta abriu. 

Pelo contrário do que minha mãe disse, o quarto parece muito bem conservado e sem poeiras, apenas com cara de que alguém não o visitava há um tempo. Observo as prateleiras com discos e DVDs dos anos oitenta, logo prestando atenção numa estante de madeira com vários álbuns de fotos e nossa árvore genealógica. Deve ter alguma coisa, né? 

Pego um álbum de capa azul escrito “Sasuke”, com uma fonte infantil e letras coloridas destacadas. Abro o álbum e faço careta a cada foto, que merda, odeio minha mini versão, eu era feio, parecia um rato de cabelo preto. 

Suspiro impaciente, estou suspirando muito hoje. Passo as páginas sem interesse, não tem nenhuma foto interessante, ou ao menos não tinha, até chegar nos meus dois anos. Percebi uma criança que estava sempre comigo, mas por algum motivo, de rosto riscado com caneta preta. Algumas fotos riscadas, outras rasgadas bem onde estava seu rosto, e então uma me chama ainda mais atenção por eu ainda lembrar daquele dia. 

Estava na aula de muay thai, eu e aquela criança de rosto borrado havíamos acabado de sair de uma luta e eu o carregava apoiado em meu ombro. Me lembro claramente do dia, até do professor, mas não dele. A foto estava na parte dos meus dois anos, mas tá errado, naquele tempo eu tinha cinco. O que é isso? 

Engulo em seco, é normal seus pais riscarem o rosto de um antigo amigo seu? Olho a foto mais uma vez, ainda dava para ver o braço do garoto, mas metade da foto estava rasgada, só tinha eu ali. Onde está a outra metade da foto? 

Passo alguns minutos procurando por outras coisas e descubro que esse menino só aparecia comigo até meus quatorze anos. Quando 𝚎𝚕𝚎 foi 𝚎𝚖𝚋𝚘𝚛𝚊. 

O calor começa a me incomodar, uma janela manda feixes de luz bem aonde eu estava. Procuro em outros álbuns, mas não há nada, e depois de alguns minutos eu desisto. 

Saio do quarto como um fracassado, depois de deixar todos os álbuns nos lugares e trancar a porta, subo as escadas para deixar a chave em seu devido lugar, algo me diz que ninguém deve saber que entrei no quarto. 

Vou até o quarto dos meus pais e deixo a chave atrás do relógio de mesa, não na mesma posição, pois com certeza não vou lembrar, mas não é possível que até eles lembrem. Ando para fora do quarto até que chuto sem querer o pé de madeira da cama, berrando dois ou dez palavrões, alguns em japonês e outros em português pela dor, mas quando resolvo olhar para o que causou minha dor, algo chama minha atenção. 

A metade de uma foto rasgada atrás do pé da cama. Como assim? Resolvo agachar e pegar para visualizar-lá melhor, quase caindo quando vi claramente a pessoa na foto. Memórias me invadem, momentos me perfuram e todas as fotos que eu vi com o menino de rosto rabiscado, foram restauradas. 

Arregalo os olhos e me sento rapidamente antes de cair por sentir minhas pernas e respiração falharem. Minhas pupilas não desgrudam da foto em minhas mãos trêmulas e sinto meu coração bater tão forte quanto um lutador, me deixando com medo, se ele bater assim por mais tempo, poderia explodir? 

Uma mistura de calor e náuseas surgem, a única coisa que consegui escutar era um ruído fino e agonizante quando minhas orelhas fecharam. Minha visão ficou turva e meu corpo caiu, logo, tudo escureceu. 

romA. - Narusasu. Onde histórias criam vida. Descubra agora