A dança dos sentimentos

2-Marasmo desmedido.

O café leva dois anos em processo de preparação, desde a torrefação, moagem até a preparação. Dois anos é muito tempo para chegar ao local dos consumidores e eles colocarem açúcar dentro tirando assim o sabor original do produto, Miranda é ciente disso e por isso o prefere ácido, na doçura natural, e amargor, bem quente, sentindo as nuances que esse líquido em sua versão original é capaz de proporcionar, como deve ser. E esse, ainda mais especial por ele ter vindo das mãos de uma tola garota com grande potencial para o sucesso. Miranda sorrir tomando o último gole da bebida que tanto ama, essa é a segunda vez que recebe o café das mãos da garota. E a trocar de olhar brilhante entre elas enquanto Andreah ofertava o café deixou algo estranho na atmosfera. Tempo longo demais para o café passar de uma mão a outra, tempo longo demais para Miranda molhar os lábios com a língua e menear a cabeça em afirmativa para a garota que não escondeu a surpresa da interação gestual.

Ela não pergunta por que pensa em Andreah e o quanto esse gesto foi apreciado por ela. Ela sabe e conhece a garota a ponto de ter certeza que ela só está se chegando para conseguir a entrevista. Miranda balança a cabeça em negação. Foi ousadia demais da parte da Andreah. Miranda gosta, admira pessoas atrevidas que não tem medo de arriscar em busca do que quer.

- Ligue para Mirror e confirme a entrevista para sábado naquele restaurante que ganhou a quinta estrela. - Miranda desliga o telefone da sua casa assim que informa sua segunda nova assistente.

Miranda caminha pela sua grande mansão, segue para seu escritório, as meninas não estão em casa, Stephen saiu para uma reunião de trabalho. A editora dobra uma das pernas para sentar em cima dela na grande poltrona no canto mais escondido do escritório. Com uma caneca de chá calmante, ela encara o nada perdida em seus pensamentos. Ela suspira. É diferente para ela viver sempre rodeada de pessoas, ter um marido, ter duas filhas, ter uma vida profissional perfeita e ainda assim se sentir sozinha e incompleta, com a sensação de que sempre está faltando alguma coisa. Sentimentalismo nunca foi a praia da Miranda, mas ultimamente ela tem pensado bastante, e isso se intensificou depois da partida da garota. Ela não sabe o motivo.

Ela não entende, era um cenário que ela havia montado e a consequência final era a desistência da garota, mas porque isso mexeu tanto com ela? Por que ela sente falta daquele sorrio genuíno, daquele olhar grande e curioso, daquelas sobrancelhas expressivas. Miranda balança a cabeça em negação, pega O livro e volta a sentar, tentando se concentrar apenas no trabalho, como ela sempre faz.

Horas depois a mulher perde a concentração ao ouvir barulhos no corredor. Ela sabe que é Stephen. Ela olha a hora, e ela como uma mulher de negócios sabe que aquele horário era tarde demais para quem estava em reunião empresarial. Miranda caminha para fora e para seu espanto, Stephen está sendo ajudado por uma jovem loira, esbelta e de vestido vermelho colocado ao corpo.

- Você é maravilhosa. - Ele fala embriagado tentando encontrar a orelha da garota com os lábios.

- Está entregue. - A jovem se desvencilha do homem saindo da mansão.

- Oh, você está aí. - Ele cambaleia em direção à esposa. - Pensei que havia ido a alguma festa da revista. - Sua mão encontra a cabeça da esposa.

- Você estava com uma mulher, Stephen. - Miranda indaga séria e cansada.

- É isso que os homens fazem quando a esposa não comparece para o marido. - Ele passa a mão no cabelo da Miranda e cambaleando começa a subir as escadas.

Miranda assiste calada vendo seu esposo partir para o andar de cima, e assim que o perde de vista, ela solta o ar pesado que guardava em seu pulmão. É deprimente demais ela se ver nessa situação. E era algo assim que ela teve medo de Andreah ouvir quando subiu as escadas e a viu se explicando para o cônjuge. Miranda teve medo da sua pose perfeita, da sua aparência e vida perfeita cair por terra ao ter alguém de fora presenciando a briga deles.