As histórias seguem cursos tortuosos antes de chegar ao fim. Cada escolha leva a uma nova nova curva, criando cada vez mais possibilidades. A história de Giselle se cruzou com outra, criando um caminho sombrio e sinuoso que nunca deveria ter existido. As tempestades do príncipe derrubaram árvores e destruíram a estrada, fazendo com que a única saída fosse um precipício. Consequências cruéis para alguém que foi vítima de atos cruéis.
Logo tudo se apagou e ela seguiu misturando as lembranças dos dois garotos, o que era e o que deveria ter sido. O mundo se dissolvida em cores, aromas e texturas em meio ao breu. A noite não era mais tão assustadora.
Giselle nunca se sentira tão leve. Seu corpo, se é que tinha um, parecia flutuar, deslizando pela névoa. Talvez ela fosse a própria névoa. Se sentia completa e difusa ao mesmo tempo. Sua consciência estava em cada pétala de margarida, em cada grão de terra e cada corrente de ar. Era como se visse de cima o mundo inteiro, compreendendo as conexões delicadas que faziam seus ciclos acontecerem.
Infelizmente a sensação durou pouco. Um frio sobrenatural começou a incomodá-la pelas pontas dos dedos. Depois, pelas costas, como se estivesse mergulhada em um lago congelado. Luzes passaram por suas pálpebras dançando em borrões prateados e o cheiro de terra molhada era aconchegante como um convite.
Ela abriu os olhos, confusa. Para cima havia estrelas que ela nunca tinha visto. Ao seu redor, jovens garotas formavam um círculo segurando velas. As chamas eram azuladas de um jeito sobrenatural. Seus sentidos estavam estranhos, como se sua pele fosse uma roupa frouxa sobre a alma confusa.
Ela se sentou assustada, percebendo que estava deitada em algo leitoso com apenas o rosto para fora. O mais estranho é que não sentia os cabelos pesarem como quando estavam molhados. Tentando se lembrar, alguns flashs surgiram em sua mente. A floresta, as borboletas, o homem que a tirou do chão quando voltava para casa e a dor percorrendo o corpo enquanto a água do lago era tingida com seu sangue. A raiva borbulhante foi a primeira coisa que pareceu como antes. Loys, ou melhor, Elysian precisava pagar.Uma luz forte surgiu em cima dela, descendo enquanto tomava forma de uma mulher que usava um capuz branco. Ela era linda de um jeito que causava arrepios. Sua pele, branca como as pétalas de dália que acabaram de se abrir, parecia brilhar de dentro para fora. A mulher estendeu a mão para ela com um sorriso suave no rosto e a jovem reparouem sua palma escura como se usasse luvas.– Bem-vinda, querida. – sua voz preenchia todo o espaço. – Você é uma de nós agora.De pé, Giselle pôde olhar ao redor com mais clareza. A água esbranquiçada estava na altura de seus tornozelos. Ao redor do lago raso, havia salgueiros e algumas plantas rasteiras que a névoa não deixava que identificasse. As jovens no círculo eram diferentes uma da outra em todos os aspectos, mas tinha a mesma aura cintilante. Apesar disso, tinha um olhar melancólico e compreensivo direcionado a ela. Giselle olhou para si mesma, descobrindo que usava o mesmo vestido branco flúido que todas as outras.– Onde eu estou? – perguntou, voltando a olhar para a mulher. – Aqui é uma espécie de limbo onde aguardamos as noites de lua cheia. – respondeu. – Deve demorar apenas alguns dias.– E o que acontece nas noites de lua cheia? – questionou, franzindo o cenho.As peças começavam a se juntar. As memórias confirmavam que havia morrido, então por que ainda tinha um corpo, mesmo que estranho? Tentou se lembrar das histórias que sempre ouvira sobre o pós morte. Aquele de fato não parecia um lugar de punição nem de bençãos, muito menos um local onde seria julgada.– É quando Selenia está forte o suficiente para abrir o portal e deixar que visitemos o mundo dos vivos. É a última dádiva que ela pode nos conceder. – Ela fez uma pausa dando um passo atrás – Eu sei que há uma chama em ti, clamando por se alastrar. Aqui, você não precisa ser uma boa menina que sorri e concorda, todas nós passamos pelo mesmo que você. – Ela estendeu os braços, indicando as outras garotas à sua volta. Giselle a compreendeu. O brasão do reino em azul e amarelo se misturava ao príncipe traidor em quem confiara. O ódio retornou queimando-a de dentro para fora, começou pelo peito e foi se esgueirando até as extremidades do corpo.– É isso o que nos fez Willis. – continuou a rainha. – As jovens enganadas, traídas, desprezadas por homens que acham que podem fazer o que quiserem. – Sua voz subia conforme era tomada pela mesma chama que queimava em Giselle. – Selenia nos recompensa por fazê-los provar do próprio veneno. A jovem sorriu, ansiando pela satisfação de ver estampado no rosto do príncipe o mesmo terror que a tomou em seus últimos momentos.– E o que eu preciso fazer?Todas as jovens ao seu redor sorriram, olhando umas para as outras, agindo mais como as garotas que foram um dia.– Vamos explicar tudo.
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Giselle
عاطفيةVocês já conhecem o fim dessa história, mas há por menores mais complexos do que parece ao se falar de uma garota apaixonada por um homem que não merecia seu amor. Giselle era uma camponesa que sonhava em ver o mundo além da sua cidade e fazer parte...