capítulo 02

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...

- Tem mais de vinte e cinco anos, Marília, não é mais uma menininha. Está na hora de começar a construir a sua família.- franziu o cenho e fez uma careta.

- Não é minha prioridade no momento estou bem solteira - respondi na defensiva. Dentre as inúmeras coisas que passaram pela minha cabeça, nunca poderia imaginar que ele me pediria tal coisa. Desde que completei maior idade, dediquei me aos estudos e, posteriormente, a minha própria empresa que exigia de mim cuidados em tempo integral para se tornar ainda maior. Embora tivesse sido criado com tudo do bom e do melhor, eu almejava o meu próprio poder e dinheiro, e estava contente com os resultados que já tinha obtido. Mas eu ansiava por mais, e uma família não se encaixava ainda na minha equação para o sucesso. Não que não pretendesse um dia me casar, mas isso aconteceria daqui alguns anos.

- E eu estou ficando velho e quero ver meus bisnetos crescerem.- Deu de ombros.

- bobagem vovô- Fiz um gesto coma mão, sentindo me desconfortável com o olhar intenso sobre mim,- sua saúde é de ferro.

- quando foi a última vez que saiu com alguém, Marília!?- sua voz soou grave e eu engoli em seco, passando as mãos nos meus longo lá fios de cabelos.

Tentei me recordar quando me envolvi intimamente com outra mulher, porém não consegui recordar. Diferentemente das outras mulheres, possuo um pênis no meio das pernas, e eu era uma mulher que sabia controlar os meus desejos, então tive muitos poucos casos ao longo dos anos. Não vejo o sexo como uma válvula de escape, mas sim o trabalho. Nada era mais prazeroso do que afundar- me em relatórios, planilhas e projeções de crescimento, essa última, a melhor parte.

- seu silêncio me diz muita coisa Marília.- levou a mão ao rosto e soltou suspiro. - Nem tudo resume a trabalho, minha filha. É muito bom ter alguém para que voltar todas as noites, compartilhar problemas. Os beijos, os toques, as risadas cúmplices, as conversas. Amar e ser amado....

- Sinto falta dela também, vovô -falei suavemente, compreendendo que ele estava preso na saudade que sentia da mulher amada. Ilda tinha sido uma mulher memorável e completamente apaixonada pelo marido, mesmo com todos os problemas, brigas e momentos difíceis.

E é também por ela que eu desejo que você constitua sua própria família e me dê um herdeiro. Sempre desejamos a sua felicidade, Marília. Ilda me esfolaria vivo se soubesse que eu permiti você se afogar no trabalho e deixar tudo o que mais importa de lado.

- Eu...- ele ergueu a mão fazendo gesto para que eu parasse. Como uma menina pequena, apenas obedeci.

- me dê um bisneto ou bisneta que eu tiro seu pai da presidência

Engoli em seco e assenti.

-Agora me conte como foi a negociação com os produtores de gado da região centro- oeste, estava curioso para saber os resultados dessa sua viagem.

Mudou de assunto deliberadamente, então eu me pus a discorrer sobre tudo o que ocorreu quando eu estava fora e o quão foi difícil conhecê-los a vender a carne para a minha empresa a um preço justo para ambos. Mas enquanto eu fala, minha mente buscava algum argumento que me permitisse obter o que eu queria, sem ter que dar o tão sonhado bisneto que ele queria.

Era inconcebível me tornar mãe apenas porque ele assim desejava e achava que seria o melhor para mim. Não cederia a essa barganha. Definitivamente, não havia espaço nem tempo para um bebê e uma mulher em minha vida!

Maiara"

Tinha sido um plantão puxado e estava louca para chegar ao meu apartamento, que ficava em um conjunto habitacional em uma das principais avenidas da cidade. Eu amava trabalhar cuidando das pessoas, embora nem todas fossem gentis, o que era compreensível. Desde pequena minha brincadeira favorita era fingir que meus ursinhos de pelúcias eram meus pacientes, os quais, com meus calorosos cuidados, ficavam bons uma hora depois. E isso fez com que eu quisesse me tornar enfermeira e, com o apoio da minha mãe e do senhor a qual ela trabalha há anos, consegui me graduar e me especializar em terapia intensiva, emergênciaas e traumas.

Mas hoje meu corpo doía pela tensão e pela briga que tive mais cedo com uma das minhas colegas de profissão, sobre o modo como ela tava tratando um paciente menor de idade que tinha sofrido um aci6de moto. Não gostava muito da mulher que era auxiliar de enfermagem, e ver ela destratando a todos, a cada dia que passava, só me fazia desgostar ainda mais. Eu não suportava Injustiças e perdi as estribeiras com ela. Embora fôssemos concursadas, isso não nos dava o direito de tratar as pessoas como se fossem animais. Definitivamente, essa era a parte ruim de se trabalhar em um hospital público, ainda mais em um em que a população local considerava os profissionais como carniceiros.

Respirei fundo ao caminhar pelo shopping que dava para a estação de ônibus, sentindo meu pé incomodar na sapatilha, mas, pelo horas, para a minha felicidade, eu conseguiria ir sentada.

E assim aconteceu. Durante todo o trajeto pela avenida Antônio Carlos, apenas observwi6a paisagem, que se transformou muitos nos últimos anos, iluminada pelos postes. Belo Horizonte não era a cidade mais bonita do mundo, mas amava seu clima agitado e o fato de eu encontrar várias pessoas conhecidas quando eu menos esperava. Foi assim que reencontrei Fernando, um colega do ensino médio, e começamos a namorar depois de alguns encontros.

Não podia negar que, depois de dois anos de relacionamento, estávamos mais em baixa do quem em alta. As brigas se tornaram uma constante, principalmente sobre o que queríamos para o futuro. Ele queria aceitar uma vaga de emprego no interior, e eu, manter o meu próprio. Eu sonhava em ser mãe, ele desconversava e dizia que ainda tínhamos algum tempo antes de dar esse passo. Eu até poderia dar razão a ele, mas algo dentro de mim me dizia que era apenas uma desculpa ,podia ver isso em seus olhos sempre que toca no assunto. Apenas não entendia por que, depois disso tudo, ainda continuávamos juntos, insistindo em algo que claramente não daria certo ao longo prazo. Por mais que eu ainda gostasse e muito dele, não éramos mais compatíveis, e o fogo que existia entre nós não mais queimava. Tudo se tornou mecânico, os beijos não tinham mais aquele sabor, e Fernando parecia cada vez mais distante. Mesmo assim, me apegava a ideia de que ainda poderíamos dar certo, de que teria a família feliz e o amor que sempre vi entre o senhor Estebàn e ilda, os patrões da minha mãe.


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Um Bebê Por Encomenda - Adaptado.Onde histórias criam vida. Descubra agora