capítulo 09

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Maiara enrugou o cenho para mim e, quando dei um passo para trás, ela aproximou-se novamente, como se a proximidade entre nós dois fosse algo tão natural hoje como era quando erámos menores.

Talvez, diferentemente da maldita canalha que me sentia, Maiara  não fosse tão consciente de que, antes de tudo, éramos mulher e mulher. Era uma cretina mesmo por colocar maldade onde não havia.
— Você é a última pessoa que pode falar de mim, lila.— deu um passo para trás e seus lábios rosados se curvaram levemente para cima, um brilho ardendo nos olhos castanhos dela —,eu trabalho doze horas, descanso trinta e seis, te garanto que você não pode dizer o mesmo, Grandona.

Gargalhando com o seu próprio comentário, enchendo a cozinha com a doce melodia, deu um tapinha no meu peito, em diversão, e deu outro beijo estalado na minha bochecha.
Depois, se afastou, aproximando-se da dona Almira que modelava uns biscoitos e os colocava em um tabuleiro.
— Então quem é a workaholic  aqui, hein? — comentou maliciosamente, sua boca sorrindo provocantemente.

— Não foi uma tal de Marília Mendonça, a CEO da Comer Bem Alimentos, que deu uma entrevista recentemente em um dos principais jornais de economia do mundo que disse que para ser bem-sucedida é necessária dedicar bastante tempo, inclusive os finais de semana, ao trabalho?
Dei de ombros e abri um sorriso. Ela sempre conseguia me pegar ou me colocar contra a parede.

E o ar de satisfação que tomou o seu rosto me indicava que Maiara sabia bem disso. Se eu não a conhecesse tão bem, ela conseguiria me dobrar por completo.
— É o preço alto que tenho que pagar, como você bem sabe.

— Convencida! — Não contive a risada quando Maiara fez uma careta e vi Almira em silêncio, maneando a cabeça como se observasse duas crianças pequenas interagindo.
Provavelmente estava se recordando de quando éramos menores e agíamos da mesma maneira.
— Bonequinha!
— Bobalhona! Fitando Maiara profundamente, caminhei com passos lentos até ela, como se fosse um predador, esquecendo-me completamente de tudo e do quanto pareceria infantil, parei na frente daquela mulher linda que me encarava risonhamente, e erguendo minha mão comecei a fazer cócegas nela, arrancando uma gargalhada rouca enquanto ela se contorcia sob o meu toque.

Envolvido pelo som e pelos ofegos que ela emitia, sua palma quente apoiando-se nos meus ombros com medo de cair, por um momento me pareceu que só existiam apenas nós dois no mundo, o que era algo completamente absurdo, mesmo assim, não parei, apreciando a proximidade.

Eu não deveria estar tocando aquela mulher assim, ainda mais que ela encarava tudo como uma brincadeira inocente enquanto eu me sentia queimar lentamente.
Quando foi a última vez que me senti tão viva? Ignorei a pergunta e continuei fazendo-a se dobrar, com lágrimas de tanto rir escapando pelos seus olhos.

— Crianças! Parem com isso. — A mulher mais velha soltou um suspiro resignado, ralhando com nós duas e eu estaquei, abaixando a mão e juntando-a ao meu corpo.

— Não na minha cozinha. — Tá.— Maiara pareceu se recompor primeiro, mesmo que sua voz estivesse rouca e entrecortada.

— Desculpa, mamãe.Suas palavras fizeram com que eu recuasse um passo, e estranhamente um ressentimento por Almira ter nos interrompendo me invadiu.
Era infantil, mas mesmo assim, foi impossível de conter o  impulso. Mas sabia que eu tinha que agradecê-la por isso, tinha agido de maneira completamente inapropriada para uma mulher que era hoje.

E por mais que ela sempre me recebesse com sorrisos e beijinhos, não éramos exatamente amigos. Ainda.
Esse pensamento foi o suficiente para me lembrar dos meus planos para com ela. Ao mesmo tempo que achava que seria bom para nós duas termos uma amizade para criarmos juntos nosso bebê, sabia que não deveria passar disso.

Minha vida estaria ligada à dela, certamente, mas seria apenas em prol da criança que meu avô tanto queria.
Com isso em mente, aprumei-me, ajeitando a abotoadura que ornava o meu blazer e fitei Maiara, a futura mãe do meu filho. 
— Já que a falta é minha — comentei, retomando o assunto sobre a distância que nos separava pelas nossas carreiras, quando um silêncio desconfortável tomou o ambiente —, que tal um café pelos velhos tempos? Quero saber o que anda aprontando.

  E também partir logo para o ataque, pensei comigo mesma...


🧏🏻‍♀️ Até 2050!

Um Bebê Por Encomenda - Adaptado.Onde histórias criam vida. Descubra agora