CAPÍTULO VINTE E DOIS

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O amor é um sentimento interessante por assim dizer, no início eu sempre tive aquela
sensação de ventania na boca do estômago, o som da sua voz ou o sorriso em seu rosto
tornava o meu dia muito mais feliz que qualquer outro. Nós não estávamos juntos, e não
estamos juntos no momento, porque bem aqui e agora, bom.. eu estou morta
Nesse exato momento o coração dele bate desesperadamente sob o peito, bombeando sangue
para todo o corpo moreno e brilhante, seu suor provavelmente escorrendo pela têmpora enquanto
chora ao ver meu corpo pálido e esmaecido deitado sobre a maca, atrás da cortina entreaberta que
dava a visão perfeita e dolorosa dos médicos cortando meu vestido e empurrando as mãos contra
o meu peito que estava coberto com barro, tal como o resto de meu corpo
Mas não teria como eu estar vendo isso, não se ainda estivesse em meu corpo, o que me trás a
dolorosa sensação de que o meu coração se cansou e me libertou de minha vida na terra, me
tornando outra vez aquela estrela que um dia eu fui
Amar alguém trás aquela dor no peito agora das pessoas de pé no saguão do hospital, eu soube
o que é amar e o que é ser amada.
É interessante como no início as coisas são mais fáceis, quando você está perdidamente
apaixonada por um cara que nunca teve a chance de beijar, mas de repente tudo começa a
complicar, o sentimento ruim começa a se misturar e você tem a sensação de que aquilo nunca
vai acontecer. Talvez eu possa dizer que é engraçado, como alguém que nunca havia colado os
lábios nos meus conseguiu fazer com que eu tivesse medo de perdê-lo
Ele nem ao menos era meu, mas uma coisa que ele ainda não sabia, era que eu sempre seria
dele. Ele tinha a própria vida, morava pouco distante, tinha outras garotas.. eu tinha os meus
amigos, e pensei por muito tempo que ter amado ele na verdade havia sido uma decisão pouco
alucinada
Josh foi perfeito, antes de eu tê-lo comigo e principalmente depois, a maneira como ele vive
como se não tivesse nenhum passado antes de mim. Ele se entregou ao nosso relacionamento
como se eu tivesse sido a primeira, por mais que eu saiba que não fui, ele chegou a me contar em
nosso jantar, mas então acabou
O seu passado acabou, por que o que começou a importar era o nosso presente e tudo aquilo
que ele desejava ter em um futuro próximo ou distante
Eu aprendi o que é amar com muitas outras pessoas, aprendi que nunca precisaria ter o sangue
de alguém em minhas veias para considerá-lo família
Aprendi a ter relacionamentos prévios e que estes, mesmo que não tenham durado, fizeram
parte da minha vida e poderiam ser lembrados de uma maneira nem um pouco trágica, achei que talvez eu pudesse ser deixada.. como minha mãe foi, abandonada sem mais nem menos
Mas eu tive homens em minha vida, e agradeço muito por isso, afinal de contas alguma parte
da minha vida tinha de dar certo!
E mesmo que não tenha durado muito, cada parte dela foi incrível, eu estava bem e teria de
lidar com isso de alguma forma. Para onde eu irei? Não faço a menor ideia, mas tenho a
impressão de que algo bom está a minha espera
Ainda estava de pé naquele cômodo estreito, bem no canto pouco escuro, os médicos rondando
a minha maca. Haviam aparelhos presos em meu peito, ouvi um clic e o que parecia ser o
cirurgião surgiu no meu campo de visão com um cardioversor, aproximou-se e assim que os
outros se afastaram ele o apoiou sobre o meu corpo que saltou
Eu não estou assustada, esta cena não parece real, mas está sendo sim
Então uma segunda vez, uma terceira, por fim ele encarou o relógio, voltou-se a mulher e
abaixou seu olhar
-Horário do óbito.. onze e quarenta da noite
Todos se entreolharam, tirando as luvas sujas do sangue de minha perna, o cirurgião se retirou
atravessando a cortina. Minha cabeça se abaixou, então havia mesmo acabado, eu teria de ir
A enfermeira cobriu meus seios com o pano azul, ela cobriria todo o meu corpo, mas alguém
atravessou a cortina e o agarrou. Estava aos prantos, as mãos pressionando os meus braços, seu
rosto apoiado em meu peito e o grito desesperado soando pelos quatro cantos daquele lugar
gélido, frio demais, minhas mãos estavam tremendo e era por conta deste frio
No alto da sua cabeça tinha um curativo, ela tinha sido atendida, no corpo um vestido verde
com detalhes brancos do hospital. Riley estava com os pés descalços, os lábios trêmulos
escorrendo pouco da saliva que não conseguia se manter na boca graças ao seu choro alto. A
mulher tocou em seu ombro, mas ela o puxou de volta, e então todos se afastaram permitindo
que sua dor se esvaísse
Ao longe uma lágrima me escorreu, e o meu coração se apertou em dor, vê-la dessa maneira é
muito maior que qualquer morte. Riley passou a mão por meu cabelo, beijando meu rosto, o
segurou e se afastou o encarando
-Eu sei que estou molhando o seu rosto com as lágrimas, mas não vou me afastar, eu não posso
me afastar! -Riley outra vez segurou meu braço, apoiou seu rosto no meu, o colando um no outro
-Nós não sabíamos onde íamos parar Maya, eu iria embora, nós nos separaríamos, mas não era
para sempre! Não pode ser para sempre!
Não poderia, somos amigas, deveríamos estar juntas até o momento em que tivéssemos cabelos
brancos e rugas impossíveis de serem escondidas
-Eu amo você, eu sou sua patinha! Por favor! Eu jamais vou reclamar que me chame de patinha,
eu quero que fale o quanto você ama o meu mundo, por que ele nunca mais vai existir se você
não estiver nele! Maya você é o meu mundo, é você que me mantém viva, se você não viver eu
vou não vou viver, vou desaparecer como uma flor presa no escuro, por que você é o sol que me
mantém viva.. por favor..
Eu amo você lindinha, amo mais do que amei a minha própria vida
-Não importasse o que acontecesse eu sempre estaria lá com aquela maldita torta de limão, por
favor, me deixe salvá-la outra vez
Você não pode Riley, precisa me deixar ir
-Você não vai morrer..
Eu já morri
-VOLTA PARA MIM!
Ela gritou agressivamente, ainda com o rosto colado ao meu, eu fiquei em silêncio. Todos
estavam em silêncio, notei quando a médica andou um passo para frente, a encarei franzir o
cenho e observar com os olhos semicerrados a tela do monitor cardíaco, os outros dois homens
do lado oposto da maca, ao lado da tela, me acompanharam procurando o que ela estava
encarando
-Estão vendo?
Nossos olhos estavam naquela linha tênue, parada, como a maré calma
-O que está vendo?
-Há uma oscilação, bem ali
Apontou com o indicador
-Não estou vendo nada, Amanda
-Tem sim, afastem-na agora
Os dois se entreolharam, se aproximaram de Riley e a puxaram para longe do meu corpo. Ela
relutou, mas não poderia enfrentá-los, a mulher se aproximou com o cardioversor. Um terceiro
homem a ajudou, outra vez meu peito pulou, mais uma vez, depois mais outra
-O que está fazendo?!
Perguntou o cirurgião, ao voltar
-Há uma oscilação nos batimentos
Outra vez
-Ela se foi.. não pode deixá-los aceitar isso?
Outra vez
-Amanda!
O bip
Haviam sete corações dentro daquela sala, todos batendo, no entanto um estava fraco demais..
E era o meu, aquele cirurgião encarou a tela incrédulo
-Tirem-na daqui, preciso de duas bolsas de sangue, coloquem a máscara de oxigênio..
Eu não escutei mais nada, por que todos desapareceram assim que aquela máscara foi posta em
meu rosto, um breu tomou conta de mim uma terceira vez e antes de estar inconsciente eu pensei
em onde eu poderia parar quando acordasse, e caso acordasse
Há uma fase de nossas vidas onde tudo parece possível, mas de repente uma tempestade brutal
e silenciosa surge como um fantasma, tomando cada sonho que pudesse tornar-se real. O que eu faria da minha vida?
Me fiz esta mesma pergunta por muito tempo, o que eu aproveitaria?
Não posso dizer que usei meus dezoito anos de vida para nada, eu vivi em um gráfico de altos e
baixos, e gosto de acreditar que todas as vezes em que ele caiu foi para que eu aprendesse a subir
naquela nova etapa da minha vida e talvez nesse momento, bem aqui embaixo, é onde eu irei
aprender algo de novo que irá tornar a minha vida melhor do que estava
E é quase impossível, ao meu ver, a minha vida melhorar
Estava vivendo o meu melhor momento, eu vivi o meu melhor momento, ao lado do homem
que amo e perto dos amigos que sempre me apoiaram. Com minha mãe finalmente feliz, casada
com alguém que a enxerga como uma pedra preciosa e não mais uma bijuteria qualquer, e fui
reconhecida pelo o que eu mais amo no mundo que é a minha arte
-Olá..
Ouvi uma voz baixa, suave, não consegui entender o que estava acontecendo nos primeiros
segundos, mas assim que meus olhos se abriram por completo e a claridade ofuscante doeu
minhas pupilas, dois os braços finos se rodearam em meu pescoço
Eu estava viva, eu estou viva
-Nunca mais me assuste dessa maneira, nunca!
-Está tudo bem Riley, eu estou bem
Ela se afastou limpando as lágrimas e segurando as mãos na frente do corpo. Estamos somente
nós duas no quarto, estava frio e meus braços estavam arrepiados, ao notar ela puxou a coberta e
esticou até meu estômago
-O que aconteceu?
-Você desmaiou na floresta, a ambulância nos trouxe mas quando chegou aqui você.. você não
resistiu, seu coração parou por três minutos -A encarei nos olhos, ela estava chorando outra vez -
Achamos que tínhamos perdido você para sempre
-Vão precisar de muito mais que isso para se livrarem de mim
Abri um sorriso e estiquei minha mão direita, para segurar a sua
-Onde estão os meus pais?
-Ainda não sabem que saiu da cirurgia, eu vi quando trouxeram você para o quarto e estou aqui
escondida tem uma hora
Antes que eu pudesse falar qualquer coisa a mais, alguém entrou fazendo barulho e chamando a
nossa atenção, meus pais quase correram na minha direção. Seus braços me esmagando e os
lábios beijando todo o meu rosto, cabelo, como se eu ainda não estivesse suja de barro
As enfermeiras tinham me limpado, mas não o suficiente
Depois de finalmente aceitarem que eu estava viva, eles abriram espaço para Cory e Topanga
que fizeram o mesmo. Logo meus amigos, e então meu namorado, que não hesitou em me beijar
profundamente na frente de cada um, ouvimos alguém pigarrear e nos afastamos
-Temos de cumprir aquele trato, de vivermos para sempre a longo prazo, esqueceu?
Abri um sorriso e o beijei outra vez, porém brevemente, o médico entrou em sala e eu
reconheci o seu rosto. Eu não falaria nada sobre minha experiência sobrenatural, mas poderia
conversar comigo mesma sobre isso, ele estava com uma prancheta na mão e o semblante suave
-Olá
Assentiu sorrindo para todos educadamente e se aproximando de mim, pôs uma lanterna na
frente de meus olhos, segui aquela luz brilhante e o observei levantar o cobertor. Seus olhos
estavam sobre o curativo que cobria os pontos em minha perna
-Está sentindo doer?
-Não muito
-Ainda está um pouco anestesiada, vai demorar para passar por completo, a dor talvez seja um
pouco mais que apenas a dor de uns pontos. Visto que a faca atingiu seu osso, não o fraturou,
mas foi possível ver a marca da lâmina
-Ela vai ficar bem?
Perguntou Riley
-A sua amiga teve ferimentos leves, apesar da grande perda de sangue, não há nada com o que se
preocupar. Logo poderá ir para casa, precisamos fazer alguns exames antes da liberação, você é
muito forte senhorita Hart
-Obrigada
-Tenha uma boa recuperação, com licença - O mesmo se retirou da sala, nos deixando sozinhos.

CONTINUA 😚🤍

A longo prazo. o fim do acordo Onde histórias criam vida. Descubra agora