Capítulo 6: A Arte de se Lascar a cada passo

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     Poucos momentos na minha vida foram tão confusos quanto os últimos minutos. Talvez, quando vi uma pintura da minha mãe e eu não soube nomear o que era aquele sentimento... mas pelo menos era apenas um.

     Felicidade porque tinha agora um canal de comunicação com Dir'nur; tristeza porque ele não confia em mim; revolta porque é sempre a mesma coisa; desespero porque Liene sumiu; surto interno que fez com que eu não fosse capaz de ser uma pessoa decente e racional por todo o tempo que fiquei perto daquele homem porque, pelos céus incandescentes do além mundo, o que eu vou fazer se ele me olhar de novo?

     Respirei fundo me concentrando enquanto andava pelo ambiente deserto. Tinha sido uma bênção entrar com poucos guardas, mas agora tudo o que eu queria é que eu tivesse sido barrado na entrada. Liene foi levada por alguém que conhece, o Imperador talvez. Mas, se esse fosse o caso, por que as damas de companhia haviam lutado depois? Um grupo de pessoas foi até lá e algo aconteceu com Liene para depois as moças lutarem. Duas delas chegaram a andar e tentar alcançar a porta, segundo os rastros, então tentaram seguir por onde a Imperatriz saiu, foram colocadas nas paredes, duas desacordadas e três mortas, as mortas foram as que mais lutaram.

     Se esse fosse o caso, tentar descobrir algo com as desacordadas poderia não resultar em nada, elas provavelmente não tinham qualquer informação boa, ou talvez tivessem a informação que os sequestradores queriam passar. A morte das outras pode querer dizer duas coisas: ou estavam tentando passar alguma mensagem de que o grupo era temível, ou elas realmente descobriram algo que as colocava em posição de perigo em potencial. Se fosse o primeiro caso, a medida foi tomada por um grupo temível que usou a vida das desacordadas apenas como mensagem. Caso seja o segundo, o grupo não tinha intenção prévia de matar ninguém, mas não tiveram escolha.

     — Droga! — Me vi dizendo enquanto abria as portas por onde passava. Seria mais fácil se tivessem mais pessoas envolvidas. Abri uma porta para uma sala de convivência, vazia como as outras, contudo, a janela aberta do outro lado me chamou a atenção. Alguém devia ter passado por lá, o tapete no chão mostrava dois pares de sapatos e um rastro suave, imperceptível, de alguém que passou e tentou apagar as marcas do tapete. Talvez ninguém reparasse direito, mas a leve diferença de tom em duas finas linhas no tapete que iam até a borda, dando a volta nas duas poltronas... Fui até a janela, dava ao jardim interno, teria passado direto se não percebesse um movimento bem no corredor esquerdo, uma massa disforme sendo seguida por outra.

     Quando a luz da lua iluminou o trio e eu reparei na coroa meu coração parou de bater. Então se seguiu um borrão de panos na escuridão, uma quarta figura nocauteou outra, então luta, e de repente palavras estranhas, alguém ali era mago. Eu me virei para correr enquanto ouvia o rugido de fogo atrás de mim. Não perdi tempo, corri desembestado pelo corredor, desci o lance de escadas sem quase tocar nos degraus, me choquei contra uma das paredes com tanta força que um rato caiu de qualquer reentrância que estivesse escondido lá no alto. Quando cheguei ao jardim me deparei com um homem sangrando desacordado, a Imperatriz escorada à parede do corredor e uma mulher sentada sobre um homem que gritava:

     — Como!? Isso é impossível! — Assisti enquanto reconhecia os cabelos negros que mais pareciam sugar a luz da mulher que se abaixava para sussurrar algo ao ouvido do homem, ele parecia ter dificuldade de respirar e estava audivelmente sendo sufocado por alguém da família Otah. Antes que eu desse um passo, ela voltou à posição com um sorriso divertido no rosto e descia um soco no rosto do outro.

     O que eu não esperava era a potência, quando o soco, aparentemente normal, entrou em contato com o rosto do homem, senti o chão tremer levemente junto com o som de ossos quebrando. Boquiaberto me aproximei enquanto ela levantava, se dirigindo a Liene, por um segundo temi que ela fosse a culpada pelo sequestro, mas era apenas uma. Ela tocou Liene com cuidado se certificando de que estava viva e ouvir o suspiro de alívio fez um sair de mim. Ela virou, puxando uma adaga de dentro da saia do vestido e atirou em mim com um movimento felino, rápido e letal. Eu quase não consegui desviar a tempo e reparei que era exatamente porque ela quis, ela poderia ter acertado mesmo com meu reflexo.

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