— Creio que ela não deve estar longe. Ela nunca teve muito acesso ao mundo, então devemos ter notícias dela em breve. — Millie havia dito, ficando ao lado de Alohim. Ambas estavam procurando por Celine em todo lugar de Ahuza, inclusive adentrando em casas de seres inferiores e entrando em contato com pessoas que ela não gostaria de socializar. Alohim procurou por todo Ahuza, mas suspeitava que talvez ela estivesse na terra... Mas como? Celene nem mesmo tocava numa grama das áreas rurais da terra, como teria acesso? Era inacreditável. Alohim já estava perdendo sua paciência, andando de um lado para o outro com os braços cruzados e com uma expressão raivosa enquanto não dizia nada. Millie, por outro lado, aparentava estar como sempre tranquila, mas temia que o Ahuza se tornasse um lugar desgovernado, visto que Alohim estava mais preocupada com a filha do que com a ordem de tudo. É claro que Celene é importante, no futuro será ainda mais, mas Alohim controlava tudo o que acontecia no Ahuza e comandava as divindades que tinham seus devidos afazeres, e sem suas ordens, tudo poderia sair do controle.
— Mas isso não faz sentido, Millie! Onde a minha filha se encontra? Será que está em perigo? Eu... — Alohim finalmente parou de andar, agora estando parada de modo cabisbaixo e suspirando cansada com toda a situação. — Eu sou uma péssima mãe, Millie. Eu não dei atenção para ela. Estava sempre ocupada...
— Divina, sinceramente, a senhorita é a melhor mãe de todo o Ahuza. As outras divindades nunca foram um bom exemplo de mãe, não do jeito que a senhora é.
O que Millie queria dizer era que ser mãe no Ahuza era algo totalmente de ser mãe no mundo mortal. Embora elas tivessem sim um certo sentimento pelos filhos, não se dedicavam tanto na criação dos filhos como Alohim se esforçou. Na verdade, Alohim tinha medo que, por sua filha ter linhagem humana, ela não fosse uma mãe do tipo "humana". As mães do Ahuza não eram superprotetores, não se importavam em levar seus filhos para a terra, não ligam que eles se relacionem romanticamente e sexualmente com outras pessoas, mas Alohim se importava até demais. Se Alohim estivesse certa mesmo, talvez sua filha não seja mortal. Talvez ela nem mesmo tenha poderes fortes o suficiente para combater certos indivíduos ou governar um reino, e por isso, chegou a ter uma conversa séria com seu marido Diógenes para discutir sobre a possibilidade de um segundo filho. Entretanto, Celene é fruto do amor da Divina e do seu ex amor humano, então ela própria sabia que talvez não tivesse tanto amor pelo segundo filho como tem por Celene. Alohim tinha medo de muitas coisas relacionadas ao futuro de sua família.
— Millie, você não entende! Se eu perder a Celene, eu não serei eu mesma. O mundo... O mundo irá desabar. O Ahuza se tornará pó, o chão irá tremer, as nuvens vão virar cinzas... — Alohim caiu de joelhos no chão e colocou sua mão no seu peitoral na mesma direção que ficava o seu coração, sentindo uma dor sentimental que com certeza estava relacionada a sensação da suposta morte de uma filha. Millie se apressou para consolar Alohim, se agachando e colocando a mão em seu ombro. Millie era frígida, não sabia expressar muito bem seus sentimentos, então apenas observou aquela cena meio aflita com tudo isso, até ter finalmente iniciativa. Respirou fundo antes de se levantar, indo até uma pequenina florine novata que estava observando cada parte da sala do trono maravilhada, ignorando a presença de Alohim e Millie devastadas.
— Pequenina. — Millie se agachou para ficar do tamanho da pequena florine. — Convoque todos os Poderosos para vir até a sala de reuniões.A florine novata se estremeceu sentindo que a ordem era importantíssima, só que ela tentou disfarçar seu nervosismo apenas assentindo e saindo correndo dali. Alohim continuava de joelhos, trêmula e com a respiração falha, fazendo de tudo para que não perca o controle e desabe em lágrimas.
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Os deuses eram seres tão ocupados quanto Alohim, mas não podiam perder uma reunião de modo algum. Todos estavam presentes, menos Provência, que era a mais próxima de Alohim.
— De novo esse lugar? Achei que não teríamos reuniões até a festividade lunar. — Disse um dos deuses, Fél, o deus mais novo do bando e consequentemente o mais imaturo. Fél odiava a sala de reuniões por se tratar de um lugar pequeno e praticamente vazio com uma simples mesa de jantar de madeira grande. Para tornar mais aconchegante, Alohim fazia questão de mandar as florines prepararem petiscos para que não fosse tão desconfortável para os deuses.
— Calado, Fél. Depois do grito da nossa Divina, fiquei amedrontada achando que não entraria mais em contato conosco por tamanho choque. Mesmo que ninguém ache isso certo, Alohim sempre se preocupou até demais com Celene. Eu deduzi que Celene fugiu por causa da superproteção da mãe, que sufocava ela. — Ditou Bromélia, a deusa mais metida, com os braços cruzados e nariz empinado, olhando para os petiscos com uma certa repugnância. Fél não queria causar intriga, então apenas bufou e levou um petisco até sua boca para degustar. Os outros deuses discutiam entre si, e Alohim, em meio aos sussurros da conversação dos deuses, não expressava nenhuma emoção sentada numa cadeira simples como todos os outros deuses. Estava paralisada olhando para a parede, pensativa e em uma crise interna. Millie revirou os olhos, vendo os deuses se agitando e percebendo que viria algo ruim.
— Sejamos sinceros, você não devia ter prendido a garota. Acho que Celene deve estar curtindo a própria companhia depois de perceber que viveu presa durante tantos anos. — Uno, o deus mais feio, reclamou, com um tom de voz meigo. Os outros deuses continuavam a cochichar entre si. Os cochichos estavam tão irritantes que Diógenes, o deus mais impaciente e marido de Alohim, se levantou de sua cadeira e deu um soco na mesa (não tão forte para não quebrar, mas forte o suficiente para fazer um barulho chamativo):
— Chega! — Até suas linhas de expressão no seu rosto gritavam "RAIVA"! Ele pressionou seus lábios depois de pensar em dizer algo, entretanto, não poderia dizer na frente de Alohim para não deixar ela mais triste do que já estava, então apenas disse:
— Poderosos, devem compreender que palpites supostamente errôneos sobre a futura herdeira de Ahuza não devem ser feitas na frente da criatura mais poderosa que comanda isso tudo. O desaparecimento de Celene é algo importantíssimo, não só para Alohim e para mim, como para todo o universo, pois ela é a futura engrenagem que vai ordenar tudo.

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Desejada
FantasyNo mundo celestial, uma deusa (criadora de tudo e de todos), acaba tendo uma filha que não foi planejada, mas que por puro instinto maternal, decide não se livrar dela. Acontece que, no cenário que tem um mundo cheio de divindades e um mundo de huma...