11. Dia das Mães

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Em Eldora, uma cidadezinha enclausurada por segredos e sombras de um passado esquecido, erguia-se, atrás de uma casa de tijolos centenária, uma árvore colossal cujos ramos desafiavam o céu cinzento com sua majestade imponente. Essa árvore não era apenas um marco natural; era uma guardiã silenciosa das estações que se sucediam e, mais recentemente, a única testemunha dos diálogos carregados de emoção entre Alice, uma menina de nove anos cujainocência ainda não havia sido tocada pela amargura do mundo, e sua mãe, Clara, cuja alma estava fragmentada pelas tempestades incessantes do Transtorno Dissociativo de Identidade.

As tardes de Alice eram passadas sob o manto protetor da árvore, onde ela confidenciava seus segredos e sonhos ao tronco antigo, encontrando nele um ouvinte eterno.

- Você me entende, não é? - ela sussurrava, com a cabeça encostada na casca áspera, enquanto os ramos se agitavam suavemente, num gesto quase humano de consentimento.


Numa tarde de outono, onde o frio se insinuava como prelúdio do inverno, Clara observava de longe, através da janela embaçada pela cozinha. A relação dela com o carvalho era complexa, um emaranhado de sentimentos contraditórios. Liz, uma de suas personalidades, via na árvore um pilar de força inabalável, enquanto Marion, outra faceta de sua psique atormentada, via nela um monstro que ameaçava engolir sua preciosa filha, isolando-a ainda mais das realidades tangíveis do mundo.

- Não podemos permitir que essa árvore usurpe nossa menina - Marion resmungava, enquanto as mãos trêmulas preparavam um chá, tentando encontrar calor em meio à frieza de seus próprios pensamentos.

Movida por um impulso maternal que superava as barreiras de suas personalidades fragmentadas, Clara decidiu enfrentar esse medo. Ela se aproximou de Alice sob a árvore, uma tentativa de ser a âncora que sua filha tanto precisava.

- Posso me juntar a você, querida? - sua voz tremia, um reflexo da batalha interna que travava. Alice sorriu, um raio de sol em meio às nuvens.

- Claro, mamãe! Eu estava contando à árvore sobre meu dia na escola.

O diálogo que se seguiu foi um balé delicado de palavras e silêncios. Clara, olhando para a árvore com olhos novos, começou a perceber o refúgio que sua filha encontrara naquela entidade natural. O coração de Clara se apertou, uma mistura de dor e revelação. Marion insistia que aquilo era uma loucura, mas Liz, com sua visão poética, via a beleza na conexão singular de Alice com a natureza.Nos dias que se seguiram, Clara observou mais atentamente, vendo a serenidade que a árvore trazia para sua filha. Por um momento, influenciada por Marion, ela quase tomou a decisão drástica de cortar a árvore, mas Liz interveio, salvando o símbolo da infância intacta de Alice. A busca de Clara por ajuda profissional e terapia abriu portas para compreensões profundas sobre si mesma e suas várias identidades. Lentamente, ela começou a enxergar o valor inestimávelda árvore na vida de Alice.


Quando a primavera chegou, marcando um novo começo, Clara fez algo inesperado: convidou Alice para um piquenique sob a árvore.


- Mamãe, isso é um pouco inesperado - Alice comentou, surpresa e alegria misturadas em sua voz, enquanto estendiam uma toalha xadrez no chão.

Clara, agora vendo a árvore não como uma ameaça, mas como um santuário, compartilhou.

- Eu sei, querida. Mas eu comecei a ver o que você vê nesta árvore.

Naquele momento, sob a copa da árvore, Clara e Alice encontraram uma paz que parecia há muito perdida. A árvore, mais do que uma testemunha, tornou se um símbolo de cura e renovação em suas vidas. Clara finalmente compreendeu que cada raiz que se enterrava fundo na terra, cada folha que dançava ao vento, representava a estabilidade e a força que ela desejava oferecer a Alice.

- Você acha que a árvore pode nos ouvir? - Clara perguntou, sua voz tingida com uma nova esperança.

- Acho que sim. Ela nos sente - Alice respondeu com uma sabedoria além de seus anos. - Ela sabe que estamos melhores juntas.


Olhando para a árvore, Clara viu não apenas um refúgio, mas um farol de resiliência, um lembrete de que, apesar das tempestades internas e externas, elas poderiam crescer fortes, enraizadas no amor incondicional que compartilhavam.


Park_Jhessuk

Park_Jhessuk


Surto Literário: Devaneios da LCOnde histórias criam vida. Descubra agora