Arranjos

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Meus olhos se mantiveram congelados no relógio por quase cinco minutos inteiros. Permiti a mim mesma piscar por uma única vez por um segundo, contudo, assim que notei o perigo que aquilo representava nas minhas condições, voltei a abri-los.

Ter um professor chamando minha atenção por dormir em sala seria uma péssima forma de dar início ao período de aulas. Não que fizesse alguma diferença, na verdade, mas não gostava da ideia de vê-lo interromper a aula por um problema tão insignificante.

Estava sentada pelo menos dois metros à direita da janela mais próxima, mas a visão do céu azul lá fora era praticamente a mesma, com ou sem as cabeças de meus colegas de sala no meio de meu campo de visão. Era um dia bonito. Apesar de não poder ver muito além do céu e das nuvens branquinhas, tinha certeza de que o Sol fazia as folhas das árvores ganharem o brilho dourado bonito característico de dias ensolarados assim.

Umemiya.

Franzi o cenho de imediato. Não fazia sentido que minha mente estivesse relacionando o cenário a alguém que vi uma única vez na vida. Eu não era assim. Nunca havia sido assim.

E já fazia duas semanas. Ou três. Não, duas. Três semanas inteiras na quinta-feira, mas ainda era quarta, então duas.

Meus olhos voltaram a passear pelo céu lá fora, curiosa a respeito de qual parte dele havia escavado essas memórias. O azul talvez lembrasse a cor dos olhos? Não, os dele definitivamente eram mais claros. Eu acho. Talvez não me lembrasse tão bem assim.

As nuvens podiam lembrar da cor dos cabelos, cogitei por um momento, mas o tom de branco também não parecia tão similar assim.

Devia ser a tarde ensolarada como um todo, então. Sim, era o que mais se aproximava dele. Uma tarde de Sol escaldante e céu azul sem nuvens de chuva.

Era uma descrição bastante precisa.

Voltei os olhos para a frente mais uma vez, minha atenção voltando a escalar até o relógio quadrado na parede. Nem três minutos tinham se passado. Suspirei, afundando meu rosto contra a mesa de madeira.

Pessoas não deviam ser tão gentis daquele jeito.

Qualquer um que passasse mais de um dia no mundo saberia o tipo de perigo que há em ser tão bom assim.

Quero dizer, ele estava na área de uma gangue inimiga e tinha ido até lá para comprar sementes? E vasinhos? E um par de luvas?

Quem no mundo faria uma coisa dessas?

O som da maçaneta fez meus olhos vagarem pela sala de aula até encontrar a porta. A porta se abriu, revelando uma versão avermelhada e furiosa do sr. Ono, um dos coordenadores da escola.

— Você! — exclamou, o dedo indicador voltado para a minha direção, a mão trêmula.

Olhei nos arredores, e, pelo olhar de curiosidade, confusão e, de certa forma, empatia de meus colegas, concluí que ele realmente estava falando comigo.

— Querem falar com você — disse. — Lá embaixo. Agora. Tentei convencê-lo a ir embora algumas vezes, mas ele insiste em ficar lá até conseguir falar com você!

Concordei com a cabeça, levantando. Os olhares sobre mim me fizeram engolir em seco enquanto andava até a porta, uma das mãos do sr. Ono pousou em minhas costas assim que cruzei com ele, enquanto a outra fechava a porta.

Alguém estar me procurando na escola só podia significar uma coisa. Se fosse meu pai me procurando, o coordenador teria permitido que entrasse, então não podia ser ele. Talvez alguém enviando uma mensagem dele, mas com tanta insistência a mensagem devia ser importante, urgente.

mirrors - umemiya hajimeOnde histórias criam vida. Descubra agora