CAPÍTULO-23

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Malee se remexe na cama, estranhando o aroma de café que invadia suas narinas. Ela sabia que sua tia detestava café; então, com dificuldade, abre os seus olhos.

De fato, aquele não parecia nada com o seu quarto. Ainda sonolenta, a mesma põe-se a sentar. Após esfregar um pouco os olhos com as costas das mãos, a garota procura algo que fosse familiar naquele estranho quarto. Então ao bater o olhar numa poltrona que ficava no canto do quarto, a de franja encontra, não algo, mas alguém familiar.

- Wann?! - indaga confusa, fazendo a mulher desviar o olhar do livro que folheava.

- Ah! Você acordou - comenta ficando de pé - Como se sente? - pergunta cruzando os braços.

- Onde eu estou?

- Na minha casa - responde deixando a menor boquiaberta.

- Sua... Sua casa?!

- Hum-rum.

- E como eu cheguei aqui?

- Eu trouxe você.

- Me trouxe? Mas... Aí! - exclama tocando a própria testa.

- Vou pegar um pouco de café para você. Vai ajudar com isso - diz caminhando até a porta.

- Wann! - exclama fazendo a mesma parar - O que mais aconteceu ontem?

- Nada de mais - responde dando de ombros.

A mulher deixa o quarto, enquanto Malee permanece confusa no mesmo. A garota tentava se lembrar de algo que ocorrera na noite passada, mas nenhuma lembrança sólida passava por sua mente. Desistindo de forçar a cabeça que latejava de forma insistente, ela se desfaz das cobertas notando algo que a deixara ainda mais nervosa com a situação.

Que roupas eram aquelas?!

A garota levanta em um salto, imaginando uma porção de cenários que poderiam ter acontecido para que ela tivesse trocado de roupa. Então; sem pensar mais vezes, ela deixa o quarto a procura de Wann. Por não conhecer o ambiente, ela se sente pedida por alguns instantes; mas brevemente segue o barulho de talher vindo do começo do corredor.

- Wann! - exclama assustando a mulher que colocava café em uma xícara.

- O que foi?!

- O que aconteceu ontem?

- Eu já disse: nada demais! Fui buscar você na rave que estava, trouxe pra cá, e você adormeceu no meu quarto. Só isso.

- Jura? E em qual momento eu vesti isto?! - indaga apontando para o pijama que vestia.

- Ah! - exclama segurando o leve sorriso que ameaça surgir - Aliás, sobre isto, tenho uma pergunta - comenta tomando um gole do café - Você sempre está sem nada por debaixo da roupa? - pergunta fazendo a garota arregalar os olhos.

- Vo... Você disse... Você disse que não aconteceu nada.

- E não aconteceu - fala pondo a xícara sobre a bancada - Mas não disse que você não insinuou nada.

- Ah, não! - murmura pressionando fortemente os olhos - Não era alucinação, não é?

- Não - retruca afastando uma segunda xícara - Toma um pouco. Vai se sentir melhor.

- Obrigada - fala tocando o objeto - Espera... - murmura deixando a mulher á sua frente confusa - Obrigada, nada! - diz se afastando - Onde estão minhas coisas?! Eu quero ir embora!

- O quê?

- Minhas coisas, Wann!

- Mas... Mas você nem tomou o seu café.

- Ontem eu devia estar extremamente bêbada por ter sequer olhado na sua cara, mas agora estou perfeitamente sóbria e não quero nada que venha de você!

- Malee - fala saindo detrás da bancada - Olha, nós podemos...

- Wann! - interrompe fazendo a mulher parar - Eu não sei o que você pensou ontem a noite ou o que aconteceu, principalmente o que eu disse. Mas de nada importa, não era eu! Então, por favor. Me dá minhas coisas, e me deixa ir embora.

A de óculos pausa, assentindo levemente em seguida. Puxando o ar, ela adentra o corredor. A mesma pega os objetos da mais nova que estavam em seu quarto e, hesitante, volta até a sala.

- Aqui - diz estendendo os objetos.

- Obrigada - fala pegando-os, e iniciando uma rápida caminhada até a porta.

- Malee! - exclama fazendo a garota parar - Eu sinto muito! - diz e a de franja direciona o olhar a mesma - Eu sei o que eu disse aquele dia. Me lembro de cada palavra, todos os dias. E eu sinto muito! Eu não julgo você por não querer ver minha cara. Não a julgo por não querer nada que venha de mim. Não a julgo por me odiar. Mas eu...

- Eu não odeio você - interrompe deixando a mais velha levemente boquiaberta.

- Não odeia?

- Não. Não odeio, Wann - fala dando alguns passos para frente - Eu só não posso mais amar você.

A garota nota o olhar estático da tutora se encher de lágrimas então, sentindo seu coração estremecer, ela dá as costas seguindo o seu caminho.

Wann permanece paralisada por mais alguns instantes, antes de fungar um pouco, levantar a cabeça, segurar as lágrimas e atravessar a porta atrás de N'Malee.

A mulher segue o corredor até a ala de elevadores, bufando ao não avistar a garota. Rapidamente, ela adentra um dos elevadores que coincidentemente se abre quando a mesma se aproxima. De forma frenética, Wann aperta o botão do elevador que a levaria ao térreo. O elevador para em outros dois andares, fazendo a mulher revirar os olhos e começar a bater um dos pés de forma ansiosa.

Ao chegar no térreo Wann deixa apressadamente o elevador,  esbarrando em duas pessoas que saiam calmamente do mesmo. Ela procura por Malee ao redor, não obtendo êxito. A mesma, então, se aproxima do recepcionista de forma ofegante.

- Com licença - fala fazendo o rapaz encará-la.

- Bom dia! - exclama com um largo sorriso.

- Você viu uma garota passando por aqui? Aparenta ter uns vinte e poucos anos, dessa altura, tem franja...

- Ah! - exclama interrompendo a mesma - Ela acabou de entrar naquele veículo - diz apontando para o lado de fora do prédio.

Wann encara a saída, avistando o veículo que acaba de ter sua porta do passageiro fechada. Então, sem hesitar, a mulher corre até a saída do prédio.

- N'MALEE! - grita se aproximando das grandes portas - MALEE! - exclama ao sair do prédio - Não! - lança ao avistar o carro se afastar - N'Malee... - murmura sentindo seus pulmões arderem pela corrida.

A mais velha permanece encarando o veículo prateado que se afastava, quando avista a possível pior cena da sua vida. Ao iniciar a passagem por um cruzamento, o carro prateado é atingido bruscamente por um caminhão que parecia estar desgovernado.

- Não... NÃO! - grita perdendo o controle das lágrimas que enchiam seus olhos - Não... - murmura não conseguindo mover um músculo.

Wann sentia suas pernas pesarem como grandes pedras. Seu coração batia como nunca havia batido. Ela conseguia sentir suas mãos ficarem gélidas e sua respiração falhar, mas não mais por causa do cansaço.

Ela queria fazer alguma coisa. Ela queria correr até lá. Queria se aproximar como as outras pessoas. Queria que Malee, por algum milagre, saísse do carro bem. Queria que sua garota de pele pálida não tivesse entrado naquele veículo. Porém, mais ainda, ela queria conseguir fazer algo além de chorar como uma criança.

7642 (GL)Onde histórias criam vida. Descubra agora