PRESENTE
Desatei a chorar sentada no vaso sanitário, uma hora antes de estar no serviço.
Para tampar os vestígios da minha tristeza eu precisaria colocar muitas camadas de maquiagem, o que ficaria muito evidente a não-naturalidade da minha cara, já que nunca gostei de usar maquiagem forte, tudo costumava se resumir em: gloss e rímel.
Agora parecia que eu tinha levado duas chineladas, uma em cada bochecha.
Engoli o choro, me arrumei e peguei minhas coisas.
Já no trabalho, fui recebida com olhares penosos de alguns funcionários. Tive que aturar algumas perguntas sobre como eu estava e se eu tinha feito as pazes com aquele cara. Eu não fiz, e nem queria fazer. Ter que olhar para Olívia era difícil, por isso nem cheguei perto do refeitório.
Sem refeitório, sem cozinha. Sem cozinha, sem café. E sem café, uma Angelina xoxa, capenga, manca, anêmica, frágil e inconsistente.
Fiquei na minha sala o tempo todo, só saí para ir ao banheiro, e ainda assim pouquíssimas vezes.
O porteiro bate no vidro de leve chamando minha atenção. O senhor de idade me dá um sorriso e fiquei aliviada do motivo da conversa não ser sobre o ocorrido de sexta.
— … E eu não sei como isso foi acontecer. — As chaves reservas tinham sumido desde sexta- feira, o vigia noturno não as encontrou no armário da portaria.
— Não se preocupe, irei encontrá-la.
— Não precisa se incomodar.
— Não é incomodo algum, na verdade eu precisava mesmo me distrair um pouco. — Dei um sorriso sem graça e eu sei que ele entendeu o por quê.
Saí da sala e comecei a olhar em alguns armários e em alguns cantos, mas não tinha encontrado o molho de chaves. O único lugar que faltava era no depósito.
Empurrei com força o portão, como sempre a segunda porta estava aberta. Comecei a olhar nas prateleiras e nos armários antigos. Me virei para o manequim.
— Onde que tá essa chave, hein?
— Que chave? — Ouvir aquela voz me fez dar um grito. Depois de alguns segundos percebendo que não foi o manequim que falou, me virei em direção ao outro lado da sala, na porta da entrada de uma segunda mini sala dentro do depósito.
— Você quase me matou do coração! —Coloquei ambas as mãos sobre o peito e Ricardo balança a cabeça. — Que diacho de trem você tava caçando lá dentro?
— É a primeira vez que ouço alguém em Nova Lima puxar um sotaque tão forte. — Sou natural de Uberlândia, mesmo tendo me mudado há muitos anos, a fala puxada sempre aparecia involuntariamente.
— Eu te fiz uma pergunta.
— Vim trazer uma cadeira quebrada. Satisfeita? — Não, e não porque eu queria saber mais detalhes da cadeira quebrada. Eu não estava satisfeita comigo mesma, estava estressada e sabia que iria explodir com Ricardo se ficasse mais tempo perto dele.
— Que seja. — Passei por ele.
Eu não tinha noção que o tempo estava nublado até vê-lo de dentro da sala. Me virei para trás e Ricardo me encarava, e eu odiava aquele olhar de pena.
— Perdeu alguma coisa na minha cara? — Suas sobrancelhas se levantaram.
— Como é que é?
BOOM!
Dei um gritinho ao ouvir o estrondo e pela escuridão seguinte. A ventania foi forte o suficiente para bater a primeira porta do depósito e tudo ficou escuro.
Tateei a parede até achar a porta, tentei abrí-la mas estava trancada. Alguns ruídos vieram do lado onde Ricardo estava, e então uma luz fraca se acendeu. Ele tinha encontrado o interruptor.
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𝐒𝐞𝐧𝐡𝐨𝐫 𝐞 𝐬𝐞𝐧𝐡𝐨𝐫𝐚 𝐚𝐳𝐚𝐫
RomansaAngelina e Ricardo não se suportam. Para piorar, cada vez se encontram um desastre diferente acontece. Trabalhando juntos no polo da REP-Mg (Rede de Ensino Profissionalizante de Minas Gerais) de Nova Lima, fica complicado manter a distância, uma vez...