Não quero esse bebê

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Contar aos meus pais era o meu maior medo, mas assim que o susto passou ambos me abraçaram e disseram que iam ajudar em tudo.

– Eu quero que vocês me ajudem a escolher pais adotivos para o meu filho – falei, deixando-os completamente confusos – Eu não quero essa criança, não estou pronta.

– Primeiro vamos começar seu pré-natal, vamos ver se tá tudo bem, vamos deixar essa história de adoção para outro momento – mamãe disse – Tudo bem?

– Tudo bem mãe, mas eu já me decidi.

Mamãe deu continuidade a todos os exames e consultas que eu já tinha feito. O tempo inteiro eu descobria coisas novas de como era estar grávida, as pessoas te paparicando o tempo inteiro, a minha barriga que ia crescendo pouco a pouco, o meu bebê ia tomando forma pouco a pouco e o som do seu coração quase me fez amolecer, mas eu estava decidida de que iria dá-lo para adoção. No quarto mês a minha médica tentou ver o sexo do bebê, mas ele estava de pernas cruzadas e ainda não era possível.

– Bom Clara, vamos ter que esperar mais um pouco, ele não quer mostrar as partes íntimas – ela brincou.

– Eu me refiro sempre a "ele" – falei – Acho que vai ser um menino.

– E eu acho que vai ser uma menina – mamãe disse.

Os boatos logo se espalharam, pois minha barriga já estava bem evidente. Os vizinhos do meu apartamento sempre comentavam que estava grávida de uma criança sem pai, isso não me incomodava, afinal, eu sabia quem era o pai, mas era ele quem estava perdendo por não merecer saber da existência do filho. Os pais do Rafael, que eram melhores amigos dos meus pais, vieram me visitar assim que chegaram da Europa. Por muitas vezes eles diziam que eu podia contar com eles para tudo, eles só não sabiam que se tratava do neto ou neta deles. Mamãe ficava apreensiva, pois eu tinha contado a verdade a ela, na realidade só ela e a Larissa sabiam que o pai era o Rafael, para os demais eu dizia ter sido uma aventura de uma noite só onde eu estava bêbada e não lembrava do rapaz. Era vergonhoso, mas era o melhor a ser dito.

– O Bernardo falou com o Rafa ontem – a Larissa comentou enquanto eu olhava alguns papéis de adoção – Ele perguntou se você ainda estava muito chateada com ele, disse que estava arrependido de ter dito aquilo e queria muito falar contigo novamente.

– Não to com cabeça para o Rafael.

– Deveria estar, porque ele é o pai do seu bebê – ela disse e pegou um papel da minha mão – Esquece isso de adoção, amiga!

– Não dá para esquecer. Me ajuda vai – joguei alguns papéis para ela.

– Ok, ok – ela revirou os olhos e pegou um dos papéis – Esse casal está junto há 3 anos e vão comprar a casa própria agora.

– Não, eles só têm uma moto. Como vão passear com o bebê? – resmunguei – Não se pode andar com crianças em uma moto, é perigoso!

– Descartado então! – ela fez careta e pegou outro papel – Esse casal está junto há 4 anos, têm carro e casa própria.

– Eles deram o cachorro para o vizinho porque não aguentaram a bagunça que ele fazia. Vão se livrar do bebê quando ele começar a riscar as paredes? – falei como se eu já imaginasse eles dando o bebê para o vizinho.

– Fora! – ela amassou o papel e jogou no canto do quarto – E quanto a esse casal? Eles já têm um filho.

– Um filho que já quebrou o braço!

– Amiga, criança vive caindo, essas coisas acontecem mesmo – ela falou como se fosse óbvio – Criança vive pulando, correndo, subindo em árvore... é normal.

– Não é normal! Acho que essa família é desestruturada, não gostei! – fiz careta e ela riu.

– Ok. Descartado também! – ela pegou outro papel e apontou para a foto do casal – São casados há 7 anos, têm 2 filhos, carro e casa própria. Ah, e os filhos nunca quebraram nada.

– E moram em Santa Catarina, muito longe daqui! Além do mais, eu não gosto desse bairro.

– Amiga, você nem conhece Santa Catarina!

– E daí? Pesquisei na internet e vi que lá é perigoso, não é lugar para criar uma criança.

– Eu desisto! – ela bufou e se levantou rindo – Você vai perceber quando que não quer dar essa criança?

Levantei da cama e fui até a mesinha, coloquei um copo com água e sentei na cama novamente, ainda rindo da pergunta sem lógica da Larissa.

– Hello! Estou escolhendo os pais aqui! – apontei para os papéis – Como posso não querer dar?

– Você ainda não se deu conta que se o casal não tem defeito, você inventa? Eu não vou discutir porque sei que você é cabeça dura, mas espero que a sua ficha caia antes de você resolver tudo judicialmente.

– Relaxa amiga, eu já to decidida!

– Ok, ok – ela foi irônica e sorriu – Mudando o assunto, Bernardo mostrou uma foto sua grávida para o Rafael.

– Aff! Aposto que ele deve ter falado mal de mim um monte, né?

– Óbvio que não, sua sonsa – ela revirou os olhos – Disse que você tá linda gravidinha.

– Sério? Quer dizer que agora ele não quer mais que eu tire o meu filho?

– Meu Deus, é impossível conversar contigo! Não acha que tá na hora de passar por cima desse orgulho e conversar com o Rafael?

– Você fala isso porque não viu ele encher a boca para falar que um filho iria estragar a vida dele!

– Eu entendo seu lado, amiga, de verdade, mas o Rafael tem que crescer, ele tem que assumir a responsabilidade. Imagina a confusão se ele descobrir isso depois de anos!?

– Ele não vai descobrir, só você e minha mãe sabem e nenhuma vai contar, certo?

– Jamais – ela prometeu.

– Então está tudo certo – coloquei a mesinha e puxei pela mão – Vem, estou com vontade de comer sorvete de castanha.

– Eca! Espero que o bebê tenha um gosto melhor, porque seus desejos são muito estranhos.

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