Conflito

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Os seus pais haviam se conhecido em um aplicativo de relacionamento e, até então, se davam muito bem. Sua mãe era japonesa e seu pai, brasileiro. Você também tinha uma irmã mais velha; eram a "família perfeita." Bom, isso antes de sua mãe descobrir as traições do pai.

Exatamente às duas e meia, você escutou barulhos extremamente altos: gritos e coisas se quebrando. Era mais uma das brigas de seus pais. Desceu a escada em passos apressados, ficando frente a frente com seu pai, que estava visivelmente bêbado. Ele desferiu alguns golpes no rosto de sua mãe. Você já estava cansada disso; sua mãe sofria todos os dias com tais atos, e ninguém podia fazer nada por medo de levar uma surra.

Como forma de se proteger, você correu até o quarto da sua irmã, acordando-a ao empurrá-la levemente.

— Akane, está acontecendo de novo — você disse com a voz trêmula e os olhos marejados.

— Vai passar logo; não precisa se preocupar. Pode dormir aqui comigo hoje — respondeu sua irmã, se afastando um pouco para que você pudesse se deitar.

Pelo que parecia, ela já tinha se acostumado com tudo aquilo. Sempre te consolava, mesmo sendo apenas um ano mais velha. Pelo que dá para entender, ela já havia amadurecido muito. E no final das contas, ela tinha razão: logo ao amanhecer do dia, tudo estava muito calmo. Você desceu as escadas em busca de sua mãe, mas não a encontrava em lugar nenhum. Foi até o quarto dos seus pais; a porta estava aberta e seu pai estava sentado na cama com uma feição irritada, logo levando os olhos até você.

— Papai, onde está a mamãe? — você pergunta ainda com a voz levemente rouca por ter acabado de acordar.

— Ela foi embora — disse ele de forma simplista.

Você não acreditava naquelas palavras; não era possível que isso estivesse acontecendo. Sua mãe jamais deixaria suas filhas sozinhas com esse monstro.

— Você está mentindo! Ela não foi embora! Onde ela está? — você insistia em perguntar.

— Cale a boca! Você não sabe como aquela mulher era um estorvo em minha vida. Fico feliz que ela finalmente tenha ido embora — ele gritou.

Lágrimas formaram em seus olhos e logo rolaram pelo seu rosto, caindo no chão. Não era de se esperar que ele falasse assim com uma criança de apenas nove anos. Mas bem, aquele homem era louco; ele certamente não iria medir palavras ao falar com você.

— Pare de chorar, sua menina insuportável! — o homem disse ríspido.

Você o encarava com um olhar de puro medo e tristeza; seu coração batia rápido e suas mãos suavam. O ar quase não chegava aos seus pulmões e sua cabeça já estava um turbilhão de pensamentos.

Naquele momento, você estava decidida. Havia finalmente tomado coragem para revidar aquelas palavras duras que o homem dizia.

— Por que você faz isso? Por que desconta tudo na mamãe? Ela não era o suficiente para você? Por que não tenta ser mais gentil?

Você resmungou e logo fez uma curta pausa em busca de oxigênio.

Ele praticamente deu um pulo da cama, foi até você e desferiu um tapa forte em seu rosto. Sua irmã, que acabara de acordar, presenciou toda aquela cena. Ela foi até você e, puxando-a pelo pulso, correu até a porta. Vocês duas correram pelas ruas, sem saber para onde ir, até entrarem em um beco e se esconderem lá, com medo de que seu pai fosse atrás de vocês.

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Uma mulher que passava por ali viu as garotinhas sozinhas e indefesas. Ela tinha uma aparência jovem e era muito bonita.

— Oi, vocês precisam de ajuda para voltar para casa? Acredito que vocês tenham se perdido.

A mulher disse, sua voz suave e calma.

— Não, por favor! Papai nos mataria se entrássemos por aquela porta.

Você respondeu, quase cuspindo as palavras.

A bela mulher arregalou os olhos e disse:

— Oh, vocês estão muito assustadas. Vamos conversar com calma está bem?

Nós assentimos com a cabeça.

— Tem alguém que vocês confiem, para que eu possa ligar? A mãe de vocês, ou uma tia.

Nossa tia. A irmã da nossa mãe; ela era uma boa pessoa e nos amava muito. Com certeza poderia nos ajudar agora. O problema era que ela morava no Japão e nós estávamos no Brasil.

— Moça, será que você poderia ligar para minha tia? Acho que ela pode nos ajudar. — Akane disse.

— Mas é claro! Você só precisa me dizer o número dela.

Ainda bem que nossa tia falava fluentemente o português do Brasil; assim foi muito mais fácil para a mulher conversar com ela. Depois de uma longa conversa cheia de explicações, nossa tia finalmente estava vindo pra cá; ela iria apenas nos buscar e assim voltaríamos ao Japão. Esse dia mal tinha começado ainda, mas já sabíamos que iria ser muito cansativo.

Demoraria pelo menos um dia até que ela chegasse para nos buscar, então, nesse meio tempo, ficamos na casa dessa mulher. Seu nome era Lavínia Andrade e ela cuidou muito bem de nós; por um tempinho, até esquecemos do que passamos com nosso pai.

Após a chegada de Haruka, nossa tia, nos despedimos da Lavínia e seguimos viagem. Eu chorava muito contando tudo que nos aconteceu para nossa tia, e ela dizia que agora tudo seria diferente. Ela cuidaria de nós e assim teríamos uma boa infância e uma vida feliz.

Mas mesmo assim, por mais que eu me esforçasse muito, não conseguia me esquecer do que tinha acontecido na casa de papai. Todas as noites eu mal conseguia dormir porque isso sempre martelava na minha cabeça. Nunca mais vimos mamãe. Só uma coisa importava: ela estar bem. A mesma já tinha sofrido muito e com certeza merecia uma vida feliz. Bom, já tinham se passado sete anos desde que tudo isso aconteceu.

Nossa vida estava boa, muito boa por sinal. Nossa tia nos dava tudo do bom e do melhor; ela até nos ensinou a falar japonês. Ela nos tratava como filhas e sempre podíamos contar com ela para tudo. Aliás, com certeza era muito melhor viver só nós três do que continuar morando com aquele lixo de pai.

Haruka recebeu uma nova oportunidade de trabalho; esse pagava muito melhor do que o antigo, mas por ser em outra cidade tivemos de mudar de casa e de escola. Foi bem difícil no começo, mas sabíamos que era por uma boa causa e que nos acostumaríamos depois.

O seu volta às aulas estava chegando e sua ansiedade já estava a mil. Tinha pavor de muita gente no mesmo lugar e se preocupava muito com o que as pessoas iriam pensar de você; até porque achava que mudar de escola no meio do ano era muito ruim. Mas pelo menos não estaria sozinha; é claro que Akane iria com você.

Sua escola nova se chamava "Nekoma" e era bem conhecida pelo time de vôlei que tinha lá. Bem, você nunca se interessou por esportes; preferia ficar no quarto jogando por horas e horas.

Até porque alguns meses atrás um jogador aleatório enviou um pedido de amizade; o nome dele era "kozumedz" e você logo aceitou porque precisava de algumas amizades novas. Em breve você perderia contato com as antigas. No começo ele não era bom de papo; na verdade, era bem tímido, mas era muito bom jogando e em alguns meses ele já tinha se tornado o seu melhor amigo. Vocês dois tinham muita coisa em comum; era como se fossem a mesma pessoa só que em corpos diferentes.

Primeiro capítulo concluído com sucesso, espero que gostem. Não se esqueçam da estrelinha.

Bjocas da Naah e até o próximo capítulo!

THE GAME OF LOVE. | Kozume Kenma  Onde histórias criam vida. Descubra agora