Eu estava presente na frente de Kiri não como um experimento bem-sucedido que acatava ordens às cegas, eu não estava ali como um produto que os cientistas detinham, nem como um objeto de curiosidade, eu estava ali como um ser único, digno, pensante e sentimental – em outras palavras: um ser vivo com sua própria história; a azulada a minha frente havia me autoafirmado com aquela frase, ela aceitava e apreciava a minha existência apesar de tudo que eu era ou achava ser.Segurei sua mão em minha bochecha, sentindo a suavidade e o calor de seu toque. Queria expressar meus sentimentos, mas as palavras me fugiam. Apenas olhei para baixo, apertei os lábios e chorei em silêncio. As lágrimas escorriam, caindo como gotas de chuva na terra.
– Obrigado... muito obrigado... – Murmurei, as palavras saindo com dificuldade enquanto minha visão se embaçava com as lágrimas. Antes que Kiri pudesse responder, o som de passos rápidos ecoou pelo ambiente, rompendo a bolha de nosso momento. Virei na direção dos passos, apenas para ser envolvida em um abraço repentino.
– AH! Você tá viva. – O suspiro alto seguido por uma voz trêmula fez meu coração se apertar.
– Neteyam! – Exclamei o apertando contra meu corpo e escondendo meu rosto na curva do seu pescoço.
Seu cheiro, seu toque, a oscilante respiração que tentava conter as lágrimas dissiparam a preocupação que ainda pairava em meu subconsciente. Naquele dia em que o deixei à deriva no mar, ele poderia ter morrido se eu estivesse errada sobre aquela criatura. Se ela tivesse uma visão aguçada, ele teria sido uma presa fácil, incapaz de escapar.
Se alguma coisa tivesse acontecido com ele naquele dia, acho que eu nunca mais teria coragem de olhar nos olhos de nenhum outro na'vi.
Ao final desse pensamento minhas pernas falharam, meu corpo amoleceu entregue a todo estresse físico e mental que eu havia sofrido nos últimos dias – por ainda estar me abraçando, o azulado conseguiu me segurar e se abaixo comigo em seus braços.
Eu dormi. Naquela hora, eu não desmaiei; simplesmente quis dormir. Não quis lutar contra o cansaço, só queria ser engolida por aquela sensação de segurança, conforto e paz que os braços daquele na'vi conseguiam me proporcionar.
Acordei com os sons do mar à porta de casa, o barulho da água, algumas crianças rindo e adultos conversando. Ainda havia sol no céu, e ele entrava pela porta da grande barraca como um convite para a vida. Sentei-me onde estava, em um colchonete rodeado por vários cobertores.
Olhei ao redor, tentando me situar, e senti uma calma desconhecida, como se os últimos dias de angústia fossem apenas um sonho distante.
– Está com fome? – A voz grave teria me assustado se eu não estivesse entorpecida com o sono e a felicidade de estar ali.
O dono daquela voz estava no canto da tenda; sentado com uma perna flexionada olhando para mim como se tivesse ficado um bom tempo ali.
– Neteyam... – Sussurrei e degustei a imagem de suas orelhas se mexendo, tentando captar melhor o som que era seu nome.
– Ayna'te. – Falou no mesmo tom como se fosse um jogo.
Eu sorri sentindo um frio me percorrer o corpo por ter meu nome em sua voz, ele me imitou erguendo os cantos dos lábios; por um momento nós ficamos ali em silêncio, olhando um ao outro como se o mundo se reduzisse e os problemas não existissem.
– Que bom que você acordou. – A voz que rasgou o ambiente provinha da porta, era Jake, por algum motivo estranho senti como se ele tivesse nos pegado no meio de algo que nós não deveríamos estar fazendo; apesar de eu e seu filho estarmos em cantos opostos na barraca. – Já comeram alguma coisa? – Indagou olhando para mim e depois para o seu filho.
Havia uma barreira ali entre mim e Jake – eu senti ela assim que ele falou comigo quando entrou na barraca, era uma mudança sutil no tom – mas não era a desconfiança que ele tinha de mim por causa da RDA; acredito era pelo fato de eu ter deixado seu filho mais velho em alto mar com um monstro na água.
Mas eu não estava a fim de lembrar disso agora.
– Ainda não. – Respondi.
Jake assentiu, percebi que ele apertou a boca em uma linha fina antes de se virar para Neteyam.
– Neteyam, vá buscar algo para comer, eles estão lá na tenda principal. – Falou.
Neteyam hesitou por um momento, seus olhos se voltaram para mim antes dele se levantar e sair da tenda – o silêncio que se seguiu foi pesado para mim.
Jake se aproximou e sentou-se perto de mim, o que me fez me encolher; eu estava pronta para qualquer coisa que ele dissesse, qualquer xingamento, mas... ele não fez isso.
– Desculpa por... ter falado tanta merda quando você não conseguia nem sequer se entender. – As palavras dele soaram humanas, com um sotaque que eu já tinha visto em alguns na'vis. – Nem quando a Neytiri me viu no meu corpo humano fez tanto escândalo quanto eu, haha. – Ele riu fraco, como se fosse uma piada interna. – Eu era cadeirante antes, não tinha o movimento das pernas, eu não deveria ter me surpreendido tanto por você conseguir se... regenerar. Afinal agora eu consigo correr.
– Eu achei que você iria falar algo sobre eu ter deixado o Neteyam em alto mar. – Comentei sorrindo de canto.
– Aquilo que você fez foi coisa de filme de ação, tipo Tom Cruise. – Rimos e ele bagunçou meu cabelo. – Você se sacrificou por ele, teve essa intenção, eu sei que você não machucaria nenhum dos meus filhos... eu confio em você.
As palavras de Jake, sua confiança, eram algo que eu não sabia que precisava ouvir até aquele momento – a barreira que eu achava que tínhamos não era nada mais do que um bloqueio inconsciente; aquele mesmo silêncio que me pesou no peito quando ele entrou na barraca, agora parecia confortável.
Eu me permiti relaxar, e um sorriso genuíno apareceu no meu rosto. Jake percebeu e deu um leve tapinha no meu ombro antes de se levantar.
– Apesar dos Metkayna terem gostado de você por ter voltado com os tulkuns, é melhor você descansar mais um pouco antes de sair. Aqui as coisas são um pouco mais difíceis. – Comentou se afastando. – A sua cauda ela...
Com a menção, voltei minha atenção para minha cauda mutilada, agora apenas um vestígio do que um dia fora. Estava maior do que a última vez que eu a havia observado, mas nada significativo. Só em pensar na dor que eu havia sentido por causa da mordida daquele monstro me agoniava ao ponto da minha cauda se contrair de forma involuntária.
– Acho que eu preciso comer e dormir bem, acho que daí minha regeneração funciona melhor. – Respondi tocando na minha cauda.
Quando olhei para Jake, percebi que ele estava fazendo uma careta enquanto observava o membro decepado, parcialmente regenerado. Sua expressão era uma mistura de pena, desconforto e um leve nojo.
– Bom... – Falou como se estivesse tentando afastar algum pensamento. – Eu vou indo então, me chame se precisar. – Ele me deu as costas e saiu da tenda.
Ri sozinha tentando entender o que estava se passando pela cabeça dele naquele momento; agora era só esperar Neteyam voltar com a comida.
"Será que a comida dos Metkayna vai ser igual à dos Omatikaya?" – Franzi a testa curiosa pelo que o filho mais velho de Jake iria trazer.
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Tradução do título: juntos (como membros de uma família)
DESCUPE PELO SUMISSO!! Faculdade é foda bro, tá complicado
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Oel ngati kameie
AdventureDe forma escultural seu corpo se posicionava para puxar a corda do arco, pela magreza devido sua natureza e alimentação de baixa caloria era possível ver seus músculos, muito bem desenvolvidos por sinal, me remetia a de um humano, um humano de dois...