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A sensação era de estar naquele trem há semanas. De um lado, a pequena faixa de areia esbranquiçada fundia-se à imensidão do mar azulado. O céu, monótono e sem cor, um vasto cinza claro erguendo-se sobre o horizonte. Kate tinha gostado da paisagem no início, mas depois de tantas horas ela já se sentia enjoada.

O outro lado era pior: uma parede de pedras enormes cobertas por musgo e galhos secos, passando tão depressa que causava enjoo.

A garota já estava prestes a baixar a cabeça na mesa à sua frente e tirar um cochilo, quando aos poucos sentiu a velocidade diminuir e o toque suave de seu pai sobre seus ombros.

— Chegamos — murmurou. Kate sentia o quão relutante o pai estava desde que receberam a carta, e a tensão entre os dois crescia a cada minuto. A voz dele tremulou: — Eu levo suas coisas.

Kate não disse nada desde o momento em que se levantou e percorreu os vagões até sair do trem, sentindo o vento gelado lhe causar arrepios. Ela vestiu a touca de seu casaco e observou ao redor na estação. Parecia uma construção muito antiga, com tijolos velhos e quebrados. O piso era marrom escuro e havia marcas claras formando um caminho por onde as pessoas andavam, um rastro formado pelo tempo. Não havia nenhuma planta, grama ou árvore por ali e as pedras debaixo dos trilhos pareciam estar ali há décadas.

Assim que o trem ganhou velocidade e partiu, um homem vestindo terno e gravata se aproximou de Kate e seu pai. Ele era mais alto que ambos e tinha músculos tão desenvolvidos que marcavam no terno largo. Era careca e sua cabeça branca brilhava refletindo as luzes da estação, e uma enorme cicatriz no olho esquerdo chamava a atenção logo acima de seu bigode grisalho.

O pai de Kate se preparou para cumprimentá-lo com um aperto de mão, mas foi censurado com um gesto pelo homem de terno.

— Documentos — ordenou ele. Sua voz era grave e profunda como a tecla mais baixa de um piano.

Kate e seu pai entregaram seus documentos de identificação. O homem analisou por alguns segundos e depois os devolveu, mantendo ainda sua postura séria e autoritária.

— Sigam-me em silêncio — ele não pedia as coisas, mas sim ordenava. Portanto, os dois o obedeceram.

Eles pegaram o corredor de saída da estação, e conforme se afastava dos trilhos Kate sentia sumir a sensação de impotência que carregava desde o momento em que entrou no trem. Ela percebera que não conseguia usar seu poder enquanto estava lá dentro, e de alguma forma sentiu que naquele momento poderia usar sem problemas. Mesmo assim, não o fez. Não queria levar bronca daquele homem no seu primeiro dia.

Conforme seguiram caminho, o vento diminuiu e Kate pôde retirar sua touca. Quando seu campo de visão aumentou, ela avistou a Academia de longe, um enorme conjunto de prédios que agora seria seu lar. À frente, os dois maiores edifícios se erguiam em direção ao céu nublado, separados por um térreo que Kate supôs ser a entrada. Tudo era coberto por uma cerca de metal, acompanhada de arbustos e flores das mais diversas cores. Havia algumas árvores tanto fora quanto dentro do portão, e alguns funcionários cuidavam desse jardim.

Nos fundos, depois dos maiores prédios, Kate pode ver uma grande construção circular aparecendo por cima de um espaço vazio entre as construções. Ela não conseguia ver o final dessa parte, nem se havia algo depois dela, mas seus olhos se encheram de brilho ao ver tamanha imensidão. Pela primeira vez, sentiu-se animada para começar.

Ao se aproximar do portão de entrada, uma mulher jovem os aguardava. Ela vestia roupas formais de cor creme e usava salto alto, mas ainda assim não chegava à altura do guarda que os acompanhava. Seu cabelo era curto e penteado com gel como o de um rapaz, o tom loiro claro combinando com o de suas roupas. Ela sorriu gentilmente para demonstrar conforto à nova aluna, e não havia uma única linha de expressão em seu rosto. Ela era jovem como uma criança que só cresceu em tamanho.

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