I'm whistling

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— O que? Mas por quê? — Questiono aflita, deixo o sofá em um movimento rápido e levo a mão livre aos meus cabelos, meus dedos correm pelos mesmos.

— Porque a gravadora caiu na real. — Alice soa impaciente do outro lado da minha. — Não podemos produzir um álbum inteiro para alguém que nem sabemos se pode nos dar retorno. Precisamos de um single. Você tem em torno de dois meses. — Repete o que havia dito anteriormente.

Minha boca se entreabre em uma respiração agitada.

— É pouco tempo. — É tudo o que murmuro.

— Assim que terminar de compor quero que retorne a ligação, assim posso disponibilizar o estúdio o mais rápido possível. — Diz por fim, não esperando uma resposta minha para encerrar a ligação.

Fico um tempo imóvel, o celular ainda ao lado da minha orelha enquanto observo a janela, logo ao lado da porta de entrada, de onde o vento de verão passava e agitava as cortinas.

Alguns minutos mais tarde meu braço cansou de sustentar o celular e o joguei no sofá. Não demorou dois segundos para que me arrastasse pelo mesmo caminho, me deitando no sofá.

Lírio pulou logo ao meu lado, se aconchegando próximo a mim. Seu ronronar tomou conta do ambiente e me perdi nele a ponto de não perceber o tempo passar, nem o carro do meu pai estacionar ou então as suas chaves girando na maçaneta.

— Tudo bem? Por que não está assistindo TV ou ouvindo música? — Questiona, ouço o molho de chaves ser deixado sobre o móvel perto da porta e logo após deduzo seus movimentos característicos ao tirar os sapatos.

— Não queria ver ou ouvir nada. — Murmuro e fungo baixo, secando o rastro das lágrimas que nem mesmo sabia que estavam ali. Me sento no sofá com certo custo.

— Está chorando, Romy? — Pergunta enquanto fazia a volta, parando logo a minha frente.

— Não pai. — Resmungo o ignorando.

— O que aconteceu? — Insiste se sentando ao meu lado. — Já adianto que nada não é resposta. — Empurra meu ombro com o seu e não contenho um sorriso.

— Alice ligou. Querem um single para lançar antes do álbum, tenho menos de dois meses para entregar algo e é melhor que faça sucesso. — Conto dando um suspiro baixo. — Não sei mais se quero fazer isso, pai. — Sussurro envergonhada. — Tudo anda tão estranho. — Confesso.

— Romy, a vida anda estranha há tempo demais para nós dois. Sei que são as lembranças e a honra a determinas memórias que fazem a gente seguir em frente, mas, não é justo. Você é tão jovem, tão jovem e já esqueceu de assoviar enquanto trabalha. — Reviro os olhos diante de sua fala, estava esperando um discurso levando em consideração o que disse no começo. — Estou falando sério, eu valido suas dores Romy. Mas quem são as pessoas confiáveis o bastante para vê-las? — Indaga e dou de ombros. — Eu já fui jovem, já cantei muita música no chuveiro me imaginando em palcos gigantescos. Acompanhei muitos artistas ao longo da minha vida, errei com você em não ter essa conversa antes de deixá-la assinar o contrato. — 

— Eu quis assinar, você não tem nada com isso pai. — O interrompo brevemente. E, ele realmente não tinha, eu peguei a caneta e assinei. 

— Tenho sim minha filha. A indústria é sádica. Vão te pressionar e cobrar, vão te explorar e alavancar e depois vão te engolir e cuspir no lixo. Como eu pude deixar você fazer isso? — Parecia questionar a si mesmo a este ponto. — Você não pode cometer nenhum deslize. E como não poderia? Tão jovem, é o que sempre fazemos nessa idade, deslizes. — Suspiro baixo quando meu pai passa o braço pelos meus ombros. 

— Vai ser só por um tempo pai, depois que fizer dinheiro o suficiente nós vamos voltar para a França. O que você acha? Uma casinha no interior da França soa reconfortante? — Sugiro. 

— Nós deveríamos mesmo, hm? Me parece excelente. Sabe que a gente poderia fazer isso agora, deixar tudo para trás e recomeçar. — Fala e concordo. 

— Eu sei, só quero tentar.  Não quero ser a otária que abriu mão da possibilidade de virar uma estrela. — Digo em tom de piada. Era verdade, por mais pesado que o fardo já estivesse se mostrando a curiosidade ainda me movia. 

— Tudo bem, não esquece de assoviar e colocar um daqueles sorrisos da sua mãe no rosto. — Concorda e deixa um beijo em meus cabelos antes de levantar. — Vou pedir o jantar, coloca naquele seriado. — Pede e afirmo com  cabeça.

Minha mãe costumava assoviar enquanto trabalhava ou enquanto fazia qualquer tipo de atividade doméstica. Ela tinha um sorriso muito característico. Ninguém nunca percebeu que havia algo de errado, ela parecia bem e feliz, realizada para quem visse de fora. Ela nunca demonstrou nada. 

Quer dizer, de tempos em tempos, era comum vê-la desaparecer entre os cobertores e travesseiros em um quarto escuro, a justificativa era que ela sentia dores fortes pelo corpo e não tinha energia para deixar a cama. Eu me recordava de não vê-la por dias ou então de a ouvir dizer que iria sair para uma consulta médica pois estava tentando descobrir a doença que a fazia sentir tantas dores.

Mesmo nesses momentos ela ainda fazia graça, brincando com o fato de se sentir pior e mais feia do que nos primeiros dias após meu nascimento. Ela continuava linda mesmo que não percebesse. 

Mais tarde soube que nunca existiu uma doença, minha mãe saia para consultas psicológicas chegando até a ser internada por um tempo mas era nova demais para sequer me lembrar disso. Sua vida foi feita de altos e baixos; dias felizes, semanas ruins, meses incríveis, dias arrasadores. Ela nunca me deixou perceber. No fim, não acho que ela fingiu, ela tentou mas não conseguiu. 

Ela passou por tudo isso assoviando. 

{...}
Notas da autora:

Hey,
nem tenho cara pra falar qualquer coisa aqui.

Vocês já sabem como é, eu sumo e depois apareço e depois sumo de novo😌

É isso, BEIJO ❤️

Cuidem-se.

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⏰ Última atualização: Aug 02 ⏰

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