Capítulo 01

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Os pensamentos que enevoam a mente de Dean costumavam ser fúnebres e violentos de uma forma banal. Após o purgatório, eles pioravam a cada dia, ou melhor, a cada noite em que se embriagava de bebida barata e tentava dormir numa cama de memórias distorcidas - seus pesadelos. Sentia-se como um nervo exposto, uma ferida aberta que ainda jorrava sangue, por era o que era. Um compilado doentio de sentimentos perturbadores, tão irritantes quanto familiares.

Estar em casa, no buncker, já não lhe transmitia a mesma sensação de lar. As paredes de concreto não lhe davam conforto. Elas não se afligiram com sua falta durante o tempo em que esteve ausente, como Sam. Seu querido irmão, que o deixou apodrecer no purgatório, que mais uma vez, simplesmente seguiu a sua vida como se fosse incrivelmente fácil fazê-lo sozinho.

Não importa o quanto Dean repetisse para si mesmo, o quanto afundasse sua mente na mentira bem contada do irmão, a besta no fundo de sua garganta continuava sussurrando: Sam o abandonou. Sem uma única tentativa, sem uma única verificação, ele desistiu. Por que, no final das contas, Dean era dispensável. Um homem condenado ao inferno. Um veneno destrutivo, que acabara de arrancar seu irmão da vida mundana que havia conquistado e, por isso, só era capaz de sentir raiva.

Não tristeza ou remorso, apenas raiva concisa. Sua velha amiga, que sempre o protegia do que estava por debaixo da ferida exposta.

- Conheço esse olhar - a voz suave chama a sua atenção, capaz de ser reconhecida até nos confins do purgatório. Castiel.

O anjo, aquele que Dean não conseguiu salvar; porque, afinal, não era melhor do que o irmão. Cas havia voltado há uma semana e continuava sendo o principal rosto em seus pesadelos. O homem nem sequer sabia como o outro havia se libertado. Para ambos, era uma razão desconhecida, o que trazia a Dean uma amargura indevida, pois não importava se houvesse sido Deus ou o próprio Lúcifer, ele estava grato, pior, estava em dívida.

Há uma semana Castiel não lhe disse nada sobre o purgatório, mal lhe disse nada sobre sua suposta morte com os leviatãs e toda tragédia que lhe antecedeu. Embora, não importasse, estava escrito nos seus olhos azuis o quanto se sentia mal, o quanto estava destruído. Dean podia ver os seus pedaços, as lacunas abertas, e se contorcia em pura ansiedade por nada poder fazer.

Temia, todas as vezes que seus olhos encontravam os de Castiel, ver a si mesmo.

- E o que ele te diz?

Levou a garrafa de cerveja aos lábios para tomar um pequeno gole, que se tornou longo e esvaziou o recipiente. Fingiu apatia ao nítido desgosto de Castiel.

- Que devo pegar outra cerveja.

A resposta veio com um surpreendente conforto, levando Dean a inclinar os lábios para cima. O arrastar da cadeira do outro lado da mesa consolidou a feição. Era bom nisso, sorrir.

Castiel não caiu no pequeno gesto, o odiou. E, logo, se viu na necessidade de acompanhar, despojando o whisky sobre a mesa e dois copos. A bebida não lhe trazia prazer, mas valorizava a presença de Dean e a sua satisfação com um companheiro de copo.

- Como está o céu? - apesar de não se importar com o conjunto de anjos que denominava de bastardos, a pergunta correu pela sala, reverberando nos livros próximos. Não almejava saber sobre o céu, mas como Castiel estava.

- Nada bem - a palavra foi direta e olhos ao chão.

Péssimo, envergonhado e deprimido, foi o que Dean conseguiu extrair da resposta.

Em suas asas | DestielOnde histórias criam vida. Descubra agora