Enquanto avançavam pelos corredores escuros e abafados, estantes altas de madeira se alinhavam em fileiras intermináveis, repletas de livros antigos e poeira. Leyla avançou cautelosamente, seus olhos vasculhando cada prateleira em busca do artefato tão desejado. Então, em uma das estantes mais distantes, ela o sentiu: um livro antigo, encadernado em couro gasto pelo tempo, suas páginas amareladas pelo passar dos séculos.
Com um gesto ágil e calculado, Leyla tocou no livro, seu corpo estremeceu ao sentir a energia obscura que emanava dele. Um frio gélido percorreu sua espinha, e, ao tocar o tomo, uma força sombria e poderosa irrompeu de dentro dele, arrastando-a ao chão. Aturdida, ela ergueu os olhos e verificou freneticamente se algum dos sentinelas havia conseguido segui-los até ali.
Tashi, observando a cena com preocupação, se aproximou e murmurou. — Cuidado, Leyla. Esse livro alimenta sua força, mas a pulseira que você usa está tentando conter essa energia voraz. Se os sentinelas descobrirem a quantidade de poder que você carrega agora, estaremos em grave perigo.
— Tornariam Leyla uma escrava nas masmorras ou uma sentinela. Vai saber. — Tashi acrescentou.
Leyla, com uma expressão tensa, interrompeu a conversa. — Não podemos nos perder em distrações. Precisamos avançar para a segunda etapa do plano. O tempo está se esgotando, e a cúpula do rei logo detectará nossa presença. Precisamos partir antes que seja tarde demais.
Leyla, ainda recuperando o fôlego, olhou para os companheiros e sentenciou com um sorriso cansado. — Parece que me tornei uma guia involuntária. Desculpem-me pelo que há de vir. Vamos logo antes que tudo desmorone.
Antes que pudessem dar um passo para trás, dois sentinelas surgiram das sombras, suas presenças sinistras preenchendo a sala. Ambos vestiam armaduras reluzentes, brilhando com runas antigas, e seus olhos brilhavam com uma fome insaciável. Cada um segurava um amuleto que canalizava a energia mágica, permitindo-lhes se alimentar da energia do povo para amplificar seus poderes.
— Tashi, Shura, lidem com eles. Eu preciso sair daqui com isso. Nos vemos na entrada do corredor secreto. — Leyla disse, sua voz firme e resoluta.
Os sentinelas avançaram, suas magias características emanando dos amuletos. O primeiro sentinela, um homem de olhar frio e mãos cobertas de chamas azuis, lançou uma rajada de fogo na direção do grupo. Tashi rapidamente ativou seu dispositivo, criando um campo de força que desviou as chamas, mas a pressão era imensa.
Leyla, com o livro amaldiçoado em suas mãos, avançava pelos corredores labirínticos e sinuosos, sua respiração pesada e o corpo fraquejando sob o peso da pulseira mágica que limitava sua energia. Cada salto e escalada era um desafio torturante, mas o destino exigia que ela chegasse à entrada do corredor secreto, onde deveria aguardar seus companheiros.
Lá atrás, Tashi e Shura lutavam contra os sentinelas, criaturas de terrível poder. O primeiro sentinela, um homem de olhar tirânico e com um anel de fogo pulsante, lançava rajadas infernais que pareciam consumir o ar ao seu redor. Tashi, com o suor escorrendo de sua testa, ativou seu dispositivo de barreira mágica, uma esfera de energia que conseguiu desviar as chamas, mas a pressão era quase insuportável. O calor era tão intenso que distorcia a visão e a mente.
— Maldição, esse calor está insuportável! — Tashi gritou, sua voz sufocada pelo calor. Uma onda de chamas irrompeu diretamente em seu caminho, e ele sentiu a queimadura cruel em seu braço. A dor se espalhou, drenando sua força vital e sua concentração.
O segundo sentinela, uma mulher de semblante sombrio, empunhava uma bengala encantada com poderes de ilusão. Seus encantos distorciam a realidade, fazendo espinhos de sombras brotarem do chão e criando visões perturbadoras que confundiam Tashi e Shura.
Shura, com sua força física e determinação feroz, avançou para enfrentar o caos. — Vou quebrar a concentração deles! — Ele rosnou, desferindo socos e encantamentos para desestabilizar os sentinelas. Cada golpe era um ato de pura força bruta, já que não poderia usar sua magia natural, sempre drenada.
Leyla, sabendo que o tempo estava se esgotando, lutava para manter a calma. Com os sentinelas se aproximando e suas forças diminuindo, ela gritou desesperada. — Tashi! Shura! Estou na entrada do corredor secreto. Precisamos de uma distração! Mal consigo ficar com esse livro perto de mim.
Tashi, com um grito firme, deu a ordem a Shura. — Usa a magia sonora do instrumento que eu criei, agora!
Mesmo com a dor e o cansaço, Shura ajustou seu dispositivo que emitiu ondas sonoras perturbadoras. O som se tornou uma cacofonia ensurdecedora, atordoando os sentinelas e deixando-os vulneráveis.
— Tashi, sua vez! — Shura gritou, sua voz carregada de exaustão.
Shura, bastante debilitado com as queimaduras, aproveitando a abertura, lançou com seu objeto um feitiço de contenção, encerrando o sentinela de fogo em uma bolha de energia. A mulher sentinela, furiosa, continuava a lançar espinhos de sombras e ilusões, mas então uma figura conhecida apareceu: o gatinho misterioso. Sua presença trouxe uma luz ofuscante que envolveu o campo de batalha, uma clareza que cegava e desorientava.
Leyla, com o olhar tentando atravessar a luz intensa, gritou desesperada. — Tapete de Pulgas, o que você faz aqui? Vai morrer!
A luz era tão intensa que obscureceu completamente a visão de Leyla e seus aliados. Quando a claridade se dissipou, o gato havia desaparecido, e os sentinelas estavam invisíveis. Tashi, debilitado pela queimadura e pela exaustão, estava prostrado no chão.
— Shura, venha ! — Leyla implorou, seu desespero evidente.
— Precisamos sair daqui Leyla! — Ele ordenou, sua voz grave e urgente, apontando para Tashi desmaiado.
Inconsolável, Leyla ajudou Shura a mover Tashi pelos corredores tortuosos. Eles passaram pela entrada do corredor secreto e, finalmente, emergiram na noite fria e implacável. O ar fresco da liberdade os envolveu, mas o estado debilitado de Tashi e a perda do gato misterioso deixaram um amargo sentimento de incerteza.
— Rápido, para o ponto de encontro! — Shura comandou, sua voz firme e determinada, enquanto avançavam sob o luar sombrio, buscando refúgio e segurança.
— Voltem com o livro, eu preciso resgatar o Tapete de Pulgas. Não vou deixá-lo sozinho. — Leyla afirmou, sua voz marcada pela preocupação e determinação.
Da penumbra, surgiu o Intermediário. — Sozinha. Ela está bem, acreditem. Ela irá ao nosso encontro.
— Ela? — Os jovens perguntaram em uníssono, a surpresa evidente.
— Agora, precisamos ajudar esse rapaz, ou ele se tornará um peso morto em pouco tempo. Suas queimaduras atingiram mais do que pele. Vamos, ele tem pouco tempo, não garanto total recuperação, impossível não ter sequelas. Temos duas horas para o início da aurora, quando entraremos na Garganta de Kiadgara.
O Intermediário lançou um olhar enigmático para o grupo e continuou. — Se você voltar Leyla, todo o esforço dela para ganharmos tempo será em vão. Acredite, ela escolheu sua missão. Vamos.
— Vocês estão juntos? Mas ela parecia te odiar.
— Nos odiamos, não tenha nunca dúvida disso! Não precisamos amar nossos aliados, não é mesmo? — O Intermediário arqueou as sobrancelhas. - Acredite, se ela quisesse, derrubaria esse prédio com um sopro. Venha.
-Só me responda isso, ela é uma das amaldiçoadas?
-Não. Muito pior que isso. Precisas de tempo, para entender, o que não temos, vamos. Acho justo que ela mesmo te conte, talvez, você também passe a odiá-la.
Com o livro em mãos e a noite ao seu redor, Leyla, Shura e Tashi carregado por ambos, avançaram para o ponto de encontro, os desafios e o destino incertos à sua frente. Sabiam que esta era apenas a primeira de muitas aventuras que os aguardavam. A jornada estava apenas começando, e as sombras do futuro prometiam novas provações e mistérios a serem desvendados.
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Herdeiras da Trama
Short StoryEm "Herdeiras da Trama," mergulhamos nas crônicas de mulheres entrelaçadas pelo poder proibido da magia do tempo. Em Kiadgara, um reino onde essa habilidade é vista como uma terrível maldição, cada herdeira enfrenta um destino ora de sombras e deses...