Capítulo 8

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"Não, não, não, você não entende o calor que vem das suas mãos, do sangue que escorre através delas. Formidável, indescritível, delicioso..."

A chuva caía forte no dia em que seus sonhos iriam finalmente se tornar realidade.

- Essa noite vai ser longa - comentou o guarda rodoviário, tomando um gole de café enquanto observava a avenida através da janela do posto de segurança.

- A noite é uma criança, senhor. Seja positivo. Em breve vai estar nos braços de sua mulher, como um passarinho de volta pro ninho.

O homem gargalhou com gosto.

- Você me mata de rir! - falou, jogando o copo de plástico vazio na lixeira. - Só você para comparar aquele demônio a um ninho. Prefiro mil vezes trabalhar e ganhar dinheiro!

Virou-se para ele, que terminava de vestir a grande capa de chuva.

- Eu vou estragar a noite de alguns agora. Você pode ir assim que terminar de comer. Não se esqueça de fechar a porta e de se agasalhar bem. Hoje está frio.

- É claro, chefe.

No que o homem saiu em meio a chuva, os pés pisando em poças que se formavam no asfalto por fora da estrutura de concreto, esperou pacientemente, tamborilando os dedos sobre a mesa de madeira, onde na ponta jazia os restos de um caloroso jantar.

Faltava 1h para à meia-noite.

O ventilador de teto girava sobre sua cabeça, as gotas de chuvas pingavam no vidro da janela e o vento rugia lá fora, balançando árvores e placas. O policial Hiroshi parecia um pequeno ponto azul deprimido em meio a tempestade que desabou do céu, mas se mantinha firme em procurar alguém inadequado para aplicar uma bela multa.

Devagar, o ponteiro do relógio deu uma, dez, vinte voltas, e seu celular vibrou sobre a mesa, indicando que um certo veículo se aproximava.

Sorriu com prazer.

Era a hora.

Calçando as botas de borracha, pegou uma capa de chuva maior que seu corpo e se dirigiu a saída, fazendo companhia a Hiroshi que liberava outro veículo, descontente.

- Tudo correto, pode seguir!

- Insatisfeito? - perguntou em voz alta, a voz atravessando a chuva com dificuldade.

- Esses motoristas são todos uns certinhos! - reclamou Hiroshi, abafando a voz com uma mão. - Queria pelo menos aplicar três multas antes de dormir essa noite!

Sorriu, balançando a cabeça.

- Pensei que você já fosse embora!

- Vou ficar mais um pouco. Até você conseguir dar uma multa - disse em um tom brincalhão. - Sabe, minha mãe costumava me chamar de amuleto da sorte.

- É mesmo? Neste caso, você mata a sorte de quem cruza seu caminho! - Hiroshi riu com a mão na barriga grande. - Oh! Lá vem mais um - acenou, pegando um bastão de luz branca e sinalizando para que a BMW branca encostasse.

Quando o carro estacionou na lateral, liberando a via, Hiroshi correu ofegante para a porta do motorista, ordenando que ele abaixasse o vidro.

Em passos calmos, decidiu dar a volta no veículo, reparando no fumê 100% que impossibilitava sua vista do interior. Não havia um sequer sinal de luz que provinha de um celular, como geralmente ocorre quando aquela agente de cabelos curtos está presente. E isso o deixou atento.

Hiroshi conversava aos berros com o motorista que implorava por silêncio. Isso, sem demora, já ocasionava uma leve irritação por parte de Hiroshi, que entendia como desrespeito alguém levantar a voz para ele.

Always Sing For MeOnde histórias criam vida. Descubra agora