Capitulo VII

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Rocco Jr Scuderi

As malditas cortinas tinham um rastro preto subindo por elas, com as barras queimadas e rasgadas. Sem paciência, as puxei com força terminando de rasga-las ao tirá-las do varal improvisado. Me deparei com o buraco na vidrasse e me lembrei do porque elas estavam ali.

Eu tinha seis anos quando meu pai atirou algo contra a janela, no intuito de acertar minha mãe após ela queimar a comida, antes de estupra-lá sobre a mesa de jantar, enquanto meu irmão e eu assistíamos, porque de acordo com ele, isso nos tornaria homens de verdade. A bile subiu minha garganta com aquela lembrança asquerosa.

-  Mamãe parece melhor essa manhã. - Riccardo comentou, com a voz empolgada, enquanto abria a geladeira, por fim soltou um suspiro derrotado - Precisamos comprar comida pra ela.

-  Use seu dinheiro de babá. - debochei jogando a cortina velha no lixo.

Girei meu corpo assistindo meu irmão tirar uma garrafa de vodka da geladeira e tomar alguns goles enquanto mordia um pedaço de pão velho. Ele me mostrou o dedo do meio antes de sair para o seu emprego de cuidador da Charlotte, antiga Clark, agora Cavallaro.

Esse era o jeito de Leonas nos dar dinheiro, nos colocava em empregos com salários superfaturados porque eu era orgulhoso demais para aceitar sua grana.

Quando meu pai foi morto anos atrás, nos deixou com uma boa grana, mas éramos crianças com uma mãe traumatizada para cuidar. Manter essa casa custou caro, além das roupas e comida, isso raspou as contas e tudo o que tínhamos. Vendemos os quadros velhos e móveis que custavam uma grana boa. Ainda assim, não sobrava muito por conta dos remédios da minha mãe.

Essa casa era uma porcaria, um museu de más lembranças. Riccardo tinha sorte de esquecer a maior parte das coisas, isso fodeu tanto sua mente que a mesma enfiou as memórias de merda no buraco mais fundo do seu consciente. Quando éramos mais novos ele tinha pesadelos frequentes, agora isso parecia ter amenizado, ou ao menos era o que ele dizia. No fundo eu sabia que ele roubava os zolpidem da nossa mãe quando não estava chapado de maconha.

Sai da cozinha passando pela sala quase vazia, a não ser pelo sofá velho, com um rasgo no estofado - de quando minha mãe pensou que haviam cobras escondidas pela casa -, um vaso estranho que ainda não tínhamos vendido e a lareira com lenha velha. Era útil no inverno.

Subi os degraus rangentes, desviando de uma tábua quebrada, malditos cupins. Segui em direção ao quarto da minha mãe, onde um dia foi quarto de uma adolescente - antigas filhas do primeiro casamento do velho Rocco. Havia colocado grades na janela, e espuma em todos os cantos que pudessem rachar a cabeça de alguém.

Entrei devagar, precisava ser cauteloso na maioria das vezes. Encontrei minha mãe em seu estado maniaco mudando os móveis de lugar, não demoraria muito para ela querer descer e quebrar algumas paredes.

-  Oh, querido. Veja! - ela apontou para a cama no centro do quarto - Vi em uma revista, algo sobre... modernismo? Precisamos dar uma boa repaginada nessa casa.

Encolhi os ombros, não haviam revistas aqui. Aposto que ela não lia uma desde seus vinte anos.

-  Claro. - suspirei, sabia como isso acabava.

-  Seu pai reclamou mais cedo sobre a cama estar rangendo muito, acho que tem um parafuso fora do lugar.

Segurei uma risada amargurada. De acordo com Riccardo, ela estava melhor, bem, se isso era o melhor, não queria saber o que ele considerava de pior.

Fingi concordar com o que ela dizia, às vezes se esquecia que meu pai estava morto. As vezes... ela pensava que eu era meu pai, o que a fazia correr de mim, com medo, e chorar muito, enquanto jogava objetos na minha direção.

For RuinOnde histórias criam vida. Descubra agora