O Experimento da Falha

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VULCANO

Uma, duas, três respirações.

O mundo ficou em silêncio quando meu punho acertou o alvo e quebrou o nariz do idiota sem muito esforço.

Sequer notei que havia batido em alguém até ver o garoto escorregar as costas pela parede do corredor e cair no chão. Não senti o impacto, não escutei o som do osso quebrando. Mas meu punho foi na direção de onde ele estava outra vez, sem perceber que ele já havia caído, e deu com o gesso branco cor de osso, com força demais. Minha visão estava vermelha desde o dia 1 e minhas emoções levaram a melhor novamente. Um erro que eu sabia que me custaria mais do que gostaria mais tarde.

Na parede, meu soco deixou sua marca, rompendo o liso imaculado com veios abertos de gesso quebrado. Mas por um momento não consegui sentir nada além do próprio respirar do meu corpo, os pulmões inflando e esvaziando lentamente, o suor frio acima dos lábios, o ardor nos olhos. Minha mão esquerda se tornou um hematoma ambulante, fisgadas lancinantes que me tiravam o foco. O arrependimento veio em seguida, ao notar que demonstrei descontrole aquele ponto e dei mais motivos para os ratos sussurrarem por aí.

O burburinho de conversa deu lugar a um silêncio ensurdecedor, que me dizia que havia muitas pessoas ao meu redor observando. Não olhei para nenhuma delas ao sair andando. Quando entrei no elevador, minha mão boa foi para a cintura da saia, onde peguei o celular e liguei para Kali.

— Eu fiz de novo — falei, sem devolver o bom-dia preguiçoso da advogada. Provavelmente havia tirado ela da cama, mas não dava para pensar naquilo quando providências deviam ser tomadas.

Aguentou a primeira semana inteira — Kali bocejou, sem emoção. — É a porra de um milagre!

— Também acho.

Qual foi o proceder?

— Um idiota de Fogo fez um comentário sobre os Sucessores. Me chamou de nomes que normalmente saem da minha boca na direção da maioria deles. Eles estavam começando a perder a noção do perigo. Precisava lembrá-los da ordem natural das coisas por aqui.

Através da violência? — Ela retrucou com ironia. — Você é melhor do que isso.

— Parece que não sou. Você sabe o que fazer — afastei o celular do rosto, dando a chamada por encerrada ali, mas escutei Kali murmurando e o aproximei novamente. — O quê?

Como foi? A primeira semana com eles.

O elevador parou no andar das torres e abriu ao som de um rápido acorde de saxofone. Suspirei, atravessando o mezanino interno daquele andar, sempre vazio pela restrição de acesso. Tantas coisas haviam acontecido em uma única semana que era quase impossível elaborar um resumo que explicasse tudo com perfeição.

Eles eram ainda piores que nós.

Não importou que Lira deixou claro que não era mais para eles desrespeitarem uns aos outros, nem que obrigou Cesare e Malachai a receberem a mesma punição de Prestígio sempre, falar era mais fácil do que realmente fazer. Tivemos que apartar mais duas brigas entre eles na semana que se seguiu. Na terceira, deixamos que se batessem até expurgar qualquer raiva que sentiam um pelo outro e designamos uma atividade especial para que fizessem juntos. Se tudo desse certo, eles parariam com a palhaça para evitar trabalho em dupla.

Minha decepção com Idris depois de enfrentarem Anhangá havia diminuído conforme ele se esforçava cada vez mais nos exercícios e estudos que passávamos. Ainda trabalhava em equipe tão mal quanto os outros, mas era um começo. Havia parado de dar em cima de Imani como pedi, mas em compensação passava qualquer tempo livre que tivesse fora, comendo quem quer que fosse a pessoa que deu mole para ele no dia. Isso afetava seu foco, ele conversava com os peguetes o tempo inteiro, e se eu tivesse que chamar sua atenção em uma reunião outra vez, com certeza surtaria.

Aóratos - A Última MesaOnde histórias criam vida. Descubra agora