Aóratos - A Última Mesa

Saint Zine e o Controle da Mídia

GEIA

— Como está sua Sucessora?

Afastei os olhos da xícara e virei para Sorianne, que olhava-me de cima, sem ter vontade de comprar seu tom ridículo de repreensão.

Como se fosse culpa minha o que havia acontecido. O clima entre nós estava deixando a corda que ligava nós cinco tensa e perigosa ao invés de enchê-la de esperança com o quase sucesso do último desafio dos Sucessores.

— Se recuperando — disse descontraidamente, minhas preocupações vinham sendo misericordiosamente absorvidas por Olinda, que as abraçava de bom grado para que eu conseguisse lidar com a situação de Demétria sem surtar.

Minha melhor amiga continuava arrumando motivos idiotas para brigar com as pessoas por aí, mas não dava para ser perfeito.

Sorianne riu, puxando a cadeira ao meu lado para se acomodar.

— Está nos decepcionando com a lentidão em controlar a situação com sua Sucessora, Andino.

Olhei ao redor, para as cadeiras vazias sob a luz límpida da manhã que aguardavam Sucessores e nossos outros companheiros para encher a cozinha de sons agudos. Argh! Onde estava a presença dos inconvenientes quando se precisava de uma boa cortina de fumaça?

— Estou fazendo o que está ao meu alcance e sabe disso — resmunguei, apertando um pedaço de pão entre os dedos até que amassasse. — Não tínhamos como saber que essa seria a reação dela ao parar de tomar o coquetel.

O olhar de pura fúria que recebi em seguida quase me fez desviar o olhar.

Bem, o último desafio podia ter sido animador mas um incidente infeliz havia acontecido. Tudo estava indo bem, os Sucessores pegaram a bandeira e armaram sua estratégia para nos enganar. Quando eles se aproximaram do Ipê, Olinda sentiu que faltava alguém e foi em direção aos espertinhos que tentavam nos enganar e aí... aconteceu. Olin fez seu ataque, Demétria tentou se defender mas ao invés de acertar Olinda acabou perfurando Malachai, abrindo um buraco grande o suficiente para enfiar um punho em seu abdômen e o deixando meio à beira da morte. Virou um grande problema porque usamos Caos para fechar a ferida, mas ele demorou três dias para acordar e a essa altura o irmão dele já estava desesperado para entender seu paradeiro.

Sorianne não saiu do lado dele e serviu para a desculpa de que eles haviam viajado para uma pesquisa de campo que não existia e agora Angelo certamente ficava de olho em nós e no irmão, que não lembrava do que havia acontecido quando acordou e atestou para todos que Demétria poderia ser um risco interno.

Os Sucessores ficaram contra ela, um motim quase despontou no horizonte, mas com o decorrer dos dias a ideia deles mudara; ver sua colega passando por um momento de Descontrole tão cruel mexeu com todos eles. Cesare, talvez por entender o que ela estava passando, descobriu um garoto da turma dela que ficou animado em ajudar Demétria em troca de uma boa carta de recomendação nossa para um estágio no exterior. Malachai vinha adiantando leituras para ela e Idris a acompanhava para cima e para baixo pelo Castelo. Imani, bem, eu imaginava que ela ficava atenta durante o sono para caso Demétria tivesse uma crise.

Sequer precisamos pedir para que fizessem aquilo, foi automático. E o suficiente para sabermos que eles estavam prontos para a próxima Teoria.

Mas a cereja do bolo aconteceu ainda naquela madrugada.

Passei a fazer rondas no meio da noite para observar o estado dela, medir a pressão e medicá-la quando seu sono ficava agitado. Imani costumava estar acordada nesses horários, devida sua aparente dificuldade em dormir (chegou a pedir para tomar o calmante também, mas Galileu não permitiu). Meu companheiro tinha uma teoria quanto a ela e nessa madrugada, enquanto eu ia fazer minha ronda mais cedo, comprovei a veracidade do que já imaginávamos. Imani estava montada sobre Demétria, suas mão no rosto trêmulo e contorcido dela, e olhava para cima. Achei aquilo esquisito, então me aproximei mais do seu corpo, e foi quando vi: seus olhos estavam preenchidos de pura luz, brilhante como duas galáxias roxas, empalidecendo o quarto. Me afastei para a porta outra vez, sem sequer respirar, observando de longe quando o corpo de Demétria relaxou e seu rosto desfez a expressão agoniada.