Pensamentos intrusivos inundavam intensamente a minha mente naquele momento. Eu estava voltando para casa após uma saidinha para uma balada, meus amigos me abandonaram e eu fiquei só por uma boa parte do rolê.
A madrugada estava fria e uma forte neblina cobria tudo ao meu redor. Meu fiel companheiro era meu celular que estava aberto no aplicativo do GPS.
Passei por um parque bem arborizado com abundantes flores prestes a desabrochar e cheguei numa ponte. Parei.
Incontrolavelmente eu fiquei estático naquele lugar, encarando a altura e pensando em coisas obscuras.
Fiquei absorto, hipnotizado por aquela visão e nas possibilidades que ela me traria quando repentinamente um mendigo me abordou sem que eu percebesse ele se aproximando.
— Rapaz, eu que tinha que fazer isso, não acho que você também precise.
— Mas qual o sentido de continuar?
— Eu também não sei, mas aposto que a sua situação é melhor que a minha. — retrucou ele, com um falso sorriso, fixando o olhar no chão.
— Mas de que adianta a situação se eu não me sentir merecedor de tudo isso? Fora que as minhas ações me levaram por um caminho sombrio. — retruquei-o sem deixar de olhar para baixo, aquela vista irresistível.
— Entendo, mas apoio a ideia de que você está enganado.
— Por que?
— Não sei, talvez eu me veja em você, às vezes eu tenho algo dentro de mim que não queira morrer ainda.
— Então por que tomou essa escolha?
— Não consigo esquecer as minhas decisões, as consequências delas me perseguem todo dia. Eu acho que devia mesmo ter feito isso antes, iria ser melhor do que fazer agora, ter vivido o inferno que veio depois das escolhas. — disse enquanto sua expressão neutra converteu em agonia, seus olhos tremiam, mas em momento algum ele parou de encarar o chão.
— Mas não pensa que eu não deveria pular, pois se vê em mim? Acho que no fundo você não quer pular.
— É mesmo, tem razão. Mas agora é tarde.
— É.
O silêncio que seguiu após o curto diálogo foi longo. Ambos olhávamos para aquele baixo destino sem sequer prestar atenção no ambiente ao redor.
— Sabe, acho que vou pular agora. — ele disse sem olhar para baixo.
— Acho que vou também.
— Você que sabe.
Os pássaros começaram sua sinfonia matinal da primavera, o sol começava a surgir por entre as folhas das árvores, as flores desabrocharam e o barulho de nossos corpos contra o chão quebrou a harmonia dos belos sons da natureza.
No fim nada nos interessa, seja nossos sonhos, nossas consequências, nossas memórias, a opinião alheia, as cobranças do dia a dia. Estávamos finalmente livres!
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A Ponte
Short StoryUm jovem decide encarar seu destino em uma ponte e acaba em um diálogo com um mendigo sem esperanças. arte feita por : @azevedo_cristo