40. Por que tá doendo?

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  Sam estava em uma área de descanso do grande hospital Del Mendes. Aquilo era como um shopping. A Anuntrakul bebia um copo de café enquanto lia um livro tentando distrair a mente. Era uma das únicas coisas que lhe tiravam da mente, pelo menos por alguns minutos, o medo de perder um dos seus amores. Concentrada na leitura só percebeu a presença de Mon quando a mais nova tocou seu ombro.

—"Ah, oi amor... como você está?"

—"Sam, você comeu algo? Não vi você tocar no jantar ontem e eu não estava acordada quando você saiu do quarto... tô preocupada, não quero que se desgaste desse jeito"

—"Eu vou ficar bem. Não estou com fome e não precisa se preocupar... vamos focar só em nossa filha, tudo bem?"

—"Sam você é minha esposa. É tão importante pra mim quanto a Alice." — sentou ao lado da Anuntrakul e a abraçou. —"Vem. Se não quer comer vou te dar comida na boca."

—"Mon eu realme-"

—"Você não sabe mentir, Sam. Vai comer, por favor. Eu não vou deixar você fingir que está bem e sofrer desse jeito..."

  Mon levou Sam até um tipo de cafeteria que tinha no hospital. Era pequena e principalmente saudável. Sem escolha, Sam obedeceu e comeu mesmo sem vontade. A situação com Alice estava lhe fazendo perder o sono mas principalmente o apetite.

[...]

  Alice estava no quarto e quando acordou olhou direto pro relógio. Já eram onze da manhã, realmente dormiu bastante. A sensação de cansaço ainda estava ali. Uma preguiça natural já que dormir demais nem sempre te deixa bem disposto. Ela bocejou e levantou da cama. Seu braço enfaixado agora tinha uma bandagem laranja por fora, substituindo a amarela. Ainda seriam dois meses de gesso, mas esse não era o maior problema. Ela estava confusa. Voltar pra casa parecia traumatizante mas ela não queria ir pra um abrigo. Mon tinha dado a ideia de Alice ir pra casa delas mas as duas não se manterem tão próximas da menor, a não ser que a mesma se aproximasse. Mas ainda estava difícil decidir. Até continuar como filha do casal Anuntrakul parecia não fazer sentido.

  Enquanto caminhava pelos corredores, Alice viu Sam e Mon na cafeteria que ela ainda não sabia da existência. Ao se aproximar acabou interrompendo a conversa.

—"Mas ela não vai... eu sei que ela tem medo de mim..."

—"Podemos pedir pra Nueng ficar com-... Alice?" — Mon parou de falar e puxou uma cadeira pra menina se sentar com elas.

—"A Nueng vai ficar com quem?" — questionou se sentando mas ainda um pouco distante. Estavam sentadas como as pontas de um triângulo.

—"Eu e a Sam estávamos falando sobre onde você vai ficar, filha... você já se decidiu? Hoje a tarde você terá alta e não nos disse nada..."

  Alice ficou em silêncio e juntou as mãos, as apoiando na mesa. Quando olhou pra Sam não pode não ver que a mais velha estava um pouco pálida, com uma aparência abatida e claramente tinha chorado.

—"Sam? Você tá bem?"

—"Estou... só precisamos saber o que decidiu..." — tomou um gole d'água tentando evitar mais sobre aquele assunto. Sam nunca preocuparia Alice, mas passou as duas últimas noites em claro, e não se alimentou bem só pensando na menina.

  Mon segurou a mão de Sam e depois com cuidado fez o mesmo em Alice.

—"Nós não queremos te induzir a nada. Vamos entender sua decisão e te apoiar independente de qual seja."

—"Mesmo que eu decida ir embora?" — olhou pra Mon buscando resposta.

—"Mesmo que... mesmo que decida ir embora..." — a essa altura Mon segurava mais firme na mão de Sam.

—"Eu quero falar com o Fonseca... posso?"

—"Pode, eu ligo pra ele... fica aqui com a Mon e come alguma coisa. Você dormiu bastante" — Sam sorriu fraco e se retirou.

  Enquanto telefonava para Fonseca, advogado e muito amigo da família, Sam deixava as lágrimas fujonas irem embora sem se esforçar pra impedir. Sua filha tinha medo dela, e agora estava indo embora... o peito da Lady doía de culpa. A culpa por ter destruído sua família.

  Enquanto isso, Alice estava quieta comendo uma empada de frango. Mon não queria mas, não conseguia continuar em silêncio vendo uma das pessoas que mais amava tão quieta.

—"Fi- Alice... eu posso ter pelo menos uma lasquinha da sua decisão?"

—"Eu não quero ir embora... mas tô com medo de voltar e..." — não continuou.

—"E ser machucada de novo..." — completou a fala da filha e após receber um "uhum" baixo e um pouco rouco, continuou a falar. —"Eu entendo... mas... eu não vou mentir. Não quero te perder. Eu te amo muito meu, amor. A Sam também ama..."

—"Ama? Me expulsou de casa... praticamente me chamou de criminosa, fora o tapa. Mon eu até agora não sei quem é Nick, não sei o que tinha no pen-drive que tava na minha mochila e não faço ideia de onde aquelas joias surgiram e como foram parar lá... foi a Marina, certo? Mas como acreditaram nela daquele jeito e fizeram aquilo comigo?" — Alice falava sentindo uma mistura de raiva e mágoa. Mon já tinha os olhos marejados e a menina continuou. —"Isso é amor Mon? O único sentimento que lembro daquele dia foi de como me senti quebrada sendo acusada de algo que não fiz e sendo abandonada..."

    Kornkamon não aguentou. Se levantou e saiu pelos corredores entrando no banheiro mais próximo. Alice não foi diferente, mas chorou sentada mastigando mais uma mordida do salgado de frango.

  Sam estava caminhando de volta pra cafeteria, mas ao ver Alice chorando sozinha começou a correr até a filha.

—"Alice? O que aconteceu? Cadê a Mon?... não chora, vai engasgar" — Sam se aproximou, mas sua tentativa de acalmar a menina não deu o resultado esperado.

  Alice ao ver Sam se aproximar, soltou a empada na mesa e usou os braços pra se proteger, cruzando em frente ao seu rosto com medo da mãe. Sam se afastou um pouco. Quando Alice olhou pra mãe teve certeza de que Sam estava sofrendo.

—"Sam..."

—"T- ta tudo bem... eu entendo porque está com medo... cadê a Mon?" — a menina apontou pro banheiro, a Lady deu uma última olhada pra filha antes de ir atrás da esposa.

  Estressada, Alice bateu a mão na mesa e correu dali voltando pro quarto pela escada por não querer esperar o elevador. Vencer o medo das mães seria difícil, e ela também não confiava mais nas duas. Mas ver ambas chorarem por sua causa lhe fez pensar se não poderia pelo menos evitar que saíssem da situação muito machucadas.

  Ao entrar no quarto e se sentar na cama, Alice disse pra si mesma ouvir:

—"Elas... elas me machucaram primeiro... elas não me amam... ou... NÃO... NÃO AMAM..." — começou a soluçar e se encolheu na cama. —"Por que eu tô me sentindo culpada... POR QUE TÁ DOENDO?!"

[...]

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2, seg, setembro 2024.

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