𝕬𝖝𝖊𝖑

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Axel se viu imerso em um sonho, onde contemplava o céu, azul e límpido como um amanhecer primaveril. Ouvia a voz de uma figura que se aproximava, mas seu corpo permanecia paralisado, incapaz de se mover.
No sonho, uma mulher adentrou seu campo de visão, revelando-se em toda a sua magnificência. Alta e de uma beleza ímpar, seus cabelos longos e vibrantes caíam como cascatas de sangue vivo até a linha da cintura, reluzindo sob a luz dourada do sol. Sua voz era suave e acolhedora, e seus olhos, verdes como jades e possuíam delicadas pinceladas de castanho.
Axel, mudo de assombro, apenas observava atentamente, incapaz de articular uma palavra.
- Vamos, querido - disse a mulher, com um sorriso radiante iluminando seu rosto. - Vamos voltar, você já deve estar com fome né meu amor.
Ela se inclinou com graciosidade e depositou um beijo suave em sua testa, um beijo aconchegante e acolhedor.
- Roux? - alguém se aproximava da cama.
- Que... Que horas são? - questionou Axel, erguendo-se com dificuldade.
- Está na hora de comer - respondeu Isaac, seu jovem irmão, que recentemente completara doze anos. Um rapaz astuto e esguio, herdara os cabelos dourados da mãe e a impulsividade do pai. Seus olhos heterocromáticos, um castanho e o outro verde, eram um traço distintivo e hipnotizante.
Ambos viviam sozinhos desde a trágica morte de sua mãe, ocorrida quando Isaac tinha apenas oito anos, devido complicações durante a gravidez. O pai, consumido pela dor, tirou a própria vida pouco depois depois.
- Café da manhã ou almoço? - perguntou Axel, ainda imerso na confusão do despertar.
- Já é meio-dia! - exclamou Isaac com entusiasmo. - Já coloquei o caldeirão para esquentar. Vamos, vamos!
Axel logo levantou se e foi ao preparo da comida, pegou um pato que ele caçara na noite passada. O animal já estava despenado e salgado, pronto para ser preparado. Com mãos hábeis rapidamente ele começou a cortar o pato em pedaços, cuidando para que cada parte fosse devidamente separada.
Em seguida, dirigiu-se à mesa, onde os vegetais o aguardava. Ele cortou cenouras em pedaços grandes, que liberariam sua doçura lentamente durante o cozimento. Nabos brancos, firmes e crocantes, foram cortados em fatias robustas, enquanto cebolas grandes e douradas foram picadas finamente, liberando seu aroma pungente e familiar. Alhos-porós, com suas camadas verdes e brancas, foram cuidadosamente fatiados, completando o conjunto de vegetais.
Axel então foi ai fogo sob o grande caldeirão de ferro pendurado sobre a lareira. A chama crepitante e o calor anunciavam o início do preparo. Ele colocou o pato na panela, selando cada pedaço até que estivessem dourados e começassem a liberar um aroma tentador. Retirando o pato do caldeirão, Axel reservou-o em uma travessa de madeira ao lado.
Com a gordura do pato ainda quente no fundo da panela, Axel adicionou as cebolas, deixando-as suar e liberar sua doçura natural. Em seguida, as cenouras, nabos e alho-porós foram acrescentados, enchendo o ambiente com um aroma rico e terroso. Ele mexeu os vegetais cuidadosamente, garantindo que todos se envolvessem na gordura saborosa deixada pelo pato.
Ele retornou o pato ao caldeirão, acomodando-o sobre os vegetais. Pegou um feixe de erva salsa e mergulhou-o no caldo que começava a se formar. Com um balde de água pura do poço, ele cobriu o pato e os vegetais, permitindo que todos os sabores se misturassem. Ele então ajustou a altura do caldeirão sobre o fogo, garantindo um cozimento lento e constante. Enquanto o pato e os vegetais cozinhavam, Axel pegou fatias grossas de pão rústico, cortando pedaços de um pão de centeio assado dias antes, agora ligeiramente endurecido mas ainda saboroso.
Após algum tempo, o pato estava macio e os vegetais, perfeitamente cozidos, imersos em um caldo espesso e aromático. Axel retirou o caldeirão do fogo e, com cuidado, começou a montar os pratos. Colocou as fatias de pão no fundo de grandes tigelas de barro, seguidas por generosas porções de pato e vegetais. Finalmente, ele regou tudo com o rico caldo, garantindo que cada pedaço de pão absorvesse a essência do cozimento.
- Já está pronto! - gritou Axel ao irmão, que estava nos fundos da casa, praticando com arco e flecha. De tempos em tempos, ele interrompia o treino para verificar o pato, e finalmente seu anseio seria saciado.
O aroma do pato cozido, misturado com os vegetais e o caldo espesso, impregnava a cozinha com uma fragrância irresistível.
- Já posso comer? - pediu Isaac, já sentado à mesa com uma colher ansiosa em mãos.
- Claro, mas devagar - advertiu Axel. Isaac começou a devorar a refeição rapidamente, ignorando a fumaça que ainda se erguia da comida quente. "Já faz três dias que estou esperando uma convocação real; talvez eu deva ir lá", refletiu Axel enquanto observava seu irmão terminar a refeição.
- Roux, quero mais - pediu Isaac, ainda com a boca queimando pela pressa.
- Tudo bem, me dê o prato - respondeu Axel. Enquanto servia mais pato para o irmão, uma lembrança surpreendente surgiu em sua mente.
- Roux, quando você foi à feira ontem, um cavaleiro veio aqui e deixou isto para você - disse Isaac, entregando uma carta a Axel. Axel parou por um momento, reconhecendo a tão esperada convocação do castelo.
- Como era esse cavaleiro?
- Um pouco mais baixo que você, e tinha seus olhos brancos - Isaac tentava recordar os detalhes. - A parte externa do olho era escura, e ele tinha uma marca no rosto... mas não era uma cicatriz! - concluiu.
- Muito bem, aqui está - Axel colocou o prato na mesa e começou a ler a carta. Seu semblante mudou rapidamente, agitando-se a cada linha lida. "Maldição, era para eu ter ido lá ontem", pensou, desesperado.
- Eu preciso ir agora. Cuide-se, está bem? - Axel foi ao quarto, pegou um laço para prender o cabelo e saiu, amarrando-o enquanto caminhava. - Qualquer problema, vá para a casa da Zuri!
- Roux, até mais tarde - acenou Isaac da porta.
Axel apressava-se pela cidade, amarrando seus cabelos que, à luz do sol, cintilavam como cobre recém-polido. Seus olhos cinzentos, iluminados pela mesma luz, assemelhavam-se a diamantes em seu brilho intenso.

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