Tudo na vida depende das escolhas que fazemos e, honestamente, as minhas não são das melhores. E, é claro, sempre sofro as consequências. O certo, na minha atual situação, seria falar realmente o que estava acontecendo comigo: todas as minhas visões, o quanto elas se agravaram e como estava difícil de me manter presa à realidade.
Porém, como eu poderia falar com alguém que vinha, aos poucos, enlouquecendo? Nunca, nos meus quinze anos devida, fui destaque em absolutamente nada do que fiz, evitando assim os holofotes. O que, admito, era um consolo na maior parte do tempo.
Todavia, se escolhesse a verdade, estaria me condenado a diversas consultas com psicólogos e médicos, e a uma alcunha de doida perante os meus amigos – os poucos que sobraram desde que essas visões começaram.
Esses são os pensamentos que me invadem a consciência enquanto me penteio pra ir à escola. Olho-me no espelho e me desagrada bastante o que vejo. Cabelo armado de cor acobreada, nariz largo e uma palidez quase vampiresca, reforçada pelas fundas olheiras. Há um ano, meu corpo cresceu, mas eu me sentia genuinamente incomodada com ele, como uma estranha em mim. Consequentemente, toda as roupas que comprava eram um tamanho acima do que deveriam, tentando a todo custo que os outros não me vissem.
– Vamos, Enny! – Minha mãe me chamou com toda força que podia.
Estávamos atrasadas.
Vesti-me rapidamente, recordei-me do que acabou de acontecer em frente àquele espelho, dei uma última olhada no meu anel favorito na mão direita – que ganhei do meu avô paterno ao completar dez anos – e corri até o carro velho, assumindo minha posição no banco traseiro.
Será que aquela cena em frente ao espelho de fato aconteceu? Definitivamente pareceu real. A marca roxa surgindo em meu pulso corroborava a ideia de veracidade da minha memória. Mas como?
Durante o trajeto, consegui pegar o olhar furtivo de minha irmã – Júlia – para mim. Um nítido sinal de preocupação. Tínhamos uma relação distante, uma vez que nossas personalidades eram diferentes, mas morríamos e matávamos uma pela outra, algo que não diria por mais ninguém da minha família.
Enquanto eu parecia que havia saído de um livro do Drácula, minha irmã era a personificação da típica mocinha de filme adolescente: inteligente e linda. Só com um adendo: Júlia não só sabia de sua beleza como também a utilizava para sempre estar namorando e para se safar de possíveis confusões, característica que herdara da nossa mãe. Admito que invejava o quanto elas eram habilidosas nisso. Teria sido útil nas duas últimas vezes em que fui parar na direção.
Desci do carro antes que o mesmo parasse totalmente e andei a passos largos para minha sala, de cabeça baixa e sem conversar com ninguém. Amava vir à escola. Muito mais pelas amizades do que pelo conteúdo, verdade. Porém, isso vinha mudando desde que as visões começaram.
No começo era engraçado: eu sabia de coisas que iam acontecer dali a cinco minutos, e isso até me rendeu algum dinheiro. Mas, com o tempo, as visões se tornaram macabras – normalmente sobre minha morte – e vinham à minha mente sem aviso, deixando-me em estado catatônico por alguns minutos.
Não foram poucas as vezes que parei no meio de uma conversa e saí correndo para o banheiro, ou simplesmente ignorava quem estava ao meu redor. Isso me levou à perda de várias amizades ao longo dos últimos meses e também do meu ânimo. Era nítido que eu vinha definhando e me questionava como minha mãe não via.
– Bom dia, vampirinha! – Tayane, uma das poucas amigas que me restaram, me recepcionou assim que sentei na minha carteira.
Com um sorriso, a motivei afalar o que queria.
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Os Segredos de Rheyk - VERSÃO BETA
FantasíaEnny, uma jovem de 15 anos, começa a ter visões assustadoras de sua morte e de um universo alternativo. Sua vida vira de cabeça para baixo quando um monstro aparece para matá-la, e ela é salva por seis adolescentes que a levam para uma dimensão para...