Rosamaria Montibeller 🇧🇷

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O ginásio fervilhava de vida. A movimentação dos torcedores, as luzes intensas refletindo na quadra brilhante e o som rítmico das bolas de vôlei sendo aquecidas criavam uma atmosfera eletrizante. Era 2024, e o Brasil estava competindo em mais uma fase de preparação para as Olimpíadas. A pressão estava no auge para a seleção, e no centro de tudo, Rosamaria Montibeller se preparava para mais uma rodada de treinamentos intensos. Apesar de sua concentração e dedicação, algo a incomodava — um ruído sutil que ecoava no fundo da sua mente, mas que ela ainda não sabia identificar.

Era tarde quando o treino terminou, e Rosamaria, suada e exausta, decidiu ficar mais um tempo na quadra. O ginásio começava a esvaziar lentamente. Algumas companheiras de equipe já haviam saído para o hotel, mas Rosamaria sentia que precisava de mais alguns minutos sozinha. Como de costume, ela queria ajustar alguns movimentos, refinar o saque, tentar esquecer o turbilhão de pensamentos que sempre a assombrava antes de grandes competições.

Com um movimento certeiro, lançou a bola para o alto e a cortou com precisão. O impacto ecoou na quadra vazia, o som reverberando até desaparecer. "Preciso focar", pensou ela, mas, no fundo, sabia que seu foco estava em outro lugar.

No entanto, Rosamaria não estava sozinha naquela noite.

Do outro lado do ginásio, Maria Eduarda – ou Duda, como todos a chamavam – estava observando. Duda, fisioterapeuta recém-formada e parte da equipe de suporte da seleção, havia chegado silenciosamente. Ela era discreta, sempre preferia os bastidores à agitação, mas havia algo em Rosamaria que sempre a fazia parar e assistir, como se a energia da jogadora a puxasse para mais perto.

A relação entre Duda e Rosamaria era um tanto silenciosa, mas cheia de momentos que apenas as duas percebiam. Havia olhares trocados durante as sessões de fisioterapia, mãos que se tocavam por mais tempo do que o necessário ao ajustar uma lesão, e conversas curtas, muitas vezes regadas a um leve constrangimento.

Duda sabia que Rosamaria era intensa, uma atleta que carregava nos ombros não só o peso das expectativas de um país, mas também as próprias dúvidas e inseguranças. E Duda, por algum motivo que ela mesma não conseguia explicar, se sentia estranhamente conectada a essa vulnerabilidade escondida de Rosamaria.

Com um passo hesitante, Duda entrou na quadra. "Você vai ficar aqui a noite toda treinando sozinha?" sua voz ecoou pelo ginásio, suave, mas clara.

Rosamaria parou, olhando na direção de onde vinha a voz. Ela não esperava ver Duda ali. "Eu... não sabia que ainda tinha gente por aqui", disse ela, jogando a bola para o lado e caminhando até onde Duda estava.

"Eu sempre fico um pouco mais tarde", Duda respondeu, com um sorriso discreto. "Acho que sou como você. Não gosto de parar até sentir que fiz o suficiente."

Rosamaria riu, uma risada breve e contida. "E você acha que fiz o suficiente por hoje?"

Duda deu de ombros. "Você treina mais do que a maioria. Mas... acho que o problema não é o treino."

Rosamaria franziu o cenho. "O que quer dizer com isso?"

Duda hesitou por um momento, escolhendo as palavras com cuidado. "Eu vejo como você se pressiona. E não é só pelo jogo. Não é só pela expectativa da torcida. Tem algo mais... que eu sinto que você está carregando."

Rosamaria piscou, surpresa com a percepção de Duda. Por um instante, ela considerou negar, dizer que estava tudo bem, mas algo no olhar tranquilo de Duda a fez querer falar a verdade.

"É difícil", Rosamaria começou, a voz mais baixa agora. "Todo mundo vê a jogadora. A atleta que tem que ser perfeita. Mas, às vezes, eu não sei mais quem eu sou fora da quadra. Como se a Rosamaria, a pessoa, ficasse cada vez menor em relação à Rosamaria, a jogadora."

Duda a observava atentamente, os olhos castanhos refletindo compreensão. Ela não disse nada por alguns segundos, apenas ficou ali, ao lado de Rosamaria, oferecendo a ela algo que ela nem sabia que precisava: espaço para respirar.

"Você não precisa ser uma coisa ou outra", disse Duda finalmente. "Pode ser as duas. Pode ser vulnerável, pode ter dúvidas. Não é errado sentir que as expectativas te sufocam às vezes."

Rosamaria a olhou, surpresa com o conforto que aquelas palavras lhe trouxeram. E, naquele momento, percebeu o quanto ela apreciava Duda. Não só pelo trabalho, mas pela presença constante e silenciosa, por ser alguém que sempre parecia ver além da jogadora, além dos rótulos. E talvez fosse isso que ela precisava – alguém que a enxergasse de verdade.

"Eu não sou boa em falar sobre essas coisas", Rosamaria confessou, seus olhos baixando por um segundo.

Duda sorriu de lado. "Você não precisa ser. Às vezes, só ouvir já basta."

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Nos dias seguintes, a relação entre as duas começou a se aprofundar. A interação entre Rosamaria e Duda, que antes era limitada a momentos profissionais, passou a ser marcada por conversas mais longas, sorrisos trocados no corredor, e até passeios casuais entre treinos, algo que Rosamaria nunca imaginou fazer em plena preparação olímpica.

Uma tarde, enquanto caminhavam pelas ruas de Paris, explorando a cidade em um raro momento de folga, Duda olhou para Rosamaria com um brilho no olhar. "Você sabia que existe um ditado aqui na França sobre o amor?"

Rosamaria arqueou uma sobrancelha, curiosa. "Não, o quê?"

"Que o amor pode nascer nos lugares mais inesperados. Às vezes, ele só precisa de espaço."

Rosamaria parou por um segundo, processando as palavras, enquanto sentia algo dentro de si se agitar. Ela sempre foi direta nas quadras, mas em sua vida pessoal, hesitava quando o assunto era o coração. Ela era boa em controlar emoções sob pressão, mas agora, em meio ao caos dos sentimentos, sentia-se mais vulnerável do que nunca.

"E você acredita nisso?", Rosamaria perguntou, tentando manter o tom casual, mas sabendo que a pergunta era mais profunda do que aparentava.

Duda a encarou, seus olhos fixos nos de Rosamaria, como se buscasse a resposta não em palavras, mas nas nuances dos sentimentos que flutuavam entre elas. "Eu acredito que, às vezes, a gente precisa parar de tentar controlar tudo. Só... deixar as coisas acontecerem."

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Naquela noite, de volta ao hotel da seleção, Duda e Rosamaria acabaram ficando juntas em um dos lounges mais tranquilos, longe do agito das outras atletas. A cidade estava silenciosa lá fora, e dentro delas, uma tempestade de emoções aguardava para ser desvendada.

"Rosamaria", Duda começou, a voz baixa e suave, quase como se ela estivesse tentando não quebrar o momento. "Eu... preciso dizer uma coisa."

Rosamaria olhou diretamente para ela, seu coração acelerando, já sabendo, de alguma forma, o que viria a seguir.

"Desde que te conheci, eu sempre admirei sua força. Mas, com o tempo, percebi que o que mais admiro em você é a pessoa que você esconde do mundo. A que é vulnerável. A que tem medo de falhar, mas continua tentando. E... eu acho que me apaixonei por essa parte de você."

O silêncio que se seguiu foi pesado, mas não desconfortável. Rosamaria estava absorvendo as palavras de Duda, sentindo seu impacto. Algo em seu peito se apertou, mas não de forma ruim. Era como se algo estivesse se soltando, finalmente.

Ela se inclinou levemente para Duda, seus olhos buscando os dela. "Eu também... sinto algo por você. Mas eu... não sei como lidar com isso, Duda. Eu sempre fui tão controlada com tudo, e isso... isso me assusta."

Duda sorriu, um sorriso suave que fez o coração de Rosamaria disparar. "Não precisa ter medo. Eu estou aqui. Nós não precisamos correr."

Rosamaria fechou os olhos por um segundo, respirando fundo, antes de se inclinar e finalmente deixar seus lábios tocarem os de Duda. O beijo foi lento, carregado de sentimentos acumulados, como se todas as palavras que não foram ditas até aquele momento estivessem agora sendo expressas naquele toque.

E, por um breve instante, no meio de uma cidade tão grande e em meio a uma competição tão intensa, Rosamaria finalmente se permitiu parar. Permitiu-se sentir. Permitiu-se ser mais do que a jogadora que o mundo via.

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