Capítulo 6

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Narrador

Qui.,
07/04/22.

Duas semanas haviam se passado desde o último encontro entre Arthur e Lucas. As coisas entre eles pareciam mais tranquilas, ainda que houvesse um certo peso no ar, como se algo estivesse por vir. Nesse meio tempo, as provas começaram a dominar a rotina de Arthur, consumindo seus dias e noites em um turbilhão de estudos e revisões.

Naquela quinta-feira, o dia tinha sido especialmente longo. Após a última prova, Arthur saiu da sala exausto, com a mente cheia de fórmulas e teorias, desejando apenas um momento de paz. Ele começou a caminhar pelos corredores da escola em direção à saída quando ouviu uma voz familiar.

- Arthur! - Lucas o chamou, se aproximando com um sorriso no rosto.

Arthur sorriu de volta, um pouco cansado, mas contente em vê-lo.

- E aí, sobrevivendo às provas? - Lucas brincou.

- Mal - Arthur respondeu, suspirando. - Acho que vou precisar de um ano inteiro para me recuperar.

Lucas riu e então sugeriu algo inesperado:

- Ei, uma loja de discos nova abriu na cidade. Pensei em ir lá depois da aula. Você quer ir comigo? Pode ser uma boa para desestressar.

Arthur parou por um momento, surpreso com o convite. Ele adorava música, e qualquer oportunidade de explorar novas coleções de discos parecia irresistível. Além disso, passar mais tempo com Lucas o deixava curioso, especialmente depois de tudo que aconteceu.

- Claro, eu adoraria - Arthur respondeu com um sorriso.

•••

Depois da última aula, os dois caminharam juntos até a loja, que ficava no centro da cidade. A loja era pequena, mas aconchegante, com paredes repletas de prateleiras cheias de discos de vinil, CDs e até algumas fitas cassete. O ambiente era acolhedor, com luzes amareladas e o som suave de música tocando ao fundo.

- Uau - Arthur murmurou enquanto seus olhos percorriam a loja. - Esse lugar é incrível.

- Eu sabia que você ia gostar - Lucas disse, sorrindo enquanto caminhava ao lado dele.

Os dois começaram a vasculhar as prateleiras, compartilhando suas bandas e músicas favoritas. Lucas falava com entusiasmo sobre rock clássico, punk e algumas bandas alternativas. Ele era fã de The Clash, Ramones e Nirvana, e parecia ter um conhecimento sobre o cenário musical. Arthur, por outro lado, se iluminou ao mencionar suas paixões.

- Eu sou um grande fã de The Smiths - Arthur comentou, segurando um vinil da banda. - A melancolia das letras, a melodia suave... me identifico muito com eles.

- The Smiths são incríveis - Lucas concordou. - As letras do Morrissey realmente tocam fundo.

Eles continuaram andando pela loja, mergulhados na conversa sobre música, discutindo bandas, álbuns e as emoções que cada uma delas despertava. Arthur adorava poder falar abertamente sobre algo que o movia tanto, e Lucas parecia entender e apreciar cada detalhe que ele mencionava.

Ao final da visita, os dois saíram da loja com sacolas cheias de discos. Arthur estava sorrindo, carregando vinis que sempre quis ter em sua coleção, enquanto Lucas ria, satisfeito com as escolhas que fez.

- Acho que nós dois exageramos um pouco - Lucas disse, balançando sua sacola.

- Um pouco - Arthur concordou, rindo.

Depois de saírem da loja, Lucas sugeriu que fossem até uma lanchonete próxima. Era um lugar pequeno e aconchegante, com um cheiro agradável de café fresco e pão assado. Eles se sentaram perto da janela, e Lucas insistiu em pagar um café e um sanduíche para Arthur.

- Você não precisava fazer isso - Arthur disse, tentando protestar.

- Ah, relaxa - Lucas respondeu, sorrindo. - Considera isso como um agradecimento por me acompanhar nas minhas compras.

Enquanto comiam, a conversa fluiu de forma leve e descontraída. Eles falaram sobre suas vidas, suas paixões e até alguns sonhos para o futuro. Lucas gostava de futebol, mas tinha outros interesses também. Arthur descobriu que Lucas era mais profundo e complexo do que imaginava, o que só aumentava a curiosidade que sentia por ele.

- Eu sempre gostei de desenhar e escrever - Arthur disse em determinado momento. - É como se fosse a única forma de organizar meus pensamentos, de entender o que estou sentindo.

- Isso é incrível - Lucas respondeu, genuinamente interessado. - Você é muito talentoso. Gostaria de poder ver suas obras algum dia.

Arthur corou ligeiramente com o elogio, mas apenas sorriu em resposta.

•••

Depois de saírem da lanchonete, Lucas ofereceu uma carona para Arthur, levando-o até a sua casa. Quando chegaram, Arthur hesitou por um momento, mas decidiu que queria continuar a conversa. Ele se sentou na calçada, e Lucas o acompanhou, os dois lado a lado, com o sol do fim da tarde começando a desaparecer no horizonte.

- Sabe... eu estava pensando - Arthur começou, olhando para o céu alaranjado. - Seria legal se a gente se conhecesse mais. Tipo... além da escola e do projeto. Acho que tem muito sobre você que eu ainda não sei.

Lucas ficou em silêncio por um momento, o olhar fixo em um ponto distante. Ele parecia estar pesando suas palavras, como se algo estivesse preso dentro dele há muito tempo.

- Você tem razão - Lucas disse, com a voz baixa. - Eu... nunca contei isso para ninguém. Só você vai saber agora.

Arthur virou-se para ele, sentindo que algo importante estava prestes a ser revelado. Lucas respirou fundo antes de continuar.

- Meu pai me abandonou quando eu nasci - ele começou, com a voz hesitante. - Minha mãe ficou sozinha para cuidar de mim, mas, quando eu tinha quatro anos, ela... começou a se perder em vícios. Álcool, drogas... Ela parou de trabalhar, e muitas vezes eu ficava sem comida.

Arthur sentiu um nó se formar em sua garganta enquanto ouvia.

- Eu comecei a cuidar de mim mesmo desde os sete anos - Lucas continuou, a voz trêmula. - Quando eu tinha oito, minha mãe foi presa... Ela matou uma mulher em uma briga de bar. Desde então, eu vivo sozinho. Fico dizendo para todos que meus pais estão viajando, mas... a verdade é que eu não os vejo há anos.

Arthur estava em choque. Ele nunca teria imaginado que Lucas, o garoto popular e sorridente da escola, carregava uma dor e história tão profunda.

- Lucas... - Arthur começou, mas não sabia o que dizer.

Ele se moveu para mais perto de Lucas e o abraçou, forte e apertado, como se quisesse transmitir todo o conforto que podia oferecer. Lucas hesitou por um segundo, mas depois relaxou, permitindo-se ser abraçado. Era como se, por um breve momento, ele não precisasse ser forte.

- Eu sinto muito que você tenha passado por isso - Arthur disse, a voz suave e cheia de compaixão. - Mas saiba que... você não está sozinho. Eu estou aqui para você, sempre. Independente de qualquer coisa.

Lucas não respondeu de imediato, mas Arthur sabia que aquelas palavras significavam algo importante para ele. Por fim, Lucas assentiu, ainda em silêncio, mas com um olhar de gratidão e algo mais. Algo que talvez fosse o começo de uma nova fase para ambos.

E naquele momento, Arthur soube que, mesmo com todas as incertezas, ele e Lucas estavam mais conectados do que nunca.

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