𝟎𝟑

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Pov Vance Harper:

Vance se ajeitou no banco traseiro do carro, os fones de ouvido pressionando suas têmporas enquanto o baixo de Another One Bites the Dust preenchia sua cabeça. Era a única coisa que o mantinha minimamente estável. Do lado de fora, a cidade de Metrópolis começava a desaparecer conforme o carro avançava pelas estradas mais vazias e cercadas de árvores. Ele mal sabia onde Smallville ficava e, pra ser honesto, não dava a mínima. Não queria estar ali.

O loiro cacheado balançava suavemente com os solavancos do carro, mas seu olhar permanecia fixo na janela, os olhos azuis escondidos atrás de um par de óculos escuros. A luz que entrava pela janela parecia mais forte do que o normal — como sempre era. Ele odiava aquilo, odiava como tudo ao seu redor parecia mais intenso, mais barulhento, mais... sufocante. Era como se o mundo quisesse esmagá-lo.

Por isso ele vivia com aqueles fones de ouvido e óculos, tentando bloquear o máximo possível. Mas o barulho ainda estava lá, um zumbido constante no fundo da sua mente. Cada som, cada farfalhar de árvores, cada ruído do motor parecia amplificado. E, apesar dos fones, ele podia ouvir o homem que agora era seu "pai" e a mulher ao lado dele trocando algumas palavras em voz baixa. Provavelmente achando que ele não estava prestando atenção. Errado.

Clark Kent, pensou ele com desgosto. Esse cara apareceu do nada, como se fosse algum tipo de salvador. E o que ele era? Um repórter? Que piada. Como alguém tão... sem graça poderia ser o pai dele?

Vance olhou de canto de olho para Clark, que estava dirigindo com uma expressão séria. Lois Lane estava sentada ao lado, olhando pela janela, tentando ser educada e se manter fora da tensão que pairava entre os dois. Eles pareciam um casal de comerciais de margarina. Perfeitos. Irritantemente perfeitos.

Vance revirou os olhos e se afundou mais no banco, voltando a encarar a estrada. Ele se lembrou do que a assistente social disse antes de ele sair do abrigo: "Vance, você vai ter uma nova vida. Um novo começo." Ela não fazia ideia do que estava falando. Ninguém fazia. Ele não queria um novo começo. Só queria que as coisas ficassem do jeito que eram... mesmo que estivessem uma droga.

Vance bufou, puxando os cabelos loiros de volta para trás enquanto sua mente vagava. Pai. Que piada. Onde diabos aquele cara estava esse tempo todo? Helen... sua mãe... sempre dizia que ele não tinha pai. Pelo menos, não um que prestasse. E agora, de repente, ele não só tinha um, como também estava indo morar com ele. Isso não fazia o menor sentido. Nada fazia.

— Como você está? — Lois, a esposa do tal Clark, virou-se no banco da frente e olhou para ele com um sorriso gentil, o tipo de sorriso que parecia treinado.

Ah, que inferno. Vance tirou um lado do fone, mas não o suficiente para realmente prestar atenção.

— Que parte de 'não tô afim de falar' você não entendeu?

Clark, o "pai", lançou um olhar de advertência para Lois, e ela não insistiu. Era sempre assim. Todo mundo queria ser educado, como se andar em ovos fosse a melhor forma de lidar com ele. Ele odiava aquilo. Sempre foi assim, desde que foi diagnosticado com autismo quando era criança. Claro, esse rótulo nunca fez sentido para ele, mas foi o que os médicos disseram, então todo mundo comprou a ideia. Era mais fácil do que tentar entender o que realmente estava acontecendo.

O problema era que ninguém conseguia perceber o verdadeiro motivo. Não era que ele tivesse "problemas de comportamento" ou "dificuldade de socialização". A verdade era que o mundo era simplesmente... demais. Alto demais, claro demais, confuso demais. Ele não era autista. Ele só tinha... sensibilidade. Super sensibilidade, para ser mais exato.

Mas tenta explicar isso pra alguém. Eles só te olham como se você fosse louco.

— Você vai gostar de Smallville. — Clark disse finalmente, quebrando o silêncio. Ele falava de um jeito calmo, como se estivesse tentando convencer a si mesmo disso também.

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