Continuação.
Saí da empresa com o peito em chamas e a visão turva. Cada passo que eu dava parecia ecoar no corredor como um aviso do tipo acabou, Lorena, você perdeu. Quando empurrei a porta de vidro da recepção e senti o ar frio do lado de fora me atingir, percebi que a última coisa que eu queria era voltar pra casa.
O mundo lá fora continuava funcionando como se nada tivesse acontecido — carros passando, gente apressada, conversas aleatórias. E eu ali, com a vida desmontada entre meus dedos. Segurei minha bolsa contra o peito, tentando impedir as lágrimas de escaparem, mas o esforço só fez tudo piorar. A garganta ardia. Os olhos queimavam.
Comecei a andar sem pensar em direção nenhuma. Só andei.
As ruas passavam, os prédios também. Meu cérebro martelava cada detalhe da conversa com Adrien, cada palavra dita, cada humilhação, cada olhar de desprezo. Era como se eu tivesse um megafone interno repetindo tudo: dispensada, falta de profissionalismo, postura, inútil.
O frio batia no meu rosto, mas eu mal sentia. Minhas pernas pareciam mover sozinhas, como se fugir fisicamente aliviasse algo dentro de mim. Não aliviava. A cada esquina, o peito apertava mais.
Lembrei da conta de luz. Lembrei do aluguel. Lembrei do chuveiro — o meu único conforto — e senti o estômago afundar.
— Merda... — sussurrei, enxugando o rosto com a manga. — Por que isso acontece comigo?
Passei pelo parque sem notar as árvores. Pelo ponto de ônibus sem notar a fila. Pela padaria sem sentir o cheiro de pão saindo do forno. O mundo estava desfocado, como se eu estivesse andando dentro de um aquário cheio de água turva.
Depois de alguns minutos — ou horas, sei lá — meus pés finalmente decidiram parar.
Eu não fazia ideia de onde estava.
Era uma rua mais tranquila, quase vazia. Apenas o som distante de carros e o vento de fim de tarde batendo nos fios elétricos. Encostei as mãos nas coxas e respirei fundo, tentando puxar ar para dentro do peito.
Foi quando esbarrei em algo sólido. Muito sólido.
O impacto me fez dar um passo para trás, o coração pulando na boca.
— Mer... — Comecei a reclamar, mas a palavra morreu na minha língua.
Não era um poste dessa vez. Era um homem.
Alto. Ridiculamente alto. Com ombros largos, postura reta e uma presença que parecia ocupar todo o espaço ao redor — não porque ele era imponente, mas porque havia algo... silencioso nele. Um silêncio que não era vazio, era denso.
Ele estava de sobretudo escuro, uma das mãos no bolso, como se estivesse apenas caminhando tranquilamente pela vida. A luz meio dourada do sol batia no rosto dele, destacando traços fortes: mandíbula marcada, barba por fazer, olhos escuros... muito escuros.
E esses olhos estavam presos nos meus.
Eu deveria ter olhado para o chão, pedido desculpas, continuado andando. Mas não consegui. Foi como se o mundo tivesse dado um clique, parando tudo ao redor.
Ele não parecia bravo. Não parecia irritado. Só me observava.
Calmo. Imperturbável.
Como se tivesse entendido algo sobre mim sem que eu dissesse uma palavra sequer.
— Está tudo bem? — ele perguntou, com uma voz baixa, grave, quase aveludada. Cada letra parecia colocada com cuidado, como se ele não tivesse pressa nenhuma.
Engoli em seco, surpresa porque a pergunta — simples — bateu mais fundo do que deveria.
— Eu... — minha voz falhou. Tentei de novo. — E-eu tô... sim. Eu tô.
Mentira descarada. E eu sabia que ele sabia.
Seu olhar baixou levemente, analisando minhas roupas amassadas, os olhos vermelhos, o jeito desorientado. Mas não havia julgamento. Só... observação. Como se ele pudesse ver a bagunça que eu era e ainda assim não desviasse o olhar.
Ele inclinou a cabeça de lado, um gesto quase curioso.
— Tenha cuidado por onde anda. — disse por fim, simples assim. Mas não no tom de quem dá bronca; no tom de quem avisa.
E sem esperar resposta, deu um passo para o lado, desviando de mim com a mesma tranquilidade com que tinha surgido. O sobretudo balançou com o movimento e ele continuou andando pela calçada, como se a pequena colisão tivesse sido apenas mais um detalhe do dia.
Eu fiquei parada ali, sem saber o que fazer com o ar preso no peito.
Por algum motivo idiota — ou talvez nem tão idiota assim — virei o rosto para acompanhar com os olhos. Ele não olhou para trás. Só seguiu, alto, silencioso, misterioso. Como se o mundo fosse grande demais para afetá-lo.
E eu, por um momento, esqueci até que tinha sido demitida.
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I'm Lorena
ChickLitEla dança sob os holofotes, mas vive nas sombras de um passado que ainda a queima. Lorena, uma mulher plus size com curvas tão perigosas quanto sua história, se vê dividida entre o ex-chefe dominador que a quer de volta... e um milionário sedutor qu...
