VI

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O lençol de névoa que os cobria, dissipou-se e revelou um grande castelo. Em seu topo havia um pináculo que parecia muito uma agulha arranhando o céu. Haviam janelas imensas, gárgulas às dezenas, cada uma em forma de um monstro diferente. Era um lugar gótico e sombrio.

Talvez a janelas tivessem novos vitrais, e as portas um novo polimento, feito em décadas mais recentes, mas fato era que aquele lugar estava de pé a séculos. Era possível ver as ferrugens, sentir o cheiro do velho, e ouvir o som do antigo.

Franco prosseguia caminhando, sem comentários, interações, ou qualquer sinal de vida se não o repetitivo caminhar. Victor olhava-o vez ou outra. Já guardava daquele homem um certo medo, e uma considerável desconfiança. O que ele planejava? Por que queria morte de algum homem? E por que não o fazia ele mesmo? Essas palavras, esses pensamentos, não deixavam a mente do jovem em paz. Martelavam em sua mente sem parar, cuspiam em seu rosto as letras de "Assassino" e lhe imploravam para que fugisse. Depressa. O quanto antes.

Não seja um assassino Victor!

— Espere. — disse Victor enquanto aproximavam-se do castelo.

Franco deixou de caminhar, e virou-se para olhá-lo. Seu silêncio lhe dava uma atenção arrepiante, e seu demorado encarar, a deixa que pediu. .

— Não poderei continuar. Não poderei fazer o que pediu. — balbuciou nervoso, tremendo da cabeça aos pés.

Franco continuava encarando-o. O silêncio que se seguia era apavorante, de parar o coração, de jogar-se de um penhasco, de correr sem parar para o distante horizonte. O que estava no rosto daquele homem monstruoso? Raiva e ódio? Bem possível. Mas era o mistério que mais fazia Victor temer. Afinal a raiz do medo é sempre o mistério.

— Não posso matar um homem inocente. — Vociferou Victor, com um surto de coragem que não conseguira fingir muito bem.

Ainda em silêncio.

— Prefiro que mate-me! — concluiu Victor, que agora tremia aos horrores.

Olhando para Franco, viu-o lentamente pôr suas grandes mãos na máscara de palha e retirá-la devagar.

— Não Victor, você não irá. — disse o monstro, que agora revelava sua horrenda face.

Victor pasmou-se perante tamanha uglitude. Era feio e não pouco. Monstruoso como nunca ouvira em nenhum conto de terror. Desgracioso como o próprio pecado. Horripilante como se um pesadelo houvesse ganhado vida (por assim dizer, pois aquele rosto apenas rutilava morte).

— Que... Horror!

— O homem que chamas de inocente fez isso comigo.

Victor estava lívido como o marfim.

— Não... Não é possível.

— Digo-lhe que é possível e feito! — exclamou Franco, falando forte. — Mate-o e faça um favor para todos os outros que foram vítimas desse homem!

Agora Franco havia chegado perto de tal forma que o jovem podia ver cada linha agourenta de sua face. Sua pele cinzenta era costurada nas têmporas, e ele tinha rugas fortes que quase escondiam o quão magro era. Suas maçãs do rosto eram altas e marcadas, seus olhos cinzentos e vazios, e sua respiração era alta e lenta.

— Fará a ele justiça, e a mim uma tremenda graça. Se pareço-lhe monstruoso, garanto-lhe jovem, que aquele que me tornou assim, é uma fera muito mais hedionda.

Victor olhou-o espantado. Se Franco era grotesco como o vira, quanto mais a este que era declarado como um maldito homem, um demônio em corpo e alma.

— E como pode esse homem ser assim tão mal?

Victor viu o rosto de Franco contorcer-se.

— Falo-lhe do próprio demônio. Este é um dentre os seres mais malignos que podem existir, pois ao contrário de mim, tem uma face que pode encantar aos montes. Mas o seu interior é morto, é trevas e escuridão. Deve entender porque tantos homens caem em suas mãos...

— Mas que homem pode ser assim tão mal?!

— Um vampiro.

Victor deu um passo para trás.

— Mas como...? — olhou-o confuso.

O medo que tanto crescia pouco a pouco no peito do jovem quebrou-se de vez e caiu ao chão em pedaços. O que dominava sua mente agora era a incredulidade. Um Vampiro? Isso é de fato absurdo. Pelo menos o pensava. Mas para sua surpresa ele falava a verdade, e Victor percebeu isso olhando por trás de sua feição monstruosa, mas angustiada.

Os cachorros? Conheciam bem seu dono. Sabiam de cada uma de suas dores. Afinal, foram eles que ouviram cada uma das dolorosas palavras que circundam o coração do infeliz homem durante seus dias de trevas, e suas noite em claro. Um deles, fazia um leve movimento, como que o alisasse devagar.

Por mais que sua atenção estivesse voltada para outros assuntos, Victor não pôde deixar de pensar em como nunca havia visto cachorros como aqueles.

— Faça-o Victor. Eu lhe peço.

— E por que não faz tu mesmo?

— Não é assim que funciona.

— Por que não?!

Franco deu um suspiro, e deu um leve puxão nas correntes para que os cachorros se colocassem de pé.

— Temos pouco tempo. — disse Franco virando-se — Vamos. Agora você sabe o suficiente.

Não vou me demorar ao fato de como Victor implorou, insistiu, e incomodou Franco para que lhe respondesse. Nem sobre como ele o seguiu ainda duvidoso, e acima de tudo com medo. Mas falarei sobre quando deram de frente ao castelo, e notaram como as portas estavam, não fechadas, não encostadas, mas totalmente escancaradas, com um homem caído e sangrando em seus pés. Afinal, isso deve ser mais interessante para você.

Bom, aquilo foi obviamente um susto para Victor, e uma incógnita para os dois. O homem havia sido morto baleado, e não parecia fazer muito tempo que havia acontecido.

Adentraram pelas portas do grande castelo, vendo diversas peças antigas, armaduras montadas, pinturas, porém mais antigas que as da casa dos Reis, mas demasiadamente empoeiradas.

Haviam teias de aranhas nos cantos do teto, e os cachorros brigaram por um rato que um deles agarrou e comeu sozinho. Era óbvio que se alguém vivia naquele lugar, estava mais que falido. Tinha pouquíssimas pessoas às suas ordens. Eu poderia narrar as reclamações de Victor ao pó, ou o que pensou quando de súbito, uma aranha pousou em seu ombro, e assustou-o. Mas sejamos direitos. O que realmente vale saber é que eles deram de frente com mais um par de portas escancaradas, e com uma cena um tanto peculiar.

O Casamento do Vampiro - ContoWhere stories live. Discover now