O casarão se tornou um caos. Por todos os lados havia empregados correndo, e ele fora deixado na sala como que esquecido. Victor aproveitou a deixa. Atravessou o portal e deixou a propriedade sem mais nem menos. Percorreu o jardim, chegou até a carruagem, abriu a porta e entrou.
— Mas tão cedo?
— Houveram alguns imprevistos... — respondeu o jovem.
A agitação era perceptível ao redor da casa. O alvoroço podia ser percebido até mesmo de dentro da carruagem.
— O que houve? — perguntou, largando o cachimbo de lado.
— A filha do Sr. Reis foi sequestrada por dois homens.
— Como?! Quando? — questionou-o espantado.
— Foi agora há pouco.
Frederico precipitou-se para falar com o cocheiro, eufórico.
— Aquela carruagem que vimos. Vamos segui-la, rápido!
Os cavalos se precipitaram, em grande velocidade, a vista do casarão se desmanchou, e logo eles estavam na mesma estrada que haviam trilhado para chegar à propriedade dos Reis.
— O que planeja? — questionou Victor logo quando saíram.
— O que planejo?! Sua futura noiva foi sequestrada, e eu que preciso planejar algo?
Victor nunca vira Frederico tão nervoso.
— Mas o que há com você?
— Ela será sua esposa, Victor... — Sacou seu revólver e entregou-o a Victor, fitando-o. — Você vai salvá-la.
Victor olhou bem a arma e pegou-a relutante. Frederico tirou de debaixo do banco um outro revólver, verificou se estava carregado e guardou-o no coldre. Ele transpirava e olhava pela janela nervoso.
— Rico, ela não é minha noiva, isso é problema da família Re...
Frederico mirou-o com tanta ferocidade que o jovem engasgou no meio da frase.
— Assim como para mim, o desejo de seu pai é uma ordem; para você também será.
A viagem seguiu, e eles ainda não haviam visto a carruagem que tanto perseguiam. A estrada era única e longa. Eles esperavam encontrá-los antes que ela se dividisse, e assim fossem despistados.
Estavam cercados por campos e florestas, e Victor não conseguia deixar de pensar em como seu aio havia o encarado e em como toda a sua situação mudou tão repentinamente. De um jantar formal, tudo virou até se transformar em um resgate. Mas embora Victor não se visse como o resgatador adequado, evitou falar sobre isso para não ser retalhado.
Quando uma tempestade os encobriu, eles chegaram a uma ponte de pedra que se emergia acima de um lago. Victor só pôde ouvir tiros. Os cavalos relincharam e a carruagem começou a derrapar no calçamento. Frederico gritou: "Saia da carruagem!". Victor abriu a porta e pulou. Caiu no chão e quando ergueu-se, a primeira coisa que viu foi um homem e uma arma a alguns metros de distância.
Sentiu um impacto no seu ombro e uma dor crescente. Cambaleou para trás, tropeçou na mureta e caiu no lago. Viu as coisas sumirem devagar, até tudo desaparecer.
Quando voltou a vê-las, estava na beira do lago, caído e molhado. Seu ombro doía, mas não sangrava. Ele virou-se e fitou o céu, ainda cinzento e escuro. O lago era negro, e a mata ao redor densa, mas ele não via nenhuma ponte.
O lago deve ter me levado para longe. Mas alguém me tirou e me pôs em terra. Anjos existem afinal.
Levantou-se devagar, seu ombro doía, não deveria fazer mais de meia hora que havia sido baleado. Colocou a mão no ferimento, sentia dor, mas não via sangue. E quando Victor percebeu que estava costurado, uma incógnita se instaurou em sua mente.
Caminhou por entre as colinas, sentindo um amargo gosto em boca, até ver de longe uma montanha, e em seu pé uma pequena casa, talvez uma cabana, que ficava de frente para uma pequena plantação de milho.
Foi andando até a pequena casa que ele percebeu que sua arma havia sumido de seu coldre Concluiu que deveriam haver duas opções. A primeira era que sua queda da ponte no lago, houvesse feito com que ela se desprendesse e fosse levada pelo lago para muito longe. E a segunda, que mais temia, era que o sujeito que o havia retirado da água havia tomado a pistola para si, e que poderia estar em qualquer lugar, talvez até mesmo o observando.
Quando o céu começou a escurecer, chegou enfim em frente a casa. Já estava cansado, e uma dor lancinante tomava seu ferimento. E além disso ainda sentia-se faminto, e arrependeu-se de não ter abocanhado algumas das torradas meladas em patê, ou pego uma fatia da torta de cerejas que havia no banquete. Apenas lhe restava depender da bondade de algum ser gentil, e esperava não cair em mãos de gente nefasta.
Quando chegou, observou a casa com atenção, e percebeu como era pequena. Talvez fosse o suficiente para uma, no máximo duas pessoas. Acima da porta havia uma placa, que em letras garranchosas se escrevia: Toca do Franco. A porta de pinheiro era velha e escura, assim como toda a casa, mas não tão velha para parecer abandonada. Como sua única esperança naquele momento de aflição, decidiu bater.
— Quem bate? — uma voz gutural soou de trás da porta.
— Perdoe-me incomodá-lo meu nobre senhor. Minha carruagem atravessava a ponte de pedra que fica por trás dessas grandes colinas, até que fomos atacados por homens armados. Fui baleado e caí no lago, acredito que apenas eu sobrevivi.
Um silêncio reinou. Até que Victor decidiu quebrá-lo.
— O senhor poderia oferecer-me alguma ajuda? Sinto dor, fome, e cansaço. Prometo recompensá-lo com mais do que me oferecer.
— Não quero nada que possa me oferecer! — vociferou.
Victor tremeu ao ouvir a voz, era estranhamente arrepiante.
— Não tenha raiva senhor. Apenas me dê um pão para comer, e uma xícara de chá para passar a dor, que o deixarei em paz. — disse Victor.
Ele ouviu rosnados fortes e raivosos por trás da porta. Alguns segundos se passaram, e um silêncio reinou entre o jovem e a velha porta. Victor pensou que não seria respondido.
— Posso ajudá-lo. — respondeu a voz — Mas sabe em que mundo vivemos. Nada é feito sem uma boa condição, um bom acordo.
— Eu posso lhe pagar...
— Não! Já disse que não quero seu dinheiro sujo. — retorquiu a voz raivosa — Quero que me ajude a matar alguém.
Victor assustou-se.
— Meu senhor, não sei se poderei ajudá-lo com esta...
— Escute. Apenas escute. — interrompeu-o. — Lhe darei alimento, e também um lugar onde passar a noite, contanto que você faça o que peço.
Victor escutou-o com atenção.
— No topo dessa montanha existe um castelo, e nela vive um homem amaldiçoado. Quero que mate-o. — enunciou.
Victor olhou para o alto da montanha pensativo. Não conseguia ver o castelo, pois um nevoeiro denso cobria todo o seu pico.
— Perdoe-me o questionamento, mas o que este homem fez para ser morto? — indagou Victor.
— Este homem deve ser morto. É tudo o que precisa saber. — Berrou.
Victor hesitou e deu um passo para trás.
— Meu senhor, nunca nem mesmo atirei com uma arma, como poderei matar um homem que vive protegido em um castelo?
— Não será difícil, o castelo não recebe visitas, então o homem tem poucas pessoas em sua guarda, mas eu o ajudarei, poderei até mesmo acompanhá-lo, mas é você quem deve matá-lo.
Victor hesitou, mas estava tão cansado, e com tanta fome, que a proposta tornou-se irrecusável.
— Aceito, meu senhor. Mas prometa-me que me acompanhará em toda a tarefa e que me concederá uma arma para fazê-lo, pois estou agora desarmado.
— Prometo meu jovem.
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O Casamento do Vampiro - Conto
Short StorySeu pai deseja que ele se case e tenha uma vida feliz. No entanto, o jovem Victor se vê enfrentando obstáculos muito maiores do que jamais imaginou para atender a essa expectativa. Mistérios e perigos o cercam, e ele busca entender como tudo se inte...